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28 de janeiro

Erradicação do trabalho escravo ainda é desafio

publicado: 29/01/2024 09h34, última modificação: 29/01/2024 12h56
A cada 30 dias, dois paraibanos são resgatados de condições degradantes
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Trabalho escravo é tipificado quando há condições degradantes, jornada exaustiva ou qualquer forma de coerção que viole a dignidade humana - Foto: Ministério do Trabalho/Divulgação

por Joel Cavalcanti*

No contexto do Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, lembrado neste dia 28 de janeiro, a Paraíba enfrenta um desafio contínuo para a erradicação desta prática desumana. A persistência do trabalho análogo à escravidão lança uma sombra sobre as conquistas trabalhista e dos direitos humanos. Dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo, divulgado pelo Ministério Público do Trabalho na Paraíba (MPT-PB), revelam que a cada 30 dias pelo menos dois paraibanos são resgatados de condições degradantes de trabalho no país.

“A maior parte dos trabalhadores paraibanos resgatados das condições de trabalho escravo foram resgatados em outros estados. Essa situação vem se refletindo no número de denúncias. Temos visto um aumento de denúncias em 2022 e 2023. Isso vem junto com as diversas campanhas de conscientização que o Ministério Público tem realizado. Qualquer cidadão pode fazer uma denúncia. Não precisa ser o trabalhador que está em condição de vítima”, alerta Marcela Asfóra, procuradora do Ministério Público do Trabalho na Paraíba.

No Brasil, o número de empresas identificadas na “lista suja do trabalho escravo” do Ministério do Trabalho e Emprego conta com 472 empresas. Já a ONG Walk Free classifica o país 11º lugar no ranking mundial em práticas análogas à escravidão e tráfico de pessoas. “Esse é um dia para chamar a atenção de toda a sociedade sobre o que é o trabalho escravo contemporâneo. Quando a gente pensa em trabalho escravo, a gente pensa no trabalho escravo tradicional que já foi abolido em 1888. Hoje, na prática, nós temos outro tipo de trabalho escravo, que é mais sutil. O nosso objetivo é chamar a atenção da sociedade para esse crime”, destaca George Falcão, Juiz do Trabalho da 11ª vara do trabalho de João Pessoa.

Servidores públicos enfrentam riscos

Foi no dia 28 de janeiro de 2004 que três auditores fiscais do trabalho e um motorista foram assassinados em fazendas de Unaí (MG) quando averiguavam denúncias de trabalho escravo na região. Uma situação de risco que esses servidores públicos ainda enfrentam diante de em um contingente defasado com limitações estruturais. O déficit de auditores fiscais do trabalho compromete a capacidade de investigação e aplicação das leis, segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho. O estado enfrenta dificuldades em cobrir todas as denúncias e áreas de risco que surgem diariamente e que aflige prioritariamente um perfil social bem específico da população.

A preferência desses empregadores é por pessoas jovens, entre 18 e 25 anos, na imensa maioria das vezes são homens. Quanto mais vulnerável é esta pessoa, mais propensa ela está de cair nessa cilada do trabalho escravo
George Falcão

“A preferência desses empregadores é por pessoas jovens, entre 18 e 25 anos, na imensa maioria das vezes são homens. Muitos estão morando em situação de rua procurando por um espaço melhor. Eles se iludem com propostas mentirosas e fraudulentas. Cerca de 30% destes são analfabetos. Quanto mais vulnerável é esta pessoa, mais propensa ela está de cair nessa cilada do trabalho escravo”, afirma George Falcão, que integra a comissão de enfrentamento ao trabalho escravo, ao tráfico de pessoas e de proteção ao trabalho do migrante do Tribunal Superior do Trabalho.

Muitas vezes, as pessoas estão inseridas dentro de uma condição de trabalho escravo, identificam que estão sendo submetidas a irregularidades, mas não sabem que estão sendo vítimas de um crime e nem como podem buscar ajuda. “Sabemos que estamos passando por uma situação de recrudescimento econômico e essa circunstância faz com que essas pessoas tenham que aceitar os trabalhos que são apresentados. Muitas vezes os empregadores não observam o mínimo da dignidade daqueles trabalhadores, aproveitando-se dessa circunstância para colocá-los em situações extremamente degradantes que é capaz de configurar o trabalho escravo”, reforça Marcela Asfóra.

Uma das formas de combate é justamente a conscientização sobre os critérios que configuram trabalho escravo. No Brasil, esse crime é tipificado quando há submissão de pessoas a condições de trabalho degradantes, jornada exaustiva, servidão por dívida, restrição de locomoção em razão de dívida ou condições de trabalho, ou qualquer forma de coerção que viole a dignidade humana, conforme estabelecido na Lei nº 10.803/2003, conhecida como Lei de Combate ao Trabalho Escravo.

Na Paraíba, as denúncias podem ser feitas no site do MPT na Paraíba, pelo portal nacional do MPT, pelo aplicativo MPT Pardal, pelo Disque 100 e também pelo site do Sistema Ipê (do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 28 de janeiro de 2024.