por Sara Gomes
As limitações de mobilidade e alterações sensoriais passam a ser mais perceptíveis com a chegada da terceira idade. Uma simples atividade do cotidiano, antes realizada com destreza, se torna uma tarefa complicada. Segundo o Ministério da Saúde, 70% dos acidentes com pessoas de mais de 60 anos acontecem nas residências, no entanto, as quedas podem ser evitadas através de cuidado redobrado e algumas adaptações na arquitetura do ambiente familiar.
Na Paraíba, os Hospitais de Trauma de João Pessoa e Campina Grande registraram ano passado quase 7 mil entradas de idosos acima de 60 anos. No primeiro semestre de 2020, 2.818 idosos vítimas de queda foram atendidos nestes hospitais.
A adaptação da casa é responsabilidade dos familiares, no entanto, eles só procuram fazer alguma intervenção, muitas vezes, após o idoso ter sofrido uma queda ou quando a situação aconteceu com um conhecido. A arquiteta e urbanista Catharina Sarmento explica que todo projeto é pensado para atender às necessidades do cliente. “Em relação ao idoso, deve-se levar em consideração sua rotina e as limitações referentes a saúde, planejando um espaço o mais livre possível de obstáculos, a fim de proporcionar uma melhor segurança”, disse.
Ela enfatiza ainda, a importância de entrar em contato com o arquiteto para garantir a eficiência na reforma. Em relação ao orçamento, o preço varia muito pois cada projeto é analisado individualmente. “ Sempre procuro fazer mais de uma proposta (um mais elaborado, um mediano e outro mais simples). O preço do orçamento vai depender do tipo de material escolhido e o tamanho do ambiente, entre outros fatores, pontuou Catharina.
A idosa Creusa Alexandre, 74 anos, morava em uma casa que oferecia riscos a sua integridade física. A arquiteta e urbanista Josany Barroso e também sua nora, projetou uma casa do zero com algumas medidas de acessibilidade para não a assustar, afinal, a mudança de ambiente não deixa de ser uma ruptura na rotina do idoso
“Compramos um terreno ao lado da casa do meu cunhado, inclusive, o quarto dela tem uma abertura para lá. A minha sogra é lúcida, mas é um pouco debilitada por conta da idade, seria impactante se dona Creusa se deparasse com um ambiente quase hospitalar na casa nova. Por isso, adotamos algumas medidas de acessibilidade de forma sutil. Coloquei poucos desníveis na casa, somente o suficiente para não entrar água da chuva. As portas são bem largas para alguma ocorrência de maca ou até a necessidade de cadeira de rodas no futuro.
Não coloquei rampa de acessibilidade para não deixa-la preocupada. Em relação aos ambientes, procurei deixar o mais arejado e livre possível, com a iluminação natural favorecendo a vivência dela na casa. No banheiro colocamos as barras de apoio para banho e um piso antiderrapante “, explicou.
Além das medidas adotadas para prevenção de quedas, Josany Barroso procurou resgatar a memória afetiva da casa anterior, trazendo alguns elementos como fotografias de netos e familiares, tornado o ambiente bem aconchegante. “ Apesar dos arquitetos considerarem esta composição ‘ muito casa de vovó’, achei válido decorar uma parede da casa só com fotografias. A minha sogra gosta muito de usufruir da calçada e receber os familiares em casa, tanto é que pediu uma área para festa, por isso, colocamos uma churrasqueira. O intuito foi fazê-la sentir que cada detalhe da casa foi preparado com muito amor e cuidado”, enfatizou a arquiteta.
Dicas de como adaptar um ambiente seguro para o idoso
A arquiteta Catharina Sarmento aconselha seus clientes a adaptar a casa como um todo, desde aquele piso da calçada desnivelado a possíveis objetos que deixam os idosos suscetíveis a queda, entretanto, cada cômodo tem suas especificidades:
Quarto
Recomenda-se a utilização de camas baixas. O ideal é que ao sentar, os pés encostem no chão e a perna forme um ângulo de 90º. Catharina sugere também que o quarto seja o mais livre possível de obstáculos para facilitar a mobilidade do idoso. Evitar também cômodos e objetos pontiagudos pois a pele do idoso é muito sensível.
Banheiro
É o ambiente que mais gera preocupação nos familiares pois é o local onde ocorre mais acidentes com idosos. “As pessoas pensam que acessibilidade para o idoso é ter apenas uma barra de apoio no banheiro, porém, envolve um conjunto de medidas preventivas para conseguir um bom resultado”, disse Catharina. É recomendável ter assentos elevados no vaso sanitário para auxiliar na hora de levantar, pois, muitos idosos sentem tontura. Incluir também no projeto um piso antiderrapante. Além disso, um box um pouco maior é fundamental para facilitar o banho com o auxílio do cuidador (a). Deste modo, o banheiro precisa ter uma área livre de 1.5m, ideal para uma cadeira de rodas passar, no entanto, torna-se um desafio, principalmente, em apartamentos.
Cozinha
Um projeto nunca será igual a outro porque cada cliente tem suas peculiaridades. A dica da arquiteta é evitar armários muito altos e medir a altura do cliente para projetar a cozinha de forma personalizada. “ Apesar da maioria dos idosos viverem com a família, eles não gostam de pedir ajuda o tempo todo. Se o armário for alto e o idoso teimoso, ao tentar utilizar uma cadeira para subir, pode sofrer um acidente. Outra dica importante é que a altura da pia também precisa ser personalizada para quem vai usá-la “, exemplificou.
Iluminação
A arquiteta procura aproveitar o máximo de luz natural em seus projetos. Em relação a luz artificial, a dica é trabalhar com a temperatura de luz entre o neutro e o mais amarelado, com a finalidade de trazer mais aconchego ao ambiente. “Evito a iluminação mais branca, principalmente, no quarto, pois alguns estudos apontam que interferem no ciclo circadiano – redução do sono - podendo contribuir para insônia”, sugeriu
Atuação do geriatra na prevenção das quedas
O papel do geriatra é avaliar o envelhecimento do idoso como um todo, tanto no processo fisiológico quanto o patológico. Na situação específica de quedas, a atuação da geriatria é mais focada na prevenção e também na identificação de fatores que aumentam a predisposição do idoso a queda. A geriatra Ana Laura Fernandes informa que existe mais de 70 fatores de risco: “O idoso que caiu uma vez tem uma probabilidade maior de cair novamente, comparado ao idoso que nunca sofreu uma queda. Além de outros fatores clínicos como doenças ósseas (osteoporose, artrose), pacientes sedentários (possuem pouca massa muscular), desnutridos ou com algum comprometimento cognitivo (Alzheimer, Esclerose Múltipla), alterações sensoriais que provocam déficit visual ou auditivo, entre outras limitações”, pontuou.
Obstáculos
Ana Laura alerta também aos familiares sobre os fatores ambientais que podem propiciar uma queda como escadas, excesso de mobília no ambiente, pisos escorregadios ou desnivelados, fios telefônicos, brinquedos espalhados pela casa, tapetes e calçados inadequados que causam instabilidade no pé.
Após a queda ou intervenção cirúrgica do ortopedista, o geriatra em parceria com o fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, e até psicólogo (em situações extremas) realizam um trabalho multidisciplinar de reabilitação no idoso a fim de amenizar o processo traumático pós-queda.
“ Após uma queda, a mobilidade do idoso fica comprometida e o medo de cair novamente aumenta. Mesmo recuperado, muitas vezes, o idoso deixa de realizar suas atividades cotidianas como ir à padaria, levar o lixo para fora, compromete também atividades básicas de autocuidado. Após uma queda, a família fica em pânico também: ‘Pai, o senhor vai pra onde? Vô o senhor precisa de ajuda? Provocando ainda mais insegurança no idoso, então, nosso papel é restabelecer a independência neles”, explicou a geriatra.
*publicada originalmente na edição impressa de 22 de julho de 2020.