Trabalhadores da Paraíba estão, cada vez mais, atentos aos seus direitos e lutando por eles. Um dado que comprova essa atenção é o número de denúncias realizadas junto ao Ministério Público do Trabalho na Paraíba (MPT-PB) no primeiro trimestre deste ano. Segundo dados do órgão, 458 denúncias foram registradas, somando 471 procedimentos investigatórios, entre janeiro e março deste ano.
Os números apresentam um aumento de 17% em comparativo ao mesmo período de 2022, com 392 denúncias registradas que resultaram em 461 procedimentos investigatórios.
Ao todo, no ano passado, o órgão recebeu 1.661 denúncias e efetuou 1.870 procedimentos investigatórios. As três principais demandas foram referentes à jornada de trabalho, com 393 procedimentos instaurados; atraso ou mora contumaz no pagamento do salário, com 323 procedimentos efetivados; e violência ou assédio psicológico, com 280 procedimentos. O número de procedimentos instaurados é maior do que o de denúncias, porque, em uma única denúncia, pode haver mais de uma irregularidade passível de investigação.
Os dados não são nada animadores neste Dia do Trabalho e demonstram que, após 80 anos de implantação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o cidadão ainda é desrespeitado nos seus direitos básicos.
“Em pleno século 21, o trabalhador tem os direitos básicos desrespeitados, não apenas em nível de Brasil, mas no mundo, em virtude de um padrão cultural de parte do empresariado que não cumpre a legislação, e aguarda uma eventual reprimenda do Ministério Público ou do Judiciário”, comentou a procuradora-chefe do MPT-PB, Andressa Ribeiro Coutinho.
Segundo ela, para reverter essa situação seria preciso uma mudança cultural do setor empresarial que deveria aplicar, antes de tudo, a legislação, para não incorrer em uma ilegalidade.
“Se isso ocorresse, teríamos uma fluidez no ambiente de trabalho muito mais profícua, porque o trabalhador se sentiria efetivamente possuidor dos seus direitos, e isso geraria mais produtividade e com uma melhor qualidade. Um trabalhador que tem seus direitos garantidos, que recebe o salário no dia certo e pode pagar suas contas sem atraso, tem uma qualidade na atividade laboral, infinitamente, maior”, acrescentou.
Andressa Coutinho enfocou que o assédio no ambiente de trabalho, assim como a violência psicológica, são práticas que preocupam bastante o MPT-PB, pois nelas estão contidas ações como o assédio moral, sexual e a perseguição. “Essas práticas, infelizmente, vêm crescendo, sobretudo após o trabalho remoto, o teletrabalho. E isso faz com que tenhamos um número significativo de denúncias”, avaliou.
O superintendente regional do Trabalho na Paraíba, Paulo Marcelo de Lima, também lamentou. “Isso é muito triste. A reforma trabalhista e o projeto de terceirização não ajudaram a força de trabalho.”, declarou.
Ele ainda citou outros casos comuns atualmente no universo corporativo, como a negativa do vínculo empregatício ao trabalhador. “Isso se tornou constante, sobretudo após a liberação do terceirizado em várias áreas”.
CLT, que visa a garantia de direitos aos trabalhadores, completa 80 anos
Há 80 anos, os trabalhadores vivenciavam uma importante mudança nas relações entre empregado e empregador com a implantação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pelo então presidente Getúlio Vargas. O documento é considerado um marco histórico para a classe trabalhadora, uma vez que regulamentou inúmeros direitos. Apesar de o dia 1o de maio de 2023 marcar as oito décadas de sua implantação, ainda há críticas em relação ao cumprimento dessas normas protetivas.
O superintendente Regional do Trabalho na Paraíba, Paulo Marcelo de Lima, declarou que além da grande disputa por um emprego hoje em dia, o cidadão que conquista uma colocação ainda está sujeito a situações que não condizem com a legislação vigente.
“Depois do desemprego, o pior problema para o cidadão, após estar empregado, são as condições de trabalho, as condições de salário e ambientais. O Ministério do Trabalho vem descobrindo pessoas atuando em situação análoga à escravidão nas fazendas de frutas, em outro tipo de atividade econômica, muito fragilizadas. Com o aumento do desemprego e a diminuição dos direitos, toda sorte de dificuldade atinge os trabalhadores e deixa-os muito vulneráveis”, frisou.
Apesar das críticas referentes à desobediência à CLT, Paulo Marcelo afirmou que a implantação da norma ainda tem força para garantir direitos que eram impensáveis em 1943, quando foi criada. A historiografia mostra que, antes do documento, trabalhadores exerciam funções em até 18h diárias, em ambientes insalubres e outros agravos. Mulheres e crianças também eram submetidas às más condições laborais e recebiam metade do dinheiro estipulado pelo serviço.
A procuradora-chefe do MPT-PB, Andressa Ribeiro Coutinho, frisou que a CLT é considerada um marco histórico na garantia de direitos individuais e coletivos do trabalhador brasileiro. “Ela unificou as legislações trabalhistas existentes no país. Atravessou vários governos e define os direitos e deveres de empregados e empregadores. E fixa o emprego formal no Brasil”.
Em 2017, porém, a CLT foi impactada com a Reforma Trabalhista, instrumentalizada pela Lei no 13.467 daquele ano. O intuito da mudança era tentar conter o crescimento de uma crise econômica instalada, bem como diminuir a alta taxa de desemprego. De acordo com Andressa Coutinho, a Reforma trouxe uma enorme flexibilização aos direitos dos trabalhadores, inclusive aquelas que envolvem a maior possibilidade de acordos entre a entidade jurídica e o colaborador. “Isso faz com que o poder diretivo do empregador cresça demais, e o equilíbrio econômico financeiro do contrato seja abalado com mais facilidade”, enfocou a procuradora.
Já para o superintendente Regional do Trabalho na Paraíba, Paulo Marcelo de Lima, as alterações de 2017 foram um duro golpe. “Depois de 74 anos de vida, em 2017, a CLT foi destruída. Isso foi um golpe duro na sociedade que perdeu direitos conquistados décadas atrás. Criaram-se normas que vêm degradando a classe trabalhadora, que são as atividades por aplicativos, contratos por horas, o trabalho intermitente, e assim por diante. Os trabalhadores têm ainda uma longa estrada para retomar muitos direitos que hoje fazem muita falta, sobretudo no setor privado”, afirmou.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 30 de abril de 2023.