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Endividamento

País tem 77 milhões de inadimplentes

publicado: 25/07/2025 08h50, última modificação: 25/07/2025 08h50
De acordo com especialista, contas básicas e cartão de crédito elevam dívidas para além do salário-mínimo
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Em João Pessoa, a cada 10 consumidores inadimplentes, sete devem a instituições financeiras | Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

por Priscila Perez*

O número de inadimplentes em João Pessoa aumentou, em junho: a alta foi de 2,38%, em comparação ao mesmo período do ano passado, ficando abaixo da média nacional de 7,73%, segundo o Sistema Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e o SPC Brasil. Em todo o Brasil, mais de 77 milhões de cidadãos chegaram ao mês de maio sem conseguir quitar suas dívidas, com débitos acumulados no cartão de crédito e contas básicas atrasadas.

Além do crescimento da inadimplência, o valor médio devido por pessoa atingiu R$ 1.558, ficando acima do salário-mínimo atual. As informações são do relatório Indicadores de Mercado, da plataforma Pagou Fácil, que aponta ainda um salto de R$ 46 bilhões no total da dívida acumulada entre os meses de janeiro e maio, passando de R$ 419 bi para R$ 466 bi.

Para o especialista Amadeu Fonseca, o avanço do endividamento é reflexo direto do atraso nos salários, do desemprego persistente e da inflação que, pouco a pouco, vem correndo o poder de compra do brasileiro.

Em entrevista à Rádio Tabajara, ele classificou os dados como um alerta sobre a fragilidade financeira das famílias ao lidarem com as contas mensais. Para Amadeu, os indicadores são preocupantes.

“Eles mostram que, de fato, teve um aumento significativo [na inadimplência] desde a pandemia e que, até hoje, as famílias brasileiras não conseguiram se organizar financeiramente”, afirmou. O especialista aponta, ainda, a inflação como principal fator para esse desequilíbrio no orçamento.

“À medida que produtos e serviços ficam mais caros, acabam, de certa forma, comprometendo o salário, visto que muita gente recebe salário-mínimo”, analisa. Em outras palavras, o cenário apontado pelo relatório indica que as contas do mês têm sido absorvidas pelo custo de sobrevivência, e não por supérfluos.

Orçamento pressionado

Quando a dívida média ultrapassa o salário-mínimo, o impacto é direto no dia a dia das famílias. Segundo o economista, significa dizer que as dívidas que elas obtêm são superiores ao que recebem, o que faz com que todo o salário seja comprometido antes mesmo do fim do mês, empurrando até o consumo básico para o crédito.

“Ou seja, as dívidas são, muitas vezes, muito superiores ao que os próprios brasileiros recebem”, explicou Amadeu, ao reforçar que o descompasso entre renda e custo de vida não é pontual. Não à toa, o cartão de crédito segue como principal fator de pressão sobre o orçamento, por conta dos juros — os mais altos do mercado, disse ele.

“As pessoas acabam, muitas vezes, se endividando através dessa modalidade, que tem suas facilidades e importância para o planejamento financeiro. Contudo, acabam deixando de pagar e dificilmente conseguem quitar ou renegociar a dívida de uma forma que consigam voltar a ter crédito”, destacou.

Os dados do relatório Indicadores de Mercado confirmam a principal origem das dívidas: bancos e cartões de crédito, que respondem por 27,85% do endividamento. Em seguida, aparecem as contas básicas, como água e luz (20,17%), as dívidas com instituições financeiras (19,38%) e os serviços como TV por assinatura e internet, que somam 11,94%.

A pesquisa da Pagou Fácil também revela que o atraso no salário é o principal motivo da inadimplência, citado por 40,8% dos entrevistados. Endividamento excessivo e desemprego vêm logo depois, com 22,3% e 20,3%, respectivamente. Já o perfil dos inadimplentes no país manteve-se estável: homens e mulheres em proporção semelhante, concentrados na faixa etária de 26 a 60 anos — a mais ativa economicamente.

Na capital paraibana, o cenário é semelhante ao observado no restante do país. De acordo com o levantamento do Sistema CNDL e SPC Brasil, 74,48% das pendências estão concentradas no setor bancário: a cada 10 consumidores inadimplentes, sete devem a instituições financeiras.

Já o valor médio das dívidas vencidas chega a R$ 5.612,39, com tempo médio de atraso de 30,7 meses. Ainda assim, boa parte dos inadimplentes na cidade lida com débitos relativamente baixos: 36,44% devem até R$ 1 mil e 23,89% até R$ 500, o que coloca João Pessoa entre as capitais com menor alta na taxa de inadimplência do país. Na Paraíba, por sua vez, há 1,3 milhão de consumidores que não conseguem quitar seus débitos e quase 700 mil com pendências em bancos.

Futuro em risco

Com o avanço da inadimplência, não é apenas o consumo imediato que fica comprometido. “Esse impacto é percebido diretamente em outras questões, até mesmo relacionadas ao próprio estoque de leilões, que, nos últimos anos, vem crescendo de forma expressiva. Os leilões da Caixa demonstram que as famílias, além de estarem endividadas, também não estão conseguindo pagar os seus financiamentos”, analisa Amadeu.

E a consequência disso não se limita à falta de crédito na praça e envolve, também, a perda de patrimônio, moradia e estabilidade. Segundo o especialista, quando o poder de compra fica comprometido dessa forma, é sinal de que as famílias brasileiras estão enfrentando uma situação financeira cada vez mais apertada.

“O salário, que se refere, muitas vezes, ao mês, acaba, de certa forma, todo comprometido. E elas ficam sem conseguir adquirir os bens que antes eram conseguidos de uma forma mais ‘fácil’, através de subsídios que o próprio governo concede, como o programa Minha Casa, Minha Vida”, complementa o economista.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 25 de julho de 2025.