O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na Paraíba foi imitido na posse do segundo dos três imóveis rurais que compõem a área de Tambauzinho, no município de Santa Rita, Região Metropolitana de João Pessoa. Realizado no dia 30 de setembro, o ato — que garante legalmente a efetiva propriedade do terreno em questão à autarquia federal — foi celebrado com carro de som e fogos de artifício, além de uma procissão de famílias locais pela principal rua da comunidade, às margens do Rio Paraíba.
Ocupando aproximadamente 125 dos 375 hectares de Tambauzinho — que já foi considerado o território mais conflituoso de todo o estado —, o imóvel beneficiará, de acordo com o Governo Federal, 32 famílias de posseiros que habitam o lugar há cerca de 50 anos. A área está situada em uma região valorizada e de terras férteis, historicamente explorada para o cultivo de cana-de-açúcar e visada por empresários do setor da construção civil e por criadores de camarão.
O decreto de desapropriação dessa segunda parte do território original de Tambauzinho foi publicado em dezembro de 2008 e a imissão do Incra na posse do imóvel aconteceu no dia 26 outubro de 2010, sendo que esta, contudo, foi posteriormente suspensa pela Justiça. Quanto à posse do primeiro imóvel da área, a imissão da autarquia ocorreu no dia 3 de julho de 2008. Em 8 de abril de 2009, foi criado o assentamento Dom José Maria Pires, onde já vivem as 32 famílias de posseiros.
Meta é assentar famílias e garantir a venda da produção local
Representando o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) do país, Paulo Teixeira, o assessor especial Alexandre Conceição, presente no evento do último dia 30, destacou que a ordem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é assentar todas as famílias acampadas em Tambauzinho.
“É a primeira imissão de posse do Governo Lula III na Paraíba. E será a primeira de muitas. Mais de 15 áreas no estado estão em processo avançado de desapropriação”, declarou Alexandre, na ocasião. “Vamos assentar as famílias, depois oferecer assistência técnica e, por fim, garantir a comercialização da produção por meio dos programas PAA [Programa de Aquisição de Alimentos] e Pnae [Programa Nacional de Alimentação Escolar]”, acrescentou o assessor especial do MDA.
Política
Mais de 15 outros territórios no estado estão em processo avançado de desapropriação, segundo assessor especial do MDA
A diretora da Câmara de Conciliação Agrária (CCA) do Incra, Maíra Coraci Diniz, também participou da solenidade e disse ter se impressionado com a riqueza e a beleza da região. “Participando dessa conquista no dia de hoje, desse momento de alegria, vemos como é importante a resistência e a persistência desse povo. Saio daqui com um grande aprendizado”, destacou.
Por sua vez, o superintendente regional do Incra na Paraíba, Antônio Barbosa Filho, ressaltou, durante seu discurso no ato, o trabalho dos servidores da autarquia na efetivação da nova imissão de posse em Tambauzinho. Já a irmã Tânia Mara de Sousa, uma das lideranças de movimentos sociais do campo que fizeram parte do evento, comemorou o resultado dos esforços coletivos. “A gente aprende nessa caminhada que sozinhos não chegamos a lugar nenhum”, disse a irmã Tânia Mara, que atua há 30 anos na Comissão Pastoral da Terra (CPT). “A luta não é fácil, mas quando a gente chega nesse momento, sente que valeu a pena”, declarou um dos novos líderes de Tambauzinho, Sandro Antônio Sabino, outro dos presentes na solenidade.
Participaram do ato, ainda, o oficial de Justiça Federal Algacy de Arruda Palmeira; o coordenador-geral de implantação de assentamentos do Incra Sede, André Luiz Bonfim; o procurador federal José Godoy Bezerra de Souza; e o secretário da Agricultura Familiar e Desenvolvimento do Semiárido do Governo da Paraíba, Frei Anastácio, além de agricultores que habitam o local e assentamentos vizinhos.
Disputas
Os conflitos em Tambauzinho tiveram início em 1996, depois que o proprietário da fazenda faleceu e as terras foram repassadas para três herdeiros.
De acordo com Frei Anastácio, que já foi superintendente do Incra no estado, a autarquia tentou adquirir a propriedade por meio de um decreto, mas não houve acordo em relação ao valor do imóvel. “Em 2002, a situação das famílias se complicou ainda mais, depois que a fazenda foi vendida. Os novos proprietários fizeram de tudo para despejar os posseiros. Além disso, eles colocaram milícias armadas, que destruíram plantações, queimaram casas, espancaram e chegaram a atirar em trabalhadores. As ameaças eram constantes, sem falar nos despejos realizados por centenas de policiais, que, muitas vezes, chegaram a usar até gás lacrimogêneo contra os trabalhadores”, relatou o secretário.
A comunidade de moradores locais resistiu a quatro ordens de despejo e permaneceu no território ao longo dos anos, dedicando-se atualmente ao plantio de macaxeira, inhame, batata-doce, milho e hortaliças.
Visada por empresários, região de terras férteis é motivo de disputas desde 1996
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 03 de outubro de 2024.