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CANUDOS

Ataque a assentamento é investigado

publicado: 11/06/2024 09h14, última modificação: 11/06/2024 09h15
Polícia Civil realiza perícias e oitivas para identificar os responsáveis por incêndio criminoso em ocupação do MST

por Emerson da Cunha*

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Cerca de 60 famílias integram o assentamento, que existe há aproximadamente 10 anos, em território considerado improdutivo | Foto: Divulgação/Ascom MST

No último domingo (9), a Polícia Civil da Paraíba iniciou as investigações para identificar e prender os autores do incêndio criminoso cometido na noite do sábado (8) no assentamento Canudos, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), situado entre os municípios de Riacho de Santo Antônio, Alcantil e Boqueirão. Na ocasião, quatro indivíduos encapuzados e armados, dizendo-se policiais, invadiram o espaço, prenderam cinco homens, retiraram mulheres e crianças de dentro de sete barracos e atearam fogo às suas residências. A ação durou cerca de uma hora. Quatro das moradias foram totalmente destruídas.

Cerca de 60 famílias habitam o assentamento, que existe há aproximadamente 10 anos, produzindo palma, milho, feijão, jerimum, melancia e batata-doce, além da criação de gado, caprinos, porcos e galinhas. A ocupação é parte de três mil hectares de terra considerada improdutiva.

Ainda no domingo, quando foi contatada pelo assentamento, a Polícia Civil realizou as primeiras oitivas e perícias, identificando garrafas que podem ter sido usadas como coquetéis molotov no ataque. “Verificamos que foi um incêndio criminoso. Após fazerem isso, [os criminosos] disseram que seria um chamado para eles [os assentados] irem embora dali, caso contrário, da próxima vez que voltassem, iriam matá-los. Ouvimos vítimas, testemunhas e o administrador da fazenda na qual estão acampadas – e que seria, na fala das vítimas, a pessoa que teria atrito com elas e que já as teria ameaçado de morte. No entanto, esse senhor, que está sendo investigado, disse que não viu ou tomou conhecimento do incêndio, embora tenha passado nas proximidades do local, ainda no domingo de manhã”, explica Suelane Guimarães, delegada da 11a Delegacia Seccional de Polícia Civil, que responde por 15 municípios, com sede na cidade de Queimadas.

Assentados já haviam sido ameaçados, segundo entidade

Segundo o MST, o ataque aconteceu algumas semanas após o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) iniciar o cadastro das famílias de Canudos, a fim de efetivar o assentamento. Apesar de os assentados já terem recebido ameaças de morte antes, de acordo com a entidade, o passo para a legalização da ocupação pode ter sido uma das motivações do crime. O MST também avalia que, mesmo sem mortos ou feridos, essa foi a ação mais grave contra um assentamento paraibano neste ano.

“Eles usaram gasolina, tochas, renderam os homens, colocaram mulheres e crianças de colo na frente dos barracos pegando fogo, com as pessoas vendo queimar seus remédios, geladeira, fogão, documentos. No momento, estava acontecendo uma festa em Cabaceiras, então aproveitaram a fragilidade do acampamento para fazer isso. Queimaram as barracas que estavam mais estruturadas”, lamenta a coordenadora do MST, Dilei Schiochet.

Desdobramentos

Conforme a delegada Suelane Guimarães, o caso pode gerar indiciamentos por incêndio criminoso, porte de arma de fogo, ameaças profícuas e constrangimento. “Nós seguimos com as investigações. Vamos aguardar tanto a perícia como outras oitivas, tentar verificar nas câmeras da BR-230 o acesso até lá, qual o tipo de carro fez aquele trajeto à noite, uma vez que não é um trajeto muito comum, nem naquela hora específica, para chegarmos aos verdadeiros culpados e podermos, então, representar pela prisão preventiva deles”, expõe.

“É menos doloroso não ter ferido nenhuma pessoa, mas há um clima de muita tensão”, pontua Dilei Schiochet, acrescentando que o MST tem pressionado autoridades locais e nacionais do Incra para a apuração do caso e realizado uma campanha de solidariedade em favor do assentamento. “Estamos em diálogo no campo dos direitos humanos, buscando atendimento à saúde psicológica. As famílias estão firmes, vão resistir. A solidariedade aparece de todos os cantos, ninguém está só, a decisão é permanecer. Mesmo porque se trata de um latifúndio improdutivo de mais de três mil hectares”, conclui a coordenadora do movimento.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 11 de junho de 2024.