O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) deu mais um passo no processo de reconhecimento da Festa do Rosário de Pombal, no Sertão paraibano, como patrimônio cultural do Brasil. Neste ano, o Iphan retomou o acompanhamento técnico da manifestação, com visita à cidade para observar a vitalidade da celebração e dialogar com a comunidade local sobre a importância da preservação dessa tradição centenária.
O pedido de registro da Festa do Rosário, apresentado em 2019, inclui também o tombamento da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em um pleito formulado coletivamente pela sociedade pombalense. A proposta representa o anseio da comunidade de ver reconhecido um conjunto de bens que articula dimensões materiais (como a igreja, o cruzeiro, o pátio e seu entorno, o sítio urbano e a Casa do Rosário, além de acervos documentais e bens móveis) e imateriais, que abrange a festa e os grupos de cultura popular.
No caso do registro de bens imateriais, as fases do processo são as seguintes: abertura do processo; análise técnica preliminar; instrução técnica; análise técnica; e, finalmente, a decisão final, quando o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural vota o deferimento do pedido de registro.
Já para o tombamento de bens materiais, as etapas são: identificação e solicitação do bem; instrução processual (que abrange análise técnica e jurídica); notificação ao proprietário e o registro definitivo após a decisão final. A proteção pode ser concedida provisoriamente durante o processo.
“A devoção ao Rosário em Pombal constitui um complexo cultural de grande relevância, que une fé, memória e identidade. Trata-se de um patrimônio vivo, transmitido de geração a geração e que reflete a presença e a resistência da população negra no Sertão paraibano”, explica a arquiteta e urbanista da superintendência do Iphan na Paraíba, Christiane Finizola.
Raízes remontam à formação histórica e social local
As tradições ligadas à devoção ao Rosário em Pombal remontam à ocupação do interior do Brasil, durante o período colonial. O município, fundado em 1698, como Arraial do Pinhancó, teve papel estratégico nas rotas de penetração empreendidas pela Coroa portuguesa, rumo ao norte da Colônia.
Em 1701, foi erguida a antiga capela do arraial, substituída, em 1721, pela Igreja de Nossa Senhora do Bonsucesso — atual Igreja do Rosário dos Pretos.
O templo tornou-se símbolo da fé e da presença afrodescendente na região, preservando, até hoje, expressões culturais que conectam Pombal a outros municípios vizinhos, como Santa Luzia, Patos, Sousa, Caicó (RN) e Jardim do Seridó (RN).
“A Festa do Rosário é um retrato da formação histórica e social do Sertão. Ela traduz a convivência entre diferentes povos — indígenas, africanos e europeus —, que moldaram a identidade cultural da região”, destaca Christiane.
Ancestralidade
Celebrada anualmente, no início de outubro, a Festa do Rosário tem como ponto alto a Procissão do Rosário, realizada no segundo domingo do mês, após 10 dias de intensas atividades religiosas e culturais. Durante o período, a cidade transforma-se em um grande espaço de devoção e de celebração popular.
A festa vincula-se à ancestralidade negra e aos quilombos reconhecidos no município (Rufino, Daniel e Barbosa), evidenciando a permanência de tradições que reafirmam a história de luta e fé das populações locais.
Toda a cidade é mobilizada para a celebração: moradores, fiéis, comerciantes e pessoas que retornam ao município para participar das festividades. Nas ruas e praças, o patrimônio edificado e o patrimônio imaterial se encontram — a Igreja do Rosário, o pátio e cruzeiro, a Casa do Rosário e o casario histórico tornam-se cenário para os rituais, as danças, as músicas e as expressões de fé que caracterizam o evento.
“O reconhecimento da Festa e da Igreja do Rosário é um passo fundamental para o fortalecimento da política de preservação integrada dos bens culturais de Pombal. É o reconhecimento da força simbólica e da vitalidade de uma celebração que traduz a diversidade e a resistência do povo sertanejo”, conclui a representante do Iphan na Paraíba.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 29 de outubro de 2025.
 
     
  