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proteção ao consumidor

Órgãos acionam 123 Milhas por cancelar pacotes pagos

publicado: 22/08/2023 09h22, última modificação: 22/08/2023 09h22
Ministério da Justiça, Procon e Defensoria tomam medidas contra a empresa
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Clientes que se sentirem lesados pela empresa devem registrar reclamação no Procon-PB - Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

por Thadeu Rodrigues*

Consumidores que adquiram passagens aéreas ou pacotes de viagens com datas flexíveis da empresa 123 Milhas para o período de setembro a dezembro de 2023 tiveram a compra cancelada. A empresa não vai emitir os bilhetes por “persistência de circunstâncias de mercado adversas”, informa, em nota. Os consumidores serão ressarcidos apenas por meio de vouchers, mas de acordo com o Ministério da Justiça, essa não pode ser a única opção para resolver a situação.

A 123 Milhas diz que não vai devolver o dinheiro dos consumidores e que o ressarcimento em vouchers será acrescidos de correção monetária de 150% do CDI, para compra de quaisquer passagens, hotéis e pacotes na empresa. Os vouchers serão divididos, sendo um para o trecho de ida, outro para o de volta e outro para hospedagem, por exemplo. Contudo, se o viajante “recebeu sua passagem, localizador ou e-ticket, sua viagem está confirmada”, informa a empresa.

No entanto, de acordo com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, o reembolso proposto pela empresa deve atender ao que determina o Código de Defesa do Consumidor (CDC), com a opção de devolução dos valores em moeda corrente e com correção monetária. “A cláusula contratual que permita cancelamento de forma unilateral é considerada abusiva e consequentemente nula”. A Senacon disponibiliza a plataforma consumidor.gov.br para que as pessoas possam registrar suas reclamações.

Empresa é punida com exclusão do Cadastur

Ontem, em sessão na Câmara dos Deputados para participar de uma solenidade em homenagem aos 20 anos do Ministério do Turismo, o ministro Celso Sabino afirmou que agência de viagens 123 Milhas foi suspensa do Cadastur, um programa que facilita a obtenção de empréstimos e financiamentos no setor. “Nós fomos surpreendidos com o anúncio da empresa de que estaria cancelando os pacotes adquiridos”, diz Celso Sabino.

Conforme o dirigente, a Senacon vai analisar a viabilidade do modelo de negócios da 123 Milhas e de empresas similares. “O tipo de negócio empreendido por essa companhia é um tipo de negócio que está sob análise do Ministério do Turismo e também da Secretaria de Defesa do Consumidor. O objetivo é dar segurança, credibilidade, preço justo para que o cidadão brasileiro conheça o Brasil”.

Em abril deste ano, houve um grande problema com a empresa Hurb (antiga Hotel Urbano). Os consumidores reclamaram nas redes sociais por não receber as passagens dos pacotes adquiridos, nem confirmação de hospedagem, o que culminou na renúncia do diretor-executivo, João Ricardo Mendes.

Queixas no Procon

A Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (Procon-PB) já recebeu 66 reclamações de clientes da empresa 123 Milhas, neste ano, por conta de problemas envolvendo emissão de passagens e serviços conexos, informa a superintendente Késsia Liliana. O Procon-PB notificou a empresa ontem para prestar esclarecimentos sobre a quebra unilateral dos contratos.

Conduta da 123 Milhas é considerada ilegal e contrária às disposições do CDC, e outras ações podem ser ajuizadas 

Ela orienta os consumidores lesados a entrar em contato com a empresa para obter uma resposta sobre sua situação. Caso não seja positiva, deve procurar um órgão de defesa do consumidor, a exemplo do Procon-PB. “Sem acordo, o consumidor pode ingressar com ação judicial, de posse de todas as provas necessárias para solicitar a reparação por danos”.

Késsia Liliana ressalta que não é a empresa quem deve decidir a forma de devolução dos valores. “Conforme o artigo 35 do CDC, o consumidor pode exigir o cumprimento forçado da oferta ou devolução dos valores devidamente corrigidos”.

A superintendente do Procon-PB ainda cita que a utilização de voucher não resolve o problema porque o consumidor que teve a viagem suspensa ainda pode ser prejudicado com a perda de valores investidos em hospedagens ou aluguel de veículos contratados por fora da empresa.

A professora aposentada Ednea Neves viajou do Rio de Janeiro a João Pessoa, na semana passada, junto com sua mãe de 89 anos, mas teve de voltar para casa antes de embarcar. Ao chegar ao Aeroporto Antônio Carlos Jobim, foi informada de que seu voo foi modificado para a madrugada do dia seguinte, um horário inconveniente para quem chegaria ao seu destino pouco antes do meio-dia, conforme as passagens adquiridas junto à 123 Milhas. “Agora, estou apreensiva quanto ao nosso retorno ao Rio de Janeiro”, disse.

Defensoria ingressa com ação civil pública

A Defensoria Pública da Paraíba (DPE-PB) ingressou com uma ação civil pública contra a empresa 123 Milhas para garantir o cumprimento dos contratos já firmados ou ressarcimento dos valores pagos pelos consumidores. Para o defensor público, Marcel Joffily de Souza, as justificativas são “genéricas e vagas”. O valor da causa, que vai tramitar na nona Vara Cível de Campina Grande, é de R$ 1 milhão.

Na ação, o defensor público, com atuação na Coordenadoria de Direitos Humanos e Ações Coletivas, em Campina Grande, pede que a Justiça determine a emissão de passagens da linha Promo relativas ao período comercializado, bem como, que a empresa seja obrigada a possibilitar a opção de restituição dos pagamentos pelas referidas passagens.

Marcel Joffily destaca que a linha suspensa afeta especialmente consumidores economicamente hipossuficientes, já que, “em razão de seus preços mais acessíveis, atrai uma considerável parcela de pessoas com menores recursos econômicos e que se utilizaram da referida linha e de seus menores preços para programar viagens nacionais ou internacionais com considerável antecedência”.

O defensor alerta ainda que a conduta da 123 Milhas é ilegal e contrária às disposições do CDC, e afirma que a ação coletiva não impede que outras medidas sejam posteriormente buscadas para resguardar os direitos dos consumidores.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 22 de agosto de 2023.