por Juliana Cavalcanti*
A erupção do vulcão submerso Hunga-Tonga Hunga-Ha’apai, na ilha de Tonga, no Oceano Pacífico, trouxe uma série de consequências para várias regiões brasileiras. Na Paraíba, suas cinzas têm deixado o céu com tons avermelhados durante o amanhecer e anoitecer, desde o final de janeiro. De acordo com o presidente da Associação Paraibana de Astronomia (APA), Marcelo Zurita, “a expecta-tiva é que o fenômeno continue acontecendo, mas não tem como prever por quanto tempo ele ainda vai permanecer e o dia especifico em que ele vai aparecer”, afirma.
Inclusive, a mudança na coloração do céu também foi vista ontem, durante o amanhecer e, segundo o especialista, foi mais intensa do que nos dias anteriores.
O fenômeno foi visto em todas as regiões da Paraíba, com maior frequência, no Litoral do Estado. “Também temos imagens da cidade de Monteiro, que mostram essa nuvem no amanhecer bem destacada, em relação às imagens de outros dias”, completou Marcelo Zurita.
Conforme o presidente da APA, as cinzas do vulcão viajaram pela estratosfera, levadas pelos ventos em altitudes acima de 25km. Nessa altitude, não têm muitos impedimentos, como nuvens de chuva ou zonas de baixa pressão que podiam fazer com que essas partículas precipitassem. Então, elas continuem em suspensão por mais tempo.
Elas chegaram ao Brasil, aproximadamente, no dia 26 de janeiro, inicialmente pela região Sudeste. O Nordeste, para o pesquisador, está pegando uma espécie de “sobra” dessas cinzas, pois são apenas algumas nuvens que estão se dispersando e seguiram as correntes de ar. “O efeito foi muito mais sentido no Sul e Sudeste, sendo registrado no Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Bahia”, descreveu.
Essa mudança só vai deixar de ocorrer quando essas partículas deixarem o país (o que ainda não se sabe quando vai acontecer) ou se elas precipitarem através das chuvas. Para o representante da APA, as cinzas ficarão circulando na atmosfera e quando encontrarem as zonas de ventos descendentes, irão descer e não voltam mais.
Outra opção é irem para uma camada atmosférica que tenha nuvens de chuva onde também irão desaparecer. Ele lembra que, mesmo que as cinzas fiquem dispersas na atmosfera, muitos fatores interferem nesse movimento. Um deles são os ventos horizontais que levam as partículas pelos países.
Além disso, no Hemisfério Sul, a circulação dos ventos estratosféricos é sempre de leste para oeste. “Essas partículas seguem esses ventos. Só que também existem correntes de ar descendentes e ascendentes em locais específicos. Quando essas partículas atingem uma corrente descendente, acabam precipitando”, acrescentou.
A explosão do vulcão submarino Hunga Tonga-Hun-gaHa’apal aconteceu no dia 15 de janeiro e já é considera- da por muitos estudiosos uma das maiores erupções vulcânicas dos últimos 30 anos, pois a sua intensidade foi percebida em vários países.
O pesquisador observa que esse avermelhado no céu, por conta das partículas do vulcão é um acontecimento raro, embora ele também fique avermelhado em situações de queimadas, por exemplo. “ A diferença é que essas cinzas agora estão na estratosfera e a gente consegue ver por mais tempo. Esse fenômeno provocado pelas cinzas do vulcão é raro porque precisa não só de uma grande erupção, mas de uma explosão intensa o suficiente para lançar essas cinzas tão alto”, esclareceu.
Marcelo destacou que na maior parte das erupções, as cinzas ficam abaixo das nuvens de chuva. Isso faz com que elas precipitem bem antes. Portanto, não chegam a alcançar uma distância tão grande na atmosfera. Em nota, a Associação Paraibana de Astronomia confirmou que a explosão lançou bilhões de metros cúbicos de cinzas na estratosfera, a mais de 30 km de altitude. Trata-se de uma nuvem de gás, vapor e cinzas nas camadas mais altas da atmosfera que atravessou os oceanos Pacífico e Índico, passou pela África e mesmo com a intensidade reduzida alcançou a costa brasileira.
“A explosão do Hunga-Tonga foi tão intensa que foi escutada a mais de 500 km de distância. Mas o fato de estarmos a quase 15 mil km de Tonga não nos livra totalmente dos efeitos de uma erupção como essa. A onda de choque gerada pela erupção deu várias voltas no mundo e foi percebida por estações meteorológicas em todo planeta, inclusive na Paraíba. Também foi registrada a partir do espaço, em imagens de satélite”, informou o texto da entidade.
Cinzas lançadas
A circulação de ar fez com que as partículas subissem para as camadas mais altas da atmosfera e assim pudessem se deslocar levando as cinzas vulcânicas. A APA definiu que o principal motivo para as cinzas do vulcão terem chegado à Paraíba é que a erupção do Hunga-Tonga lançou as cinzas na estratosfera, há mais de 30 km de altitude.
“Lá elas encontram fortes ventos que podem levá-las para longe e, como estão acima das nuvens que formam as chuvas, permanecem em sus- pensão por mais tempo”, esclareceu em nota.
Fenômeno não afeta o clima da região
Apesar das cinzas terem “viajado” pela estratosfera e alcançado diversas regiões brasileiras, o fenômeno não exerce nenhuma influência no clima dessas áreas. A informação é do meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Flaviano Fernandes, o qual aponta que: “Essa foi apenas uma manifestação visual no céu que não teve nenhuma influência no clima. Tratam-se apenas de algumas partículas de poeira. Não existe nenhuma relação com o clima”, afirmou.
A Associação Paraibana de Astronomia também considerou que não exis- tem razões para se preocupar com os efeitos dessas cinzas no clima, porque não são prejudiciais. Também reforçou que ainda não foi confirmado como essa erupção vai interferir no planeta. “Embora uma erupção lance na atmosfera uma enorme quantidade de CO2, que é um gás que produz efeito estufa, isso ainda é, incrivelmente, bem menos do que produz a atividade humana”, pontuou em nota.
No entanto, a APA ressalta que no momento em que as cinzas atingem a estratosfera, o enxofre se converte em ácido sulfúrico, que se condensa rapidamente formando aerossóis de sulfato. Esses aerossóis são capazes de refletir mais a radiação solar de volta para o espaço, provocando o efeito contrário do CO2. “No fim, a erupção ajuda a combater o efeito estufa. Mas além disso, erupções vulcânicas muitas vezes foram responsáveis pelo resfriamento do planeta”, completou a ApaPB.
Entenda
No dia 15 de janeiro, a erupção do vulcão Hunga Tonga-HungaHa’apai, localizado no Pacífico Sul gerou um alerta mun- dial. Ela durou em torno de oito minutos e causou uma grande explosão, além de tsunamis que atingiram as costas das ilhas próximas. Também houve registros de ondas nos Estados Unidos, Nova Zelândia, Japão e Peru.
O vulcão é formado pela união de duas ilhas desabitadas, Hunga Tonga e HungaHa’apai, localizadas 65 km ao norte de Nuku’alofa, capital de Tonga. Trata- se de uma região de alta atividade sísmica onde foram registradas erupções de magma e vapor em 2009, 2014 e 2015. Porém, foram alterações menores do que a que aconteceu em janeiro.
O Hunga Tonga-HungaHa’apaié um vulcão sub- marino do tipo basáltico (como os do Havaí) e por essa razão suas erupções tendem a ser menos violentas em comparação aos outros tipos
Vulcões submarinos são aqueles localizados totalmente ou em sua maioria abaixo do nível do mar. Segundo a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (Noaa – sigla em inglês), as erupções vulcânicas subaquáticas são características das zonas de ruptura onde se formam as placas da crosta terrestre. A entidade americana prevê que três quartos da atividade vulcânica do planeta correspondem a erupções submarinas.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 08 de fevereiro de 2022