Alexandre Nunes
Sair de casa e subir a ladeira íngreme da rua onde mora, no bairro do Açude, em Santa Rita, com a tuba às costas, um instrumento musical nada convencional, grande e bastante pesado, não é considerado nenhum sacrifício para Daniel Victor dos Santos Rodrigues, 15 anos. É que ele vai para o estudo musical do Programa de Inclusão através da Música e das Artes (Prima), no Polo Tibiri, implantado no Alto das Populares, no ano de 2013.
Daniel Victor considera essa rotina diária um prazer e por isso não sente o peso da tuba como se fosse uma cruz pesada às costas, nem subir a ladeira como uma dificuldade, mas um caminho para um futuro melhor, tanto para ele, como para sua família composta pelo pai - que trabalha com serviços gerais de manutenção, como pintura e reforma de casas -, pela mãe e uma irmã de 19 anos.
"Tem alguns vizinhos que ainda olham meio atravessados para mim e dizem: esse menino é doido, andando para cima e para baixo com um peso desses. No entanto, eu vejo tudo como uma questão de futuro. Para construir meu futuro, não posso medir esforços. Tenho que lutar pelo que eu quero e pelo meu sonho. Com a música, espero conquistar uma oportunidade numa orquestra muito reconhecida e ser um músico, não qualquer músico, mas um músico humilde e que sirva como referência para outras crianças", ressalta.
Atuação na regência
Ele considera o Prima como uma oportunidade para ser alguém na vida, ter uma profissão definida e se colocar numa posição social que antes não podia nem sonhar. "Esse projeto abre portas e chega a mudar vidas, como está mudando a minha. Através do Polo Tibiri, que abriu portas e me ensinou, consegui uma vaga na Universidade Federal da Paraíba, onde estou fazendo um curso de extensão. Então, já estou começando a encaminhar meu futuro, e também já atuo como regente da orquestra do Polo Tibiri. Tem alunos do Prima que já fazem parte da Orquestra Jovem da Paraíba. Eles estão começando a viver um sonho que antes não podiam realizar, porque não tinham condições, nem a oportunidade que o Prima proporciona", reconhece.
Daniel explica que, no caso dele e de outros colegas do Prima, os pais não teriam condições de comprar um instrumento, nem de bancar os estudos musicais e que, por isso, não tem palavras para descrever o projeto, só agradecer. "Outra coisa importante que quero registrar é que com o Prima aprendi o que é disciplina, principalmente em questão de horário para o estudo diário da teoria musical e da prática com o instrumento. Isso nos melhora muito, em todos os aspectos da vida. Quando você descobre isso, fica encantado e não consegue mais parar. O seu olhar para o mundo é outro. Você consegue ver a beleza. Coisa que antes você não via", analisa o menino, que impressiona pelo raciocínio ágil e pela fácil argumentação, em contraste com a pouca idade que tem.
Do trombone à tuba
Daniel começou tocando trombone, de certa forma já um instrumento médio, depois passou para a tuba, maior ainda. "Escolhi a tuba porque é algo diferente. Costumo pensar que não é a gente quem escolhe a tuba, é a tuba que escolhe a gente, porque muita gente olha e despreza a tuba, por ser um instrumento grande e pesado, mas quando você realmente descobre a beleza da tuba, você se encanta e não quer parar mais. É o instrumento que preenche o vazio. Sem a tuba fica o vazio, a música fica sem o peso, sem nada", argumenta ele.
Os pais de Daniel Victor nunca questionaram a opção do filho pela música, mesmo no começo. Eles sempre apoiaram a escolha do menino. "Meus pais estão sempre lá nos concertos do Prima, participando, prestigiando. Às vezes falam que é muita loucura por causa do instrumento que eu toco, pelo tamanho dele. Mas, fora isso, são tranquilos", garante Daniel, o que é confirmado por Zindemberg do Nascimento Rodrigues, 41 anos, pai do garoto.
Zindemberg reconhece que o Prima veio para dar oportunidade de uma vida melhor para os jovens. "Muitos jovens estão na rua, hoje, porque não têm oportunidades como essas. Quando a gente liga para Daniel e ele diz que está no Prima, aprendendo, tocando, a gente diz que está tudo bem. Daniel tem o meu reconhecimento. Eu sempre dei muito apoio a ele, desde o início. Eu sempre apoiei ele em tudo. A minha esposa também sempre apoiou. Ela nunca disse não. Ela sempre quis o melhor para ele", reitera.
Zindemberg comenta que os vizinhos admiram o talento e a luta de Daniel, mesmo sendo ainda tão jovem. "Os vizinhos só dizem que já vai ali um grande guerreiro, que está lutando por uma coisa que ele quer. Então, é isso que a gente quer, que ele venha a conquistar o que deseja. É uma luta grande para educar meus filhos, mas o meu orgulho é que o meu filho hoje já está bem encaminhado na vida. Tenho orgulho de ter um filho assim e ver ele crescendo. Ele tocava um instrumento pequeno e hoje está num grande, fazendo o trabalho dele, de viajar e mostrar o talento dele, e as portas vão continuar sempre se abrindo para quem tem talento", conclui.
Resultado humano e de empoderamento
Para a diretora geral do Projeto de Inclusão Social através da Música e das Artes (Prima), a maestrina Priscila Santana, o que mais a surpreende no programa é esse resultado humano e de empoderamento, como bem exemplifica a história de Daniel Victor. "O Prima trabalha muito forte com essa formação do cidadão através da música. A gente quer que os alunos tenham consciência do poder deles, da cidadania deles, e usem isso de uma forma correta e coerente, em que seja bom para eles e bom para a comunidade deles, porque aí a gente ajuda a mudar o mundo", acrescenta.
Priscila Santana explica que quando fala em mudar o mundo, quer dizer a pessoa mudar a si própria e, consequentemente, mudar a comunidade, mudar a sua família. "A partir do momento que os alunos mudam, eles servem de referência para a comunidade e ajudam a mudá-la para melhor. Esse é o objetivo do Prima, um programa implantado pelo Governo do Estado, que quer ajudar a transformar o presente e o futuro dos jovens, descobrindo muito mais que o talento musical, ao revelar o cidadão".
Programa tem impacto também sobre as famílias dos estudantes
Aos 16 anos, Elen Firmino, hoje com 19, se matriculou no Projeto de Inclusão Social através da Música e das Artes para estudar flauta transversal e isso mudou não só a sua vida para melhor, como também a de sua família. É que a mãe de Elen, Veridinalva Firmino, de 51 anos, que sempre ia às reuniões do Polo do Bairro dos Novais, além de viajar com os alunos do Prima, acompanhando a filha, assumiu a condição de voluntária e, de tão ativa que era, ajudando em tudo, acabou sendo contratada pelo projeto, para a assumir o cargo de inspetora. "Sempre achei o projeto muito interessante e ter sido contratada é muito gratificante, não só pela questão financeira, mas por estar envolvida com algo tão grandioso e transformador", comenta.
A diretora geral do Prima, Priscila Santana, explica que, quando o projeto proporciona oportunidades aos jovens, isso se reverbera na família, não fica só no aluno. "Aquela mãe jamais sonhou isso, ou pensou em ter o tipo de sonho que a filha dela tem e que acredita que vai conseguir. Nessas funções de inspetora, a gente sempre procura pessoas da comunidade, porque isso facilita nosso contato com a escola, já que elas conhecem quem são as diretoras, quais são as escolas e as áreas em que a gente pode entrar. E essa mãe sempre frequentou o polo, como uma gama de mães que são superativas, presentes, e que nos apoiam. Quando a gente abriu uma vaga de inspetora, a primeira pessoa que se pensou foi nela, de tão ativa que é", comenta.
Veridinalva Firmino revela que o Prima fez toda a diferença na vida da sua filha. Só não pensou que ia fazer na sua vida também e na do seu esposo, Edmilson Efigênio, que passou a ter uma contribuição financeira para a manutenção da família e a prestar atenção na beleza das músicas tocadas por Elen, que hoje alegra sua casa. "Elen estudava no Ensino Médio, até que conheceu o Prima na escola. Ela chegava em casa e falava que iria estudar flauta e que iria chegar mais tarde em casa, mas assim como muitas mães de alunos do Prima, eu não tinha muita noção do que era o projeto", reconhece.
Quando Elen recebeu o instrumento é que Veridinalva percebeu o processo de mudança para melhor, na sua filha, com relação aos estudos, graças à disciplina proporcionada pelo Prima e pela música em si, que requer rigor no cumprimento dos horários de estudo. "Minha filha passava muitas horas estudando em casa, sem mostrar qualquer desânimo. Então, fui me interessando por isso, até que comecei a ir às reuniões de pais e alunos. Foi aí que conheci o projeto e a minha vida mudou, principalmente depois que eu comecei a trabalhar no Prima", relata.
Com esse envolvimento direto com o projeto, Veridinalva percebeu que o objetivo não é que o aluno seja só um musicista, mas que seja um cidadão de bem. "É isso que a gente precisa para uma comunidade pobre como essa aonde a gente mora, aqui em Cruz das Armas, onde existe muita violência. Cada aluno que entrar no projeto vai estar livre de envolvimento com tudo isso, porque a cada dia que ele for se dedicando ao instrumento musical, vai estar se afastando da possibilidade de aprender a usar instrumentos que fazem mal às pessoas. Aquele menino vai crescer, através do instrumento musical e por meio de um aprendizado que ele pode conseguir pelo empenho dele mesmo, com a ajuda de dedicados professores. Esse projeto é maravilhoso", ressalta.
Na opinião de Elen Firmino de Santana, filha de Veridinalva, o projeto proporcionou uma oportunidade única para ela encontrar um caminho profissional seguro. "Foi no Prima onde pude descobrir o que eu queria para minha vida, ou seja, ser musicista. Quando comecei a estudar música, estava no segundo ano do Ensino Médio e isso me fez desenvolver muito mais nas matérias da escola, como também na música. Ajudou-me em várias coisas. Hoje toco flauta transversal e pretendo fazer faculdade e dar sequência aos estudos musicais", prevê.
Elen Firmino já se inscreveu na graduação de música, na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e fará a prova em abril, na qual 40% se refere às notas do Enem e 60% à prova pratica com o instrumento musical. "São muitas as emoções que sinto quando estou com o meu instrumento musical. Se eu estiver estressada, vou tocar, se eu tiver nervosa, vou tocar, e se eu quiser relaxar, vou tocar, e se eu tiver feliz, também vou tocar. O instrumento, no meu caso, a flauta transversal, é um amigo fiel, o meu melhor amigo. Está sempre comigo, quase um membro do corpo (risos). Com a música, espero tocar numa grande orquestra do mundo", aspira.
O pai de Elen, Edmilson Efigênio de Santana, de 55 anos, funileiro e que também trabalha com serralharia, diz que o Prima é um projeto Ímpar na Paraíba. "É uma coisa que o governador fez e que está dando certo. Um projeto maravilhoso e que oferece a possibilidade da minha filha conseguir um emprego na área e sobreviver da música. Ela está pensando em fazer música na UFPB e isso já está sendo encaminhado", comemora.
Edmilson relata que não tinha muita aproximação com a música, mas desde que a filha entrou no Prima e passou a estudar e a praticar com o instrumento em casa, passou a conviver com a música de uma maneira bem melhor. "Quando chego em casa e vejo minha filha tocando, é uma festa. A gente se sente bem e a felicidade chega mais rápido ao nosso lado. Até os vizinhos já se acostumaram tanto com os ensaios de minha filha, que quando não escutam ela tocar ficam preocupados. Outro dia, o vizinho do lado esquerdo de minha casa perguntou se Elen estava doente, porque fazia uns dois dias que ele não ouvia o toque da flauta", observa.
Sonho traz jovem do Sertão para mais estudos em João Pessoa
Nem a saudade dos pais, nem a tenra idade, serviram de empecilho para que Izabella Raiane Ferreira de Souza, de 17 anos, lutasse pelo sonho de se tornar musicista, deixando Cajazeiras, no Sertão, para vir morar sozinha em João Pessoa, a fim de dar continuidade a estudos mais avançados de música. Ela é uma dos quase 5 mil alunos que já passaram, desde a implantação do Prima, pelos cursos de formação musical oferecidos no projeto. Ela atribui o incentivo do Prima aos estudos, a sua aprovação em sete processos seletivos para ingresso em cursos de graduação ou técnicos em instituições públicas de Ensino Superior, como a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), UFPB e instituto Federal da Paraíba (IFPB), em cursos como História, Direito, Serviço Social, Técnico em Saúde Bucal, Técnico em Instrumento Musical, entre outros.
Izabella toca teclado, violão e sanfona desde criança. "Comecei aos 10 anos tocando na igreja. Quando conheci o Prima, consegui me aprimorar na área teórica da música, porque até então só conhecia a prática do instrumento. Foi no Prima que conheci o violino. Com isso, fui aprendendo aos pouquinhos e, em quatro meses, participei do primeiro concerto do Prima, em Patos, quando fiz parte do quarteto de cordas. Depois disso, foram surgindo as oportunidades no projeto, com os professores sempre me incentivando a estudar e ajudando muito. Aconteceu que, com esse incentivo todo, eu tive sete aprovações escolares, entre cursos técnicos e vestibulares", ressalta.
Ela revela que chegou a cursar a graduação em Serviço Social, em Cajazeiras, só que o curso não satisfazia as suas aspirações. "Eu queria música e tinha sido chamada também para o Curso Técnico em Instrumento Musical, no IFPB. Joguei tudo para cima e decidi correr atrás do sonho. Mesmo sendo de menor idade, deixei meus pais em Cajazeiras e vim morar sozinha em João Pessoa, para estudar música. Estive recentemente na UFPB, onde já estou matriculada para fazer extensão em acordeão. As portas se abriram porque o Prima me deu a oportunidade de ser reconhecida pelo trabalho musical", confessa.
A música é a paixão de Izabella Raiane. Ela afirma que sem a música não conseguiria viver. "Quando dá saudade dos meus pais e da minha terra, o que compensa é pegar o instrumento e sentir que eu estou fazendo aquilo que é o meu sonho, o que realmente quero, não pela questão financeira, ou pela ideia dos outros, mas pelo que eu escolhi, pelo que eu vejo que dá prazer, que é fazer a música e ver a música tocando outras vidas. Porque eu creio que a música transforma, e ela transformou muito a minha vida e acredito que, através de mim, ela vai transformar a vida de muitas pessoas também", garante.
Izabella continua frequentando o projeto, porque reconhece que foi o programa que criou uma base musical na sua vida. "Quero sempre estar perto, mesmo fazendo outros cursos. Só que não frequento sempre, como lá em Cajazeiras, porque tenho as ocupações do curso técnico e os horários atrapalham. Mas sempre mantenho contato com os professores e coordenadores. Quando tem alguma apresentação, eles me chamam", revela.
Ela quer que fique bem claro que deve as aprovações em vestibulares ao seu esforço pessoal e ao incentivo recebido dos professores e coordenadores do Prima. "Eles sempre me incentivam a estudar, tanto na parte do instrumento, como na parte de didática, ou seja, no estudo de Português, Matemática e outras disciplinas da escola regular. Então, isso influenciou muito. Até o maestro Alex Klein mandava a gente estudar, pois dizia que o estudo nos leva longe e a níveis inimagináveis. Só tenho a agradecer ao Prima por tudo o que sou hoje. Quando a pessoa tem um sonho, nem se preocupa com as dificuldades, com o lado financeiro. Se quer seguir um sonho, então corra atrás", aconselha.
Disciplina no estudo amplia horizontes de alunos do Prima
Quando descobriu que se interessava por música, na banda marcial da escola, Gabriel Cleidson Sobrinho da Silva, de 19 anos, de Cabedelo, não imaginava que, caso fosse em frente, isso iria mudar a sua vida para melhor. “Eu tive interesse de tocar, me inscrevi e gostei, mas o melhor aconteceu quando o maestro do Polo do Prima, em Cabedelo, me viu tocando na banda marcial da escola e me convidou para estudar no programa. Ele disse que lá era legal, que eu aprenderia teoria musical e poderia entrar na orquestra. Comecei estudando iniciação musical e gostei”, relata.
Gabriel começou no Prima com 16 anos de idade. Antes, ele tocava percussão na banda marcial e, a partir do projeto, decidiu tocar trompete. “O Prima mudou muita coisa na minha vida. No programa, passei a ter a perspectiva de ser músico profissional e de tocar em orquestras. Isso resultou na vontade de aprender mais e hoje estou no IFPB, no curso de Instrumento Musical, subsequente ao que estudei no Prima. Já é um nível a mais, um complemento do que eu já tinha, no mesmo instrumento, o trompete. Agora é continuar subindo e fazer a prova para entrar numa orquestra e tocar profissionalmente. Como este ano estou muito atarefado com os estudos, deixei para me inscrever no próximo ano, para tentar uma vaga na Orquestra Sinfônica Jovem”, acrescenta.
Ele já participou de diversos concertos promovidos pelo Prima. “Sempre tem concerto, no começo e final do ano, com uma grande orquestra do Prima, e precisa de audição para participar. Sempre faço a audição e toco na orquestra do Prima. É uma ótima experiência, tocar com o pessoal que vem dos onze polos do Prima, na Paraíba, de Cajazeiras a Cabedelo”, explica.
Com relação à família, Gabriel esclarece que, no começo, houve uma certa resistência, pois para muitas pessoas a música não dá futuro. “De começo foi assim, mas depois meus pais foram vendo que estava dando certo, que estava havendo uma melhora em mim próprio, como um todo, principalmente na questão de comportamento, porque eu era muito bagunceiro. Com o Prima fui aprendendo a ser menos bagunceiro, a ser mais focado, e isso agradou a eles. Agora, meus pais apoiam, antes eles não apoiavam. Eles passaram a acreditar que a música pode dar um futuro melhor”, constata.
Já Israel Marcelino da Silva, de 18 anos, do Alto do Mateus, em João Pessoa, começou a se interessar pela música por conta da curiosidade, quando, aos 13 anos, viu o pessoal tocando na igreja e teve vontade de aprender violão. “Fui estudando sozinho mesmo, até o dia em que conheci o projeto Prima, já aos 16 anos, e foi quando vim a conhecer o mundo da música clássica. Me interessei e comecei a estudar um instrumento chamado viola clássica. Fiquei um tempo estudando, fiz a prova e passei para um estudo mais avançado do instrumento, no IFPB, porém sem deixar o Prima. Continuo no Prima e no IFPB”, prossegue.
Ele explica como a família vê a sua dedicação à música. “No começo a família vê a música como algo de pouco futuro, mas, com o tempo, quando vê a dedicação da pessoa, tudo muda. Com certeza, o relacionamento com os meus pais mudou, a partir do disciplinamento que o estudo da música me impôs. A música, por si só, apenas valoriza quem se dedica muito. A gente tem que se esforçar e se dedicar muito, para ser bem-sucedido com a música, e a consequência desse esforço aparece na dedicação à escola, em casa, em várias outras coisas”, argumenta.
Israel Marcelino estuda no Polo do Prima no Alto do Mateus, que tem sede no Colégio Horácio de Almeida. “Desde 2014 que participo de todos os concertos do Prima. Já toquei em Campina Grande e Patos. A minha perspectiva é estudar, e, quem sabe um dia, entrar numa Orquestra Sinfônica aqui da Paraíba. Com certeza isso está nos meus planos. Estou correndo atrás para que isso se concretize”, conclui.
Música como mola propulsora da educação
No Prima, os alunos, além de aprender a tocar um instrumento musical, aprendem a ter consciência de que podem ser o que queiram ser, e isso é empoderamento e exercício da cidadania. Segundo explica a maestrina e educadora musical Priscila Santana, diretora-geral do Programa de Inclusão através da Música e das Artes, a transformação é interna, de comportamento. "É preciso ouvir o outro, estar afinado com o outro, de uma forma que se repercuta na cidadania. É isso que a nossa juventude precisa, é esse tipo de incentivo, de espelho e de empoderamento que a gente também precisa nas comunidades", afirma.
Priscila Santana explica que, ao priorizar a formação do cidadão, o trabalho educativo no Prima é mais coletivo, através da orquestra, do que individual, justamente porque um elemento importante do coletivo é a comparação, que é uma das melhores formas de educação, além da disciplina. "No coletivo você não está sozinho, você se motiva, você tem aquela competição saudável de estar vendo o outro bem, em termos de eficiência, e de querer estar igual a ele. E com isso, vão se ajudando mutuamente. Quando você está sozinho, fica sem parâmetro. Quando os alunos estão em conjunto, eles têm esse parâmetro e vão ajudando uns aos outros. É esse espírito que a gente quer neles", complementa.
A musicista acrescenta que se um aluno está mais fraco que outro, o mais forte ajuda o outro para chegar até onde ele está. "Eles marcam para estudar juntos, eles saem do polo mais tarde justamente para se ajudarem. É nesse ponto que a gente entende que está a diferença, porque, na vida, você vai precisar sempre trabalhar junto, porque quem não sabe trabalhar em equipe, não vai conseguir sobreviver, já que hoje se você não trabalha em equipe, vai ser demitido em todo lugar que for", alerta.
Outros elementos importantes na formação do músico e do cidadão são a sensibilidade e a criatividade. "É um trabalho cotidiano em que você tem que escutar, tem que usar o seu intelecto, a sua imaginação. para fazer a coisa acontecer. A gente usa muito a imaginação para a música acontecer. A música instrumental é baseada nisso, nesse imaginário, nesse intelecto, nessa procura do belo. Mas, com certeza absoluta, vejo que o melhor para esses alunos é a mudança interna, que é duradoura, é fixa. Ela fica para a vida toda. Então, aquele pequeno momento que o aluno passou no Polo do Prima, que se transformou, que ajudou a outros alunos, aquilo muda a pessoa, nesse contato diário", ressalta.
O Programa de Inclusão através da Música e das Artes foi implantado pelo Governo do Estado da Paraíba, em 2012, por meio da Secretaria de Estado da Cultura, com a missão de criar orquestras em comunidades de vulnerabilidade social. O trabalho começou com o maestro Alex Klein, idealizador do projeto, e continua atualmente sob a direção geral da maestrina Priscila Santana. O Prima já atendeu cerca de cinco mil alunos. O trabalho executado pelo projeto envolve uma equipe em torno de 100 pessoas, entre professores, coordenadores, inspetores, motoristas e administração, para cuidar de 1.100 alunos que atualmente são assistidos pelo programa.