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na Paraíba

Mercado literário ganha fôlego com novos projetos

publicado: 30/09/2024 10h00, última modificação: 30/09/2024 10h02
Autores e empresários se unem para garantir sobrevida do comércio de livros
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Livraria do Luiz aposta em dinâmicas presenciais com clientes para criar experências | Foto: Carlos Rodrigo

por Bárbara Wanderley*

Desde o ano passado, duas das maiores livrarias do país, Saraiva e Cultura, fecharam suas portas. O mesmo fato já havia ocorrido com Travessa e Nobel. Outras livrarias menores e algumas editoras tiveram o mesmo destino. Apesar das indicações de que esse mercado vem encolhendo, há paraibanos se aventurando e investindo em livros e editoras. Para eles, a solução passa por se reinventar. 

A gerente e diretora comercial da Livraria do Luiz, Jéssica Queiroz, contou que o estabelecimento passou por dificuldades, durante a pandemia de Covid-19, mas houve melhora no retorno às atividades.

“É inegável que a reabertura dos estabelecimentos após a pandemia veio com essa necessidade de contato humano e que, por consequência, as vendas aumentaram. Também é evidente que a reclusão e o ócio advindo dela fizeram as pessoas ler mais, o que implica diretamente o aumento das vendas. Apesar disso, vivemos a instabilidade, dias difíceis. Vivemos a desvalorização dos espaços físicos, das livrarias tradicionais”, comentou.

Para Jéssica, a maior ameaça está no que ela chama de concorrência desleal das vendas on-line. “Muitas vezes nos deparamos com o barateamento injustificado de livros que chegam ao cliente final por valor abaixo do que compramos para comercializar. Tentamos explicar de modo prático para que os clientes não suponham que estamos aumentando deliberadamente o preço do livro, mas é complicado”, explicou.

Livrarias virtuais não vão ter nenhum dos gastos envolvidos em manter um espaço físico bem estruturado e com funcionários. Há também a concorrência dos livros digitais, já que boa parte dos custos, no caso do livro físico, vem da impressão.

Na tentativa de não perder mais clientes, a livraria tem apostado em diversas atividades presenciais, aproveitando a maior necessidade de socialização do pós-pandemia. “Com a reabertura dos estabelecimentos, também pudemos perceber a necessidade de contato social. Nesse momento, nossos encontros ficaram mais cheios, nossos corredores ganharam novos rostos, especialmente de jovens. Impulsionamos os encontros mais simples: rodas de conversa, saraus de poesia, debates e dinâmicas mais diretas com nossos clientes”, contou.

Negócio antigo com novas estratégias

Nadando contra a maré, o jornalista e escritor Felipe Gesteira decidiu abrir, junto com os sócios Anderson Pires e Eliane Pereira, a editora Termômetro, em 2022. Com quatro títulos já lançados e mais um previsto para este ano, Gesteira acredita que é cedo para fazer uma avaliação do mercado, mas garante que pesquisou bastante antes de empreender no setor. “Foi justamente por identificarmos possibilidades interessantes que decidimos empreender nesse caminho. Além dos livros, é claro. Ter retorno financeiro com aquilo que amamos é sensacional. Amamos livros”, disse.

Quem também resolveu apostar nesse mercado foi o jornalista e escritor Ricardo Oliveira que, recentemente, anunciou que está fundando a editora Leevro. Ele acredita que o mercado literário está passando por uma transição e muitas empresas não estão sabendo se adaptar e estão fechando as portas.

“O mercado como é atualmente é insustentável, porque criaram um modelo em que é preciso investir muito dinheiro para poder ganhar algum. Mas o financiamento coletivo veio para mostrar para a gente que é possível primeiro ter dinheiro para depois ter o livro”, comentou, citando que recebeu um orçamento de R$ 30 mil para imprimir três mil livros. “De onde eu vou tirar R$ 30 mil para imprimir três mil livros e o que eu vou fazer com esses livros depois?”, indagou.

Para ele, as respostas estão no financiamento coletivo e nas pequenas tiragens que podem ser feitas em gráficas digitais. “Em gráficas maiores, só vale a pena imprimir em grandes quantidades, mas, em gráficas digitais, a gente consegue imprimir 100 unidades, por exemplo, por R$ 18 a R$ 20 cada uma”, disse. 

Boas ações de marketing e a construção de uma imagem de referência no setor também podem ser de muita ajuda. Ricardo citou o exemplo da editora de quadrinhos Pipoca e Nanquim.

“Eles já tinham um canal no YouTube com 300 mil inscritos, já eram consolidados, já conheciam o mercado, trabalharam na [editora] Panini, sabiam pontes importantes de fazer a tradução, sabiam coisas que as pessoas queriam. Hoje, eles têm uma capilaridade enorme, porque inverteram o processo. Primeiro eu consolido o que quero vender, depois vendo. Isso é uma coisa que as editoras em geral não fazem”, avaliou. “Nesse mercado, eu só vejo como ser sustentável se você inverter tudo”, completou.

Ele destacou que percebe muita acomodação no setor. “Quando eu comecei a vender meu livro ‘Verde Gás’, eu ficava indignado ao comemorar a venda de 300 livros, porque, olha o tamanho do Brasil e a quantidade de gente que pode se interessar por ler uma distopia. Eu sei que tem muito mais do que 300 pessoas interessadas nisso, então por que eu vou me conformar que 300 vai ser bom? Não é bom”.

Outra questão, segundo ele, é que assim como ocorre em outras áreas da cultura, existe uma elitização, que prejudica o mercado. “Na verdade, as pessoas preferem continuar no mercado falido, com as livrarias fechando, do que deixar que a coisa se popularize. É perfeito que exista o interesse na linguagem rebuscada, numa literatura que transforme a literatura, mas, ao mesmo tempo, não é isso que vai fazer as pessoas lerem mais”, opinou.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 29 de setembro.