Apontado pela equipe econômica e pelo Planalto como o “grande vilão” da economia neste ano devido à manutenção dos juros altos, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu finalmente iniciar o processo de redução da taxa Selic, com um corte mais agressivo, de 0,50 ponto porcentual, de 13,75% para 13,25% ao ano.
O movimento, tão aguardado pelo governo - que ontem intensificou a pressão pela queda de juros -, por empresários e, mais recentemente pelo mercado financeiro, ocorreu em uma decisão dividida, como já era esperado, na estreia de Gabriel Galípolo e Ailton Aquino no comitê.
A redução ocorre exatamente 12 meses depois de o BC elevar a taxa Selic pela última vez para combater uma inflação até então bastante persistente. Desde então, os juros básicos estavam parados em 13,75% ao ano. De lá para cá, a inflação acumulada em 12 meses cedeu de 10,07% para 3,16% - abaixo do centro da meta deste ano (3,25%).
O início do ciclo de afrouxamento monetário ainda acontece três anos após o último corte de juros no Brasil. Também em agosto de 2020, a autoridade monetária definiu a queda para Selic a 2,0%, mínima histórica, no contexto da pandemia de Covid-19.
Entre as instituições financeiras, a queda de 0,25 ponto porcentual, para 13,50%, era a aposta predominante. Segundo pesquisa do Projeções Broadcast, 62 de 88 (70%) das casas consultadas esperavam recuo para 13,50%, enquanto 26 (30%) viam queda maior, de 0,50 ponto, para 13,25%.
Juros reais
Mesmo com primeira redução na Selic, o Brasil permanece no posto de “campeão” de juros reais - descontada a inflação - (7,54%) do mundo, considerando o levantamento do site MoneyYou com 40 economias - o que não tem “nenhuma explicação” na opinião do presidente Lula.
Nas contas do BC, o juro neutro, que não acelera nem alivia a inflação, é de 4,5%. A taxa real brasileira está bem acima de México (6,64%) e Colômbia (6,15%), que vêm logo na sequência na lista. A média das 40 economias é de 0,84%.
Em junho, no último Copom, a maioria dos membros do BC já indicava haver condições de baixar de forma “parcimoniosa” a Selic em agosto, caso o processo de desinflação continuasse, com impacto em expectativas - o que ocorreu. Por outro lado, o processo de alta de juros segue em curso em países desenvolvidos, há resiliência da atividade econômica no Brasil e as expectativas de inflação ainda estão desancoradas.
No último Boletim Focus, as projeções para o IPCA de 2024, foco da política monetária, e de 2025, que tem peso minoritário, cederam de 4% para 3,89% e de 3,80% para 3,50% em relação ao Copom anterior, respectivamente. O centro da meta para os dois anos é de 3%. A expectativa para este ano agora é de 4,84% - 0,09pp acima do teto da meta (4,75%) -, contra 5,1% na pesquisa anterior ao encontro de junho.
Decisão não atende os pequenos negócios
A redução de 0,5 ponto percentual vai ao encontro de uma demanda geral do governo e dos empresários, mas deixa frustrados aqueles que enxergavam nos indicadores da economia espaço para uma redução mais significativa. É o caso do presidente do Sebrae Nacional, Décio Lima, que considera a o patamar ainda elevado da taxa de juros como uma falta de sensibilidade para com os donos de pequenos negócios no Brasil.
“A economia brasileira tem respondido positivamente. O país teve o quarto maior crescimento do PIB no primeiro trimestre entre todas as economias globais. Somamos um volume de US$ 166,5 bilhões em exportações, com superávit de US$ 45,5 bilhões, o maior da nossa história. Além disso temos mantido, de modo consistente, a retomada dos empregos formais”, comenta Décio Lima.
Nesse contexto, segundo o presidente do Sebrae, é injustificável que os donos de pequenos negócios tenham de tomar empréstimos com uma taxa de juros tão elevada. “O empreendedor precisa ter acesso a crédito a um custo viável para poder investir e ajudar o país a retomar o crescimento. Mas, com as condições atuais, é pegar um empréstimo para falir ou quebrar amanhã”, avalia.
Dados de um levantamento do Sebrae, feito em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que 63% dos pequenos negócios tinham dívidas ou empréstimos no último mês de abril, sendo que pouco mais da metade dos empreendedores (52%) tinham 30% ou mais do seu custo representado pelo pagamento dessas dívidas.
“Os pequenos negócios respondem por sete em cada 10 novas vagas de empregos formais. Com essa importância para a economia, as MPE precisavam ter assegurado o acesso a taxas de juros mais favoráveis e que não representassem um risco futuro à saúde financeira das empresas”, diz.
Recepção positiva
Já a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) considera positiva a redução em 0,50% na taxa básica de juros. “Entretanto, esperamos que esse seja um movimento contínuo de redução e que a Selic possa se estabilizar em um patamar baixo de forma sustentável no longo prazo”, destacou o presidente da entidade, Luiz França.
Luiz França avalia que o corte na taxa básica de juros é essencial para a incorporação imobiliária e construção civil, uma vez que os financiamentos habitacionais de imóveis de médio e alto padrão são os mais impactados pela Selic. “Além da queda nos juros, é essencial que o Banco Central adote medidas que aumentem a oferta de funding ao setor”, explica o executivo.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 3 de agosto de 2023.