por Beatriz de Alcântara*
Feijão, cenoura, tomate, carnes, gás de cozinha, gasolina e, mais recentemente, os remédios. A lista de produtos cujos preços aumentaram nos últimos meses não para de crescer, comprometendo a renda do trabalhador e sua qualidade de vida. No próximo mês, essa relação ainda vai ser ampliada com o reajuste dos planos de saúde, que devem subir até 18%, o maior aumento em duas décadas autorizado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Tantas despesas no orçamento estão deixando os brasileiros sem muitas opções. Na casa de Allan Souza, de 28 anos, morador de João Pessoa, foi a alta no preço dos medicamentos que mais prejudicou a renda familiar, já que não é possível abrir mão ou trocar os produtos. “A gente faz compras mensais, porque eu tomo remédio controlado e minha mãe também. Todos eles tiveram alta. Além disso, para comprar a fralda geriátrica que minha avó usa, nós precisamos fazer uma pesquisa de preço, procurar a melhor promoção, porque já é um produto caro e está ainda mais”, lamentou.
Como se não bastassem os remédios, o custo dos alimentos também está afetando a família. O jovem ressaltou que esse mês de abril foi o que ele mais sentiu, de fato, o aumento dos produtos. “Fui fazer as compras e está tudo alto. Carne aumentou de um jeito… O cuscuz também. E o café está a um preço que nunca vi na minha vida”, comentou Souza.
Mas não foram apenas esses os produtos mais caros. O preço da cesta básica aumentou 3,37% na capital paraibana em março, com valor chegando a R$ 567,84, de acordo com a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, conduzida mensalmente pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Com esse resultado, a cesta compromete 50,65% do salário mínimo líquido, atualmente em R$ 1.212.
Além disso, em fevereiro de 2022, o Índice de Preços dos Alimentos (FFPI) da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) apontou um total de 140,7, sendo considerado o índice mais alto em cerca de 100 anos, atrás apenas do obtido no período da Primeira Guerra e da Gripe Espanhola, entre os anos de 1915 a 1920.
Inflação recorde afeta especialmente os mais pobres
Os preços acompanham os resultados da inflação. No mês passado, o índice acelerou 1,62%, após alta de 1,01% em fevereiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Puxada pela disparada dos preços dos combustíveis, foi a maior taxa para meses de março desde 1994, antes mesmo da implantação do Plano Real. Trata-se também da maior inflação mensal desde janeiro de 2003 (2,25%).
O economista paraibano Francisco Barros destacou que esses aumentos afetam, principalmente, as pessoas que ganham menos. “É um impacto muito forte sobre um orçamento familiar já prejudicado. E não só de agora, mas isso desde o ano passado, quando a inflação começou a subir muito e fechou o ano com 10,6%”, afirmou.
Na casa da família Alcântara, Grace e Marcos aderiram alguns “malabarismos” para sanar os impactos das altas dos produtos no orçamento. A empreendedora conta que os medicamentos em si não afetaram tanto a renda familiar, mas o valor do combustível que colocavam para passar o mês aumentou cerca de 40%, ou seja, quase o dobro do que costumavam gastar. “A gente precisou reduzir os deslocamentos do final de semana, por exemplo. Hoje, basicamente, priorizamos os deslocamentos de trabalho ou emergências. Lazer e outras saídas que a gente fazia, diminuímos”, comentou.
As idas ao supermercado também tiveram uma queda. Grace Alcântara explica que, hoje em dia, ela e o marido optaram por fazer compras em atacado, buscar produtos que estejam em promoção e diminuir o consumo dos chamados supérfluos. “A gente também precisou reduzir as saídas para comer fora, porque percebemos que era um custo que impactava muito no orçamento. Estamos dando preferência realmente à alimentação em casa”, completou.
Para a economista Márcia Paixão, professora do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), tem sido desafiador para o trabalhador/consumidor atender suas necessidades básicas ao mesmo tempo em que perde o poder aquisitivo. Assim como Barros, a especialista observa que as famílias de rendas mais baixas são as que mais sofrem com essa alta dos preços de bens e serviços, “a exemplo dos medicamentos, alimentos, artigos de higiene, serviços de energia elétrica, abastecimento de água e gás de botijão”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 16 de abril de 2022