“Seria cômodo afirmar que a negativa do habite-se pela extrapolação de apenas 45 centímetros constitui uma afronta ao princípio da razoabilidade; no entanto, a análise do caso reclama a consideração de todo o contexto histórico que motivou a limitação das edificações na orla marítima de João Pessoa”, argumentou o desembargador e presidente do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), João Benedito da Silva, ao decidir pela suspensão da emissão da Licença de Habitação (habite-se) ao empreendimento Way, localizado no fim da Avenida Epitácio Pessoa.
A decisão do magistrado, que deve perdurar até o trânsito em julgado da ação, é contrária ao entendimento da 4a Vara da Fazenda Pública de João Pessoa, que havia deferido a tutela provisória para a expedição da licença. No documento, o desembargador ainda determina que, caso a Prefeitura de João Pessoa tenha expedido a licença, ela deve ser anulada.
“É fundamental que o Poder Judiciário não corrobore com tais práticas, garantindo o cumprimento das normas urbanísticas e preservando os princípios de sustentabilidade e ordenamento urbano que regem o município, evitando, assim, danos irreversíveis à sociedade e ao meio ambiente”, defendeu o desembargador, no despacho.
João Benedito reforçou, ainda, que a suspensão da licença é uma forma de evitar que novos empreendimentos sejam construídos fora da altura máxima determinada pela Lei do Gabarito, que cria uma “zona de restrição” na região da orla, com prédios que devem ter medidas de 12,90 m até, no máximo, 35 m na faixa final dos 500 m.
“A orla marítima de João Pessoa, protegida pelo art. 229 da Constituição Estadual, corre o risco de sofrer com a verticalização excessiva, a diminuição das áreas verdes, o aquecimento urbano e a perda do patrimônio paisagístico, transformando uma região vital para o turismo e a preservação ambiental em um cenário de degradação e especulação imobiliária desenfreada”, alertou.
O pedido de suspensão da liminar foi proposto pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB), alegando que a construtora Cobran Ltda., responsável pelo Way, cometeu irregularidades que incluem a violação de normas de altura estabelecidas em Lei Complementar da capital.
Outros casos
Outros empreendimentos também estão sendo investigados por descumprir a Lei do Gabarito: o edifício Setai Edition, da construtora Setai, e o Oceânica Cabo Branco, da Oceânica Construções e Incorporações Ltda., ambos na orla do Cabo Branco. O entendimento da Justiça, entretanto, não tem sido consensual.
Na semana passada, a juíza Virgínia Fernandes Aguiar, da 2a Vara de Fazenda Pública da capital, considerou tolerável o excedente do edifício Setai Edition. Por esse motivo, rejeitou o pedido do Ministério Público da Paraíba (MPPB) para a retirada do excedente da construção e a não expedição da Licença de Habitação (habite-se).
Já a desembargadora da 3a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), Maria das Graças, decidiu, em julho deste ano, pela suspensão do habite-se ao Oceânica Cabo Branco. Na ocasião, a magistrada argumentou que “não se pode aplicar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade de forma indiscriminada apenas por se verificar que o excedente seria ínfimo”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 28 de agosto de 2024.