Uma polêmica instalou-se no Mercado Central, em João Pessoa. Comerciantes denunciam que estão precisando pagar, duas vezes por semana, uma taxa para a compra de material de limpeza. Segundo os feirantes, o dinheiro é recolhido no fim do ano, todas as sextas-feiras e sábados, por integrantes da administração do mercado. Apesar disso, os banheiros permanecem sujos, com portas quebradas e sem papel higiênico nas cabines.
Essa cobrança surgiu desde o ano passado e ocorre nos meses de novembro e dezembro. Uma das feirantes que paga essa taxa é Valéria Rodrigues, que vende frutas no mercado. Ela estava afastada do comércio, mas retornou ao setor neste mês e já começou a receber reclamações dos supostos responsáveis pela coleta do dinheiro. “Eles não estabelecem um valor, dizem que é uma contribuição, mas se você der R$ 2, R$ 3, eles acham ruim. Perguntam: ‘Se vocês não pagarem, como é que vai ficar? Vai ficar tudo sujo de novo? Você não gosta de usar o banheiro limpinho?’. Por isso se torna obrigatório”, conta.

- Apesar de abrigar milhares de feirantes, Mercado Central tem banheiros com problemas de manutenção, como portas quebradas
De acordo com a vendedora, o ambiente dos sete banheiros do mercado passou por pequenas melhorias, ainda insuficientes diante da grande movimentação no local — afinal, segundo a administração, o espaço abriga mais de três mil feirantes. Antes das cobranças, a rede de esgoto dos sanitários estava a céu aberto, com canos estourados, e as portas não funcionavam. Hoje em dia, pouco mudou: o problema com o encanamento até foi resolvido e portas foram instaladas, mas essas estão em más condições e não fecham direito.
“As mulheres tinham que usar o banheiro sem porta, sem limpeza. Estava entregue às moscas. Não tinha como usar o banheiro, porque a gente estava à mercê, né? De germes, de bactéria, dava muito mau cheiro. Não tinha privacidade. Aí, agora, eles dizem que [o dinheiro] é para esse fim. Que colocaram as portas lá, as descargas. Mas nós não sabemos se eles estão enviando esses produtos [de limpeza], se eles pagam, se eles estão fazendo esse serviço. Não tem prestação de contas”, revela.
Mesmo após tentativas de registrar uma denúncia formalmente, não houve medidas para a resolução do problema. Para a feirante, é preciso protestar contra essa arrecadação. “Não sei se eles vão aceitar minha decisão. Mas eu não quero mais pagar, porque eu não sou obrigada a fazer isso. Essa higienização a gente já paga com nossos impostos. Tem pessoas capazes para isso”, afirma.
Como Valéria, os comerciantes Cíntia e Marco Antônio Fernandes também declaram presenciar a cobrança da taxa para a limpeza do mercado. Os feirantes apontam que a pessoa encarregada pelo recolhimento do dinheiro apenas se apresenta como parte da administração do estabelecimento, sem crachá ou qualquer indicação necessária.
“Ele alega que o prefeito não está mandando verba, quer que a gente dê R$ 10. Se a pessoa der menos, ele fica com a cara feia, mas recebe. No ano passado, foi do mesmo jeito. Só que, quando ele foi cobrar lá embaixo, o pessoal começou a falar e ele não subiu mais. Diz que é para comprar material de construção, que botou porta, mas nenhuma tem fechadura nas portas. E é porta recondicionada, resto de porta velha reutilizada. As próprias funcionárias do banheiro reclamam porque ele não traz produto de limpeza suficiente”, explica Cíntia.
Segundo Marco, os únicos produtos para a higienização semanal dos banheiros são garrafas de 500 ml com água sanitária. Não há uma justificativa para a exigência de uma contribuição semanal para essa manutenção. “São eles que têm que manter a limpeza. Isso é obrigação da prefeitura, não dos comerciantes”, pontua.
Posicionamento
A administração do Mercado Central afirmou que passou a ter conhecimento da cobrança de uma taxa destinada à limpeza do local após a investigação realizada pelo jornal A União e deu um prazo de 90 dias para apurar os fatos. De acordo com o representante, que preferiu não ser identificado, a higienização do estabelecimento é de responsabilidade da Autarquia Especial Municipal de Limpeza Urbana (Emlur) de João Pessoa, enquanto a compra de materiais de limpeza cabe à Prefeitura do município. Não há fiscalização ou câmeras de segurança para avaliar possíveis suspeitos.
A Secretaria de Desenvolvimento e Controle Urbano (Sedurb) da cidade negou a procedência da denúncia e confirmou que a limpeza, varrição e coleta de resíduos são feitas diariamente pela Emlur. O órgão também informou que a própria administração do mercado é responsável pelos produtos de limpeza. Já a Emlur comunicou que não há cobrança extra para limpeza tanto do Mercado Central quanto dos demais comércios públicos da capital.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 20 de novembro de 2025.