Há exatos 18 anos, a lei que leva o nome da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de duas tentativas de feminicídio, foi criada para proteger outras mulheres de ter as suas vidas encerradas devido à violência doméstica. Antes da Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006, a agressão contra a mulher era tida como um crime de menor potencial ofensivo, o que levava o agressor a ser punido somente com multas ou prestação de serviços, enquanto o ciclo de violência se perpetuava.
Mesmo com a legislação, que promoveu um avanço histórico na causa feminina, e com as campanhas de informação que vieram depois dela, houve aumento em todas as modalidades de violência contra mulheres, no Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho passado. O levantamento explicitou que, em 2023, os casos de agressão decorrentes de violência doméstica cresceram 9,8%. Já os de abuso psicológico foram 33,8% maiores. Além disso, no ano passado, o Brasil perdeu quase 1,5 mil mulheres para o feminicídio.
São números que alarmam, mas que talvez sempre tenham existido — apenas eram abafados. Para Mônica Brandão, coordenadora da Patrulha Maria da Penha na Paraíba, a subnotificação dos casos sempre foi um ponto de debate. “Hoje, com a criação da Delegacia da Mulher, da rede de Patrulha, dos Centros de Referências e do atendimento virtual, as mulheres se sentem mais protegidas e seguras para denunciar a violência. Ou seja, os casos estão sendo registrados, diferentemente do que acontecia anos atrás. É por isso que estamos vendo esse aumento”, explica.
Patrulha
Outro dado trazido pelo Anuário mostrou que a Justiça concedeu 540 mil medidas protetivas de urgência (MPUs) para as mulheres brasileiras. No momento em que essa medida entra em vigor, a Patrulha Maria da Penha entra em ação para garantir que ela seja cumprida. Criada em 2019, na Paraíba, a Patrulha está vinculada à Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana (Semdh) e atua no acolhimento e no monitoramento de mulheres que solicitaram ou estão com o deferimento da MPU em andamento. Esse trabalho serve para garantir que o agressor não descumprirá a medida. Além dos policiais militares — na maioria, do sexo feminino — que vão até os endereços informados pela mulher como sendo de risco, a Patrulha também oferece atendimentos jurídico, psicológico e de assistência social.
"As mulheres estão mais seguras para denunciar. Por isso, vemos esse aumento no número de casos"
- Mônica Brandão
“No senso comum, as pessoas acreditam que a Lei Maria da Penha é punitiva, mas ela é muito mais protetiva e preventiva. Ela vem para responsabilizar os entes da Federação no sentido de criar esses instrumentos de proteção para a mulher. O diferencial da Paraíba é ter uma equipe multiprofissional, que compreende a fiscalização do cumprimento da medida protetiva como uma garantia para a mulher. A prova disso é que, desde a criação da Patrulha, atendemos três mil mulheres, em 128 municípios da Paraíba, e não tivemos nenhuma delas perdida para o feminicídio”, comemorou Mônica.
Além da criação da Patrulha Maria da Penha, a Semdh também investe na transversalidade com os demais órgãos do governo. “Ao acolher uma mulher em situação de violência, ou mesmo ao evitar que isso venha a acontecer, envolvemos todo o governo. Estamos falando de hospitais, escolas, creches, praças e parques públicos, e não somente da força policial ou das casas de abrigo. Então, temos, por exemplo, o programa Empreender Mulher, que incentiva a geração de renda própria para a vítima. Outra prioridade é interiorizar as ações, fazer com que a mulher da Zona Rural tenha a mesma estrutura de acolhimento que uma que vive na capital”, detalhou Lídia Moura, secretária da Mulher.
Para ela, a Lei Maria da Penha permitiu às mulheres acreditarem que havia uma solução para a violência. “Estamos falando de um importante instrumento para promover a vida das mulheres. Não é a toa que a lei é uma das três mais importantes do mundo, de acordo com a Organização das Nações Unidas. A partir da Maria da Penha, as vítimas puderam perceber que não se troca mais agressão por ações comunitárias ou cesta básica”, ressaltou.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 07 de agosto de 2024.