por André Resende*
O Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba (IHGP), fundado em 1905, nasceu em um movimento que se espalhava pelo país, com o surgimento de instituições parecidas em todos os estados, à semelhança do Instituto Histórico Geográfico do Brasil. Mais de cem anos depois, entre participações importantes na história local e a diminuição da influência política no estado, outros institutos históricos foram surgindo no território paraibano. Um levantamento feito pelo Jornal A União, com ajuda do Instituto Histórico de Campina Grande (IHCG), aponta que a Paraíba conta com um total de 19 institutos históricos.
A maior parte dessas instituições, 13 ao todo, nasceu no século 21. Três dos institutos históricos abertos na Paraíba, inclusive, foram fundados no ano passado, nas cidades de Caturité, Ingá e Puxinanã. Das dez cidades mais populosas, somente a metade delas, incluindo a capital paraibana, como sede do IHGP, possuem seu próprio instituto histórico: João Pessoa, Campina Grande, Patos, Cajazeiras e Bayeux.
O historiador Matheus Guimarães, mestre em História pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), explica que a difusão dos institutos locais, sobretudo em cidades pequenas, tem papel interessante na manutenção da memória local, de preservação de arquivos históricos dessas cidades.
“De fato, tem uma preocupação em garantir uma preservação do patrimônio, de acervos, e de trabalhar a ideia de reforçar a identidade local. Normalmente, nós temos uma visão mais geral, de pensar a Paraíba como um todo, até o Brasil como um todo, e não nas particularidades. Além de ter o papel de preservação, é também um espaço de socialização, de vivência de alguns grupos da cidade”, explica.
No caso do IHGP, Matheus Guimarães explica que ele foi fundado a partir de um movimento nacional de fundação de instituições semelhantes em todos os estados. Nascidos com o objetivo de escrever uma história, criar uma identidade, buscar a preservação da memória de arquivos, um espaço de construção de conhecimento histórico. Essas entidades foram responsáveis por estabelecer uma visão da história a que se chama de oficial.
Fundado à época por parte da elite paraibana, sobretudo a política, o IHGP foi responsável por construir uma identidade local, trabalhar o termo “paraibanidade” e difundir valores. O termo “paraibanidade”, cunhado a partir das revistas publicadas pelo Instituto, bem como a postura altiva em relação aos heróis e batalhas do estado, aliado a um forte sentimento de rechaço ao período colonial em que a Paraíba esteve anexada à Pernambuco, foram algumas das construções do IHGP para criação da identidade do povo paraibano.
“Isso fica muito claro em alguns textos da revista do Instituto, que era um mecanismo de divulgação desse conhecimento. O próprio slogan do Instituto nos primeiros anos, que inclusive vai ser usado no brasão da cidade de João Pessoa, é “intrepida ab origine”, algo como Paraíba forte desde sua origem. Até mesmo algumas datas históricas que se tornaram feriado foram influenciadas pelo Instituto, como é o 5 de agosto, o movimento de 1930, com o hino, a bandeira do estado, o dia da morte de João Pessoa era uma data marcante na cidade”, detalha.
A importância desse papel se deu para que o povo paraibano criasse uma espécie de rivalidade com Pernambuco, tamanha era a influência do IHGP na formação da opinião crítica da população. Outro instituto muito tradicional e que data do século passado, e que presta um serviço de preservação da memória local, é o Instituto Histórico de Campina Grande (IHCG), fundado em 1948.
Entre a criação, a partir do então prefeito da cidade à época, Elpídio de Almeida, até os dias atuais, quando se encontra em sua sede à Rua Maciel Pinheiro, na esquina com a Avenida Floriano Peixoto, no prédio em que já funcionou a Prefeitura de Campina Grande (PMCG), onde também funcionou por muitos anos a Câmara Municipal (CMCG), foram três fechamentos e três reaberturas. A última delas em 2012, perdurando até os dias atuais.
O presidente do IHCG, Vanderley de Brito, relata que, desde então, muito tem sido feito para ampliar a capacidade do Instituto, sobretudo no seu potencial museológico. Desde que assumiu a presidência da instituição, a batalha de sua gestão é para acomodar o IHCG em sua sede, organizar o material que foi resgatado ao longo dos anos e tornar o espaço acessível.
“Temos uma função didática, uma função de salvaguarda do patrimônio de Campina Grande. Por isso pedimos sempre para que as pessoas façam doações de fotografias, souvenirs, tudo que possa ser restaurado, higienizado para que a gente faça a proteção desse material. Toda essa documentação é fundamental para a produção de trabalhos acadêmicos, como teses, dissertações”, explica.
Não existe uma cultura de visitas
Mesmo sendo um dos mais antigos institutos históricos, o IHCG sofre dos mesmos problemas dos demais espaços públicos reservados à história local. Além da pandemia, que naturalmente afastou a presença física de muitas pessoas, Vanderley de Brito analisa que inexiste no estado uma cultura de visita a museus ou demais espaços reservados à preservação da memória do próprio povo.
“Não existe uma cultura na Paraíba de visitar museus. Quando acontece, ou é uma escola que promove a visita, e as crianças e os adolescentes são obrigadas a ir, ou é algum turista ocasional que chega e quer conhecer alguma coisa. Ainda não existe essa cultura e compete a nós, historiadores, memorialistas, gerar essa nova consciência das pessoas visitarem esses museus, esses espaços. Acredito que temos uma dívida muito grande com a memória, não só em Campina Grande, mas em João Pessoa e em outras cidades”, lamenta.
O desafio para o IHCG e demais institutos é atrair cada vez mais pessoas para visitar a história. O primeiro passo é ter um espaço organizado para que sirva não só de visita, mas de cenário para eventos, gravações e locações de artistas, como conta Vanderley de Brito: “A gente sempre estimula para que venham fazer gravações musicais, entrevistas, para que as pessoas utilizem como cenário. Isso já é um modo de fazer a divulgação. Pretendemos no futuro fazer, sim, imagens do espaço. Vamos criar um site, para criarmos as condições de uma visita virtual pelo Instituto Histórico de Campina Grande”, detalha.
Carregando a pesada missão de preservar a memória e história local, enfrentando obstáculos invisíveis como o novo coronavírus e disputando o interesse em termos de entretenimento com mercados consolidados como o da música e do cinema, os Institutos Históricos e espaços museológicos seguem com um mantra: resistência.
Vanderley de Brito reforça que não precisa inventar muito, e indica o caminho, popularizar a própria história. “A história é muito simples de contar. Se você colocar ludismo, as pessoas vão aprender, vão admirar e vão se contextualizando, tomando novas atividades a partir dela”, arremata.
Lista de instituições no estado da Paraíba
• Alagoa Nova: Instituto Histórico e Geográfico de Alagoa Nova (IHGAN), fundado em 2019
• Areia: Instituto Histórico e Geográfico de Areia (IHGA), fundado em 2018
• Bayeux: Instituto Histórico e Geográfico de Bayeux (IHGB), fundado em 2008
• Boqueirão: Instituto Histórico e Geográfico de Boqueirão (IHGB), fundado em 2020
• Cajazeiras: Instituto Histórico de Cajazeiras (IHC), fundado em 2004
• Campina Grande: Instituto Histórico de Campina Grande (IHCG), fundado em 1948
• Caturité: Instituto Histórico e Geográfico de Catutiré (IHGC), fundado em 2021
• Esperança: Instituto Histórico e Geográfico de Esperança (IHGE), fundado em 2018
• Gado Bravo: Instituto Histórico e Geográfico de Gado Bravo (IHGGB), fundado em 2019
• Ingá: Instituto Histórico e Geográfico de Ingá (IHGI), fundado em 2021
• João Pessoa: Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba (IHGP), fundado em 1905
• Lagoa Seca: Instituto Histórico e Geográfico de Lagoa Seca (IHGLS), fundado em 2020
• Patos: Instituto Histórico e Geográfico de Patos (IHGP), fundado em 1998
• Pocinhos: Instituto Histórico e Cultural de Pocinhos (IHCP), fundado em 2012
• Puxinanã: Instituto Histórico de Puxinanã (IHP), fundado em 2021
• Santa Luzia: Instituto Histórico e Geográfico de Santa Luzia (IHGSL), fundado em 2016
• São João do Cariri: Instituto Histórico e Geográfico do Cariri Paraibano (IHGCP), fundado em 2006
• Serra Branca: Instituto Histórico e Geográfico de Serra Branca (IHGSB), fundado em 2015
• Umbuzeiro: Instituto Histórico e Geográfico de Umbuzeiro (IHGU), fundado em 2019
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 13 de março de 2022