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31 de março ou 1º de abril?

publicado: 01/04/2024 09h29, última modificação: 01/04/2024 09h29

por Rui Leitão*

Sessenta anos após o golpe de 1964, persistem versões diferentes sobre a data oficial do acontecimento. Os militares que promoveram a tomada do poder insistiram em definir o dia 31 de março como o marco do que eles chamaram de “A Revolução”. Afinal de contas, não ficaria bem admitir o dia primeiro de abril como sendo o dia do fato histórico, porque no Brasil é conhecido como o “Dia da Mentira”. “Quem implantou a ditadura quis fugir das piadas, chamando-a de regime da mentira. A melhor data para marcar o golpe é o dia 1o de abril, antes disso o presidente João Goulart ainda estava no poder”, considera Luiz Antonio Dias, historiador da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Do ponto de vista historiográfico, então, a polêmica não se sustenta.

A verdade é que as tropas militares, comandadas pelo General Olympio Mourão Filho, se deslocaram de Juiz de Fora, Minas Gerais, em direção ao Rio de Janeiro, na noite do dia 31 de março. No entanto, a deposição efetiva do presidente constitucional João Goulart se deu ao final do dia 1o de abril, quando o deputado Ranieri Mazzilli, presidente do Congresso Nacional, decretou a vacância da Presidência da República.

A autoproclamada “Revolução de 31 de Março” não passava de uma mentira repetida exaustivamente. Mesmo em data errada os militares permaneceram por muito tempo comemorando a data como sendo o dia em que o regime ditatorial foi instalado. Com a redemocratização, essas celebrações deixaram de acontecer em 31 de março. Porém a partir de 2016, quando a direita retomou o governo, nos quarteis foram retomadas as manifestações comemorativas na data em que definiam como oficial da ruptura institucional em 1964. Nos quatro anos do governo passado, teimosamente foi registrado o 31 de março como “o dia da Revolução”, em atendimento à ideologia defendida pelo então presidente da República. A ordem do dia era emitida com elogios à ruptura democrática.

Não há o que se discutir em relação ao entendimento de que realmente se tratou de um Golpe, pois foi um movimento que objetivava depor um presidente legitimamente eleito, com uso das Forças Armadas. Não houve derramamento de sangue porque o presidente João Goulart resolveu se render sem luta. Nem podemos considerar o período da ditadura militar como sendo revolucionário. As transformações observadas foram muito mais na imposição de um regime autoritário, de subversão da ordem até então instituída, caracterizado por censura, sequestros e execuções cometidas por agentes do governo.

O dia 31 de março, antes comemorado como se fosse algo positivo, passou a ser lembrado como o que ele foi: um ato criminoso e que feriu de morte a democracia em nosso país. Desde 2019 acontece um ato público em todo o Brasil, no dia 1o de abril, intitulado Movimento Vozes do Silêncio, com o objetivo de relembrar o golpe civil-militar e as tragédias dele decorrentes. Relembrar para que não se esqueça, nem se repita.

A tese dos golpistas não resiste aos relatos históricos. A data oficial do golpe que durou 21 anos, teve cinco mandatos militares e instituiu 16 atos institucionais, é 1o de abril de 1964. Os fatos são claros.

*Artigo publicado originalmente na edição impressa do dia 31 de março de 2024.