por Iracema Almeida*
No início do mês, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a comercialização em farmácias e drogarias do Brasil de mais um medicamento à base de cannabis. O novo produto é fabricado na Colômbia e trata-se de uma solução oral que poderá ser adquirida pela população através de prescrição médica do tipo B, mais conhecida como a receita azul. Com esta nova liberação, esse é o oitavo medicamento aprovado pela Anvisa no país. O remédio é composto por 23,75 miligramas por mililitro (mg/mL) de cannabidiol (CBD) e pode conter até 0,2% de tetraidrocannabidiol (THC).
O médico Vinicius de Mesquita explicou que os produtos à base de cannabis podem ser receitados para qualquer condição em que o cannabidiol seja considerado potencialmente benéfico para o paciente e sempre com a recomendação de que seja prescrito de forma compassiva (após todas as alternativas de tratamento já terem sido testadas sem sucesso). “O paciente que está em busca desse tratamento deve se consultar com um profissional especializado neste atendimento, para que, com a receita e o laudo em mãos, possa acessar a cannabis medicinal”, destacou.
De acordo com o especialista em medicina cannabidioide, o cannabidiol (CBD) é uma das várias substâncias presentes na cannabis (maconha), que age sobre o sistema nervoso central (especialmente no cérebro), e que são pesquisados para uma série de aplicações terapêuticas. O médico pontua que o CBD isolado dessa nova farmacêutica deverá estar à venda no próximo ano, embora provavelmente apenas em grandes redes de farmácias e nas capitais dos estados, devido ao alto custo e falta de médicos especializados para a prescrição fora dos grandes centros urbanos.
Sobre os estigmas envoltos nos medicamentos à base de cannabis, o médico reforçou que os produtos são como uma luz no fim do túnel para milhares de pessoas. “Lamentavelmente, apesar de tudo isso, ainda existe preconceito calçado na ignorância ou em desculpas menos escusas. Mas, quando você é uma pessoa doente, em sofrimento físico, mental ou incapaz de viver normalmente e que não encontra qualquer outra alternativa nos remédios convencionais, as barreiras são quebradas”, pontuou o médico.
O profissional de saúde adiantou ainda que os produtos à base de cannabis são usados no tratamento de doenças e síndromes neurológicas e indicados para casos específicos. Por exemplo, para epilepsia refratária infantil e algumas síndromes epilépticas graves (em que os medicamentos convencionais nem sempre apresentam bons resultados). Também existe indicaçõespara dores neuropáticas, esclerose múltipla, mal de Parkinson, Alzheimer, esquizofrenia, autismo, além de outros distúrbios psiquiátricos e emocionais.
Ponto positivo
Para o médico, a provação desse novo medicamento é um ponto positivo sem retorno, que se demorou muito para essas liberações e não se devem retroceder na minimização do sofrimento de pessoas que sequer podem falar por si, como no caso de pacientes com doença de Alzheimer, mal de Parkinson, autistas ou que diariamente sofrem de dezenas de convulsões. “Claro, que esses medicamentos à base de cannabis devem ser prescritos com toda a responsabilidade, segurança e evidências científicas que as boas práticas médicas exigem”, acrescentou.
Na Paraíba, a Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace) já começou a produzir os medicamentos, em forma de óleo, que são compostos com os produtos que foram autorizados pela Anvisa. A distribuição para seus associados começará a partir de janeiro de 2022. “Nós acreditamos que quanto mais possibilidades, melhor. Os pacientes precisam ter maior condição de escolha para seus tratamentos, por isso também torcemos que surjam novas associações autorizadas a distribuir os produtos”, ressaltou o diretor executivo da associação, Cassiano Gomes.
Segundo a Abrace, mais de 28 mil pacientes de todo o Brasil estão cadastrados e declaram fazer tratamento com medicamentos à base cannabis. Esses produtos são responsáveis por produzirem endocanabinoides, através do consumo de nove ácidos graxos essenciais, a exemplo dos ómegas 3, 6 e 9. Regularizando e equilibrando os demais sistemas dos seres humanos, desde os processos fisiológicos até os cognitivos, entre eles a fertilidade, o imunológico, apetite, sensação de dor, humor e memória.
“Quando o paciente faz uso de produtos à base de cannabis, é o sistema endocanabinoide o responsável por receber as propriedades e garantir os efeitos desejados. Este sistema está presente por todo o corpo e é por este motivo que é tão grande a variedade de doenças e sintomas que podem ser tratados com cannabis”, acrescenta Cassiano. Os novos produtos feitos com o novo medicamento aprovado serão comercializados pela Abrace, aos seus associados, na linha Gold, com óleos com 15 mg/ml (linha verde), 20 mg/ml (laranja) e 15 mg de THC e 15 de CBD, que totaliza 30 mg/ml (azul). A prescrição desses medicamentos só pode ocorrer através de médicos especializados, que é responsável por orientar os pacientes sobre as formas de uso.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 15 de dezembro de 2021