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Nos próximos anos

Paraíba sofrerá novos impactos das mudanças climáticas

publicado: 16/03/2023 00h00, última modificação: 16/03/2023 12h53
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Alterações climáticas devem provocar avanço do mar em direção às praias no litoral paraibano. Foto: Evandro Pereira.

por Sara Gomes*

As mudanças climáticas, previstas em decorrência do aquecimento global, têm afetado cada vez mais a vida das pessoas. Basta observar chuvas torrenciais, desmatamentos, secas mais duradouras, furacões e aumento do nível do mar se tornaram cada dia mais frequentes. Esses fenômenos poderão impactar a biodiversidade, tanto sobre o continente quanto nos oceanos, segundo especialistas.

Para compreender o cenário que se apresenta, instituiu-se o Dia Nacional de Conscientização sobre as Mudanças Climáticas, no dia 16 de março. Para o Dr Ranyére Silva Nóbrega, professor da Unidade Acadêmica de Geografia na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), a Paraíba também sofrerá mudanças nos próximos anos, segundo pesquisas. “O estado sofrerá aumento das temperaturas nos próximos anos e, consequentemente, nas taxas de evaporação. Com a diminuição das chuvas, deverá ocorrer escassez de água na região do semiárido. No litoral acontecerá o avanço do mar em direção à praia, como também chuvas concentradas em pouco tempo, provocando alagamentos urbanos, movimentos de massa e árvores derrubadas”, declarou.

As mudanças climáticas tendem a intensificar o processo de desertificação. Este processo ocorre pela soma de fatores naturais (clima semiárido e tipo de solo) e pela ação humana, através da degradação do ambiente natural (retirada da vegetação e do solo, compactação do solo e manejo inadequado.

Ranyére alerta ainda que ocorrerá o aumento da desertificação no semiárido paraibano. “Com a elevação da temperatura ocorrerá, consequentemente, a taxa de evaporação, vamos ter mais áreas suscetíveis à desertificação. O semiárido é a região mais vulnerável da Paraíba por questões socioeconômicas, mas também pelo próprio bioma, apesar de ser resistente, mas pode ser fragilizado pelo aumento do processo de desertificação”, disse.

Pesquisador aponta aumento de temperatura, diminuição de chuvas, escassez de água e avanço do mar no estado

Relatório do IPCC estima aquecimento de 1,1°C

O sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, sigla em inglês) estima um aquecimento atual de 1,1°C. Cada uma das últimas quatro décadas foi sucessivamente mais quente do que qualquer outra década que a precedeu desde 1850. O homem tem aquecido o clima a uma taxa sem precedentes há, no mínimo, 2 mil anos.

De acordo com o autor e pesquisador do IPCC, Lincoln Alves, a principal causa do aquecimento global é a influência humana. “O consumo de energia é de longe a maior fonte de emissões de gases de efeito estufa causadas por seres humanos, responsável por 73% das emissões mundiais. O setor de energia inclui transporte, eletricidade e geração de calor, edifícios, fabricação e construção, emissões fugitivas e outras queimas de combustível”, declarou. No contexto do Brasil a contribuição maior para as emissões dos GEE advém do uso e cobertura da terra (agropecuária e desmatamento).

A mudança do clima, provocada pela ação humana, está afetando muitos extremos de tempo e clima em todas as regiões do planeta. Os extremos são uma ameaça grave e crescente, podendo provocar fome intensa, insegurança hídrica e mortalidade em massa de espécies de árvore. “Seria extremamente improvável que alguns dos extremos de calor observados recentemente na última década acontecessem sem a influência humana. Esses extremos têm impactado diversos setores socioeconômicos e afetando as vidas de bilhões de pessoas em todo o mundo, apesar dos esforços para reduzir riscos”, alertou Lincoln, autor do IPCC.

População vulnerável é a mais atingida com as mudanças climáticas

O professor da UFCG Ranyére Silva Nóbrega ressalta que os vulneráveis são os mais prejudicados com as mudanças climáticas. As universidades públicas têm dialogado como é possível diminuir os impactos ambientais e estratégias de resiliência para a sociedade civil e biodiversidade. 

“Existe uma injustiça climática muito severa para os mais vulneráveis e estamos trabalhando bastante para mostrar este fato, como também convidar as autoridades para discutir com os pesquisadores e cientistas. Ainda há muita resistência do poder público para este tipo de discussão”, concluiu.

Apesar da importância de conscientizar a população sobre os efeitos nocivos ao meio ambiente, o professor afirma que surtiu pouco efeito. “Há três décadas ocorreu um discurso sobre conscientização, mas não surtiu efeito. Falávamos de diminuir o uso de combustíveis fósseis (usar bicicletas, transporte coletivos, etc), e do consumo de eletricidade. Pode até ter nos ajudado a criar uma consciência ambiental e economizar algum dinheiro, mas o que foi feito para amenizar as mudanças climáticas? Se houve algum investimento foi mínimo, tanto é que estamos em uma situação climática emergencial”, criticou.

O professor da UFCG explica ainda que não haverá aumento significativo da temperatura nas próximas décadas pois o Nordeste já se encontra próximo da linha do Equador, no entanto, implicará em maior escassez de água. “O aumento da temperatura no Nordeste já é menor do que em outras regiões como Europa, Estados Unidos e Sul do Brasil, porém nas próximas décadas os dias mais quentes serão mais frequentes do que os atuais. No entanto, a taxa de evaporação do Nordeste já é alta pela localização (região equatorial e tropical), aumentando a escassez de água”, alertou.

Clima bipolar chama atenção do pessoense

 O pessoense costuma brincar com a bipolaridade do clima de João Pessoa. O dia está ensolarado, mas meia-hora depois cai uma chuva torrencial. O especialista explica que é uma característica das localidades equatoriais, mas os sistemas de previsão estão cada vez mais eficientes, porém é preciso investimentos.

“A quantidade de estações meteorológicas na Paraíba é pequena demais, se compararmos com outros estados do Sul e Sudeste. Sem conhecer as informações de hoje (estações meteorológicas) de maneira eficiente, as previsões ficam limitadas. No período do inverno, os sistemas produtores de chuva permitem um acompanhamento melhor, como as ondas de Leste, produzindo chuvas mais distribuídas. No verão, chuvas podem produzir 50mm em Cabedelo e nem chover no Bessa, mesmo com poucos quilômetros de distância”, criticou.

*Texto retificado e ampliado da matéria publicada originalmente na edição impressa de 16 de março de 2023.