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Diagnóstico precoce de problemas auditivos auxilia no desenvolvimento da linguagem

publicado: 06/08/2017 00h05, última modificação: 05/08/2017 11h18
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Após o diagnóstico de surdez, Maria Elizabeth levou o filho Thiago para a Funad, onde realiza a fonoterapia - Foto: Ortilo Antônio

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Adrizzia Silva
- Especial para A União

Thiago Maurício tem cinco anos e há duas semanas realiza a fonoterapia, com o objetivo de estimular a fala e audição. O pequeno não foi submetido ao teste da orelhinha, exame que avalia a audição e detecta precocemente algum grau de surdez no bebê, logo nos primeiros dias de vida. Maria Elizabete, mãe de Thiago, nem imaginava que os balbucios que ele pronunciava até os três anos eram decorrentes da perda profunda da audição, principalmente da direita.

“Ele falava ‘papa e mama’ vez por outra. Então eu acreditava que era porque ele era muito pequeno e que com o tempo passaria a falar normalmente. Mas a gente começou a notar também que ele não demonstrava ouvir quando falávamos com ele, e não tinha reação a outros sons. Então quando ele já estava com três anos, foi que eu entendi que devia procurar o médico”, conta a mãe.

A fonoaudióloga Keila Maruze lembra que quanto mais cedo forem diagnosticados os problemas auditivos, melhor serão os prognósticosA fonoaudióloga da Fundação Centro Integrado de Apoio à Pessoa com Deficiência (Funad) em João Pessoa, Keila Maruze, explica que é importante observar o desenvolvimento da linguagem do bebê desde os cinco meses quando aparecem os balbucios, pois é através da audição que o indivíduo aprende a se comunicar com o mundo.

“A audição começa se desenvolver a partir do quinto mês de gestação e é um dos sentidos mais importantes para a aquisição de habilidades para a vida toda. Qualquer problema auditivo detectado e tratado precocemente favorece o desenvolvimento do bebê, sendo possível um progresso muito próximo ao de uma criança ouvinte”, afirma a especialista.

Elizângela Moreira Soares também é fonoaudióloga da Funad e acompanha Thiago no processo de reabilitação. Ele recebeu as próteses retroauricular (atrás da orelha) em maio, e desde então precisa compreender e estimular a fala para desenvolver a audição.

“O Thiago é bem agitado e temos que aguçar a concentração dele para posteriormente estimular a leitura labial. Ele ainda não percebe os sons, mas com as terapias passará a reconhecer a fala, que é escutar e entender o que o outro pronuncia, até repetir o que a gente tá falando”, conta a fonoaudióloga.

Elizângela ainda ressalta que o resultado dependerá também do estímulo recebido em casa e na escola. “O grau da perda e o comprometimento da família é que vai dizer como vai ser no futuro”. Nesse processo, Maria Elizabete garante que o pequeno Thiago recebe todo o apoio necessário.

“Tudo o que a fonoaudióloga ensina aqui, temos que repetir em casa. Atualmente, sem o aparelho, ele não escuta nada e tem bastante dificuldade na escola. Mas em duas semanas de terapia já percebo ele falar as palavras ‘mamãe e papai’ completas. Tenho certeza que logo meu filho terá uma vida normal e saudável”, afirma Maria Elizabete.

No caso de Thiago, o problema ocorreu por questões hereditárias, pois tanto um primo da mãe dele, quanto outro do pai, possuem o mesmo problema. Entretanto, qualquer seja a causa, o diagnóstico precoce é fundamental para o processo de reabilitação e consequentemente uma maior qualidade de vida.

“Ele foi diagnosticado um pouco tardiamente. Crianças que saem da maternidade com o teste da orelhinha já realizado têm o diagnóstico cedo e caso se detecte algum problema logo são estimuladas. Então, quando chegam nessa fase do Thiago, na idade que ele está, o desenvolvimento é bem maior. Inclusive na escola a criança não vai apresentar tantas dificuldades”, esclarece.

Causas das deficiências

Desde dois de agosto de 2010, o teste da orelhinha se tornou obrigatório no Brasil e deve ser realizado gratuitamente. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), há uma alta ocorrência de perda auditiva bilateral severa: um a cada mil recém-nascidos. Mas se considerar perdas auditivas moderadas, esse número aumenta significativamente para 5% dos bebês nascidos vivos.

Na Paraíba, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), censo 2013, a cada mil pessoas, 41 apresentam alguma deficiência auditiva (1,1%). Destas, 11 nasceram com a deficiência (0,3%) e 30 (0,8%) adquiriram por doença ou acidente. Ainda de acordo com o censo, sete pessoas (17,5%) apresentam grau intenso ou muito intenso de limitações ou não conseguem realizar as atividades habituais; e 19 (46,1%) com pouca ou nenhuma limitação.

A OMS define como audição normal a de pessoas que conseguem escutar sons de até 25 decibéis nos dois ouvidos. Quem ouve menos do que esse limiar temalgum tipo de perda auditiva, que é classificada como leve, moderada, moderada severa, severa e profunda.

As causas das deficiências são divididas em duas categorias. As causas congênitas são doenças como rubéola congênita, sífilis e outras infecções durante a gravidez; nascimento abaixo do peso ideal (1500g); falta de oxigênio na hora do parto; hereditariedade; uso inapropriado de medicamentos ao longo da gestação; e icterícia neonatal, um problema de saúde que pode danificar o nervo auditivo em recém-nascidos.

A outra são as causas adquiridas, como meningite bacteriana ou virótica (maior causa de surdez no Brasil), sarampo, caxumba, infecções crônicas no ouvido, otite média, lesões na cabeça ou no ouvido; trauma de cabeça associada à perda de consciência ou fratura craniana; uso de alguns remédios, como os utilizados no tratamento de infecções neonatais, malária, câncer e tuberculoses agressivas; ou síndromes.

Teste da orelhinha deve ser feito na maternidade

O teste da orelhinha é realizado para detectar problemas de audição em recém-nascidosO teste da orelhinha é feito inicialmente através do exame de Emissões Otoacústicas Evocadas, e consiste em um teste bem rápido e simples. “É realizado para detectar problemas de audição no bebê. É rápido, indolor, não fura a orelha do neném e deve ser realizado após as primeiras 24 horas de vida da criança, na própria maternidade. Quanto mais cedo forem diagnosticados problemas auditivos e mais rápida for a intervenção, melhor será o prognóstico”, afirma Keila Maruze.

Alguns hospitais da rede pública estadual, como a Maternidade Frei Damião e o Hospital Universitário (HU) realizam antes da alta (no segundo ou terceiro dia de vida) ou agendam um retorno para a primeira semana. É um exame realizado normalmente por profissionais fonoaudiólogos ou médico otorrinolaringologista. E se o resultado não for satisfatório, o bebê é reagendado para um reteste e uma avaliação audiológica completa.

Na fase adolescente e adulta, o uso contínuo de fones de ouvido e trabalho em ambiente de alto nível de pressão sonora são algumas causas de problemas auditivos. “Local ruidoso sem uso de equipamento adequado de proteção, as infecções de ouvido frequentes, o envelhecimento e o acúmulo de cera, ou outras partículas estranhas, também são causas adquiridas. Além da permanência prolongada em locais com sons elevados, como em shows”, afirma Keila.

Em uma sociedade na qual TV, rádio, aparelhos de som, jogos de videogame e fones ligados aos celulares fazem parte do dia a dia, as ameaças aos ouvidos estão em toda a parte. O nível de ruído em uma casa tem grande impacto na audição. “É bom lembrar que o barulho do secador de cabelos, do liquidificador e do aspirador de pó pode ultrapassar 90 decibéis”, disse a fonoaudióloga.

No caso do uso de fone de ouvido, principalmente por jovens, o ideal é saber controlar o volume do aparelho, conforme explicou o otorrinolaringologista. “O fundamental é que a pessoa ao lado não consiga ouvir o que o outro esteja ouvindo por meio do fone de ouvido. Caso ouça, é um alerta de que o som está além do ideal e pode lesionar a audição. Além disso, é preferível utilizar os fones externos aos que são introduzidos no ouvido”, ressaltou.

O cuidado também deve ser redobrado em lugares públicos, evitando ficar próximo a caixa de sons em shows e quermesses, e controlar em casa o volume da televisão e rádio, e o tempo de uso do aparelho eletrônico. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), sons acima de 85 decibéis já são considerados prejudiciais à saúde auditiva se o tempo de exposição ao barulho for prolongado. A perda auditiva deve sempre ser diagnosticada por um profissional, como um fonoaudiólogo ou um otorrinolaringologista, que irá testar a audição para determinar o tipo e grau da perda. Esses resultados serão ilustrados no audiograma.

O aparelho retroauricular, que é utilizado para casos severos, fica atrás da orelhaSinais de perda de audição são interpretados como desatenção

Pais e professores devem ficar atentos ao desenvolvimento da linguagem e comunicação das crianças, bem como ao processo de aprendizagem. “Algumas crianças com perdas auditivas leves ou moderadas são tidas como desatentas ou distraídas, com dificuldade na socialização e em entender o que lhe é dito quando inseridas em um ambiente ruidoso. Muitos problemas de aquisição de linguagem oral ou simplesmente trocas fonêmicas podem estar vinculados a déficits auditivos”, esclarece a fonoaudióloga Keila Maruze.

As perdas auditivas são detectadas através de exames audiológicos, como audiometria tonal, logoaudiometria, imitanciometria, BERA e Emissões otoacústicas. A Funad realiza a triagem auditiva em escolares, com crianças na faixa etária de quatro a 12 anos. A Fundação articula com a direção de cada escola e disponibiliza o ônibus para pegar os alunos em datas pré-agendadas.

“Se a criança não tiver resultados satisfatórios na triagem auditiva, é encaminhada ao otorrino para ser investigado se possui alguma deficiência. Todo o processo é realizado na Coordenadoria de Atendimento ao Portador de Deficiência Auditiva (Codapa) /Funad”, declara. Os principais sintomas de quem possui alguma deficiência auditiva são dificuldade para escutar em lugares em que as fontes de som estão distantes, para ouvir televisão e/ou telefone, para entender a conversação em um grupo de pessoas e dores de ouvido constantes. Também é comum ouvir zumbidos e sentir tonturas ou dores de cabeça.

De acordo com Keila, as pessoas afetadas por uma perda auditiva comumente desenvolvem formas para tentar ouvir melhor em situações difíceis, como pedir aos outros para repetir o que falaram, aumentar constantemente o volume da TV e rádio, evitar reuniões sociais e até mesmo fingir entender a mensagem recebida.

Ela ainda explica que há três tipos de deficiência auditiva conhecidas: condutiva, sensorioneural e mista. A mais comum é a sensorioneural, tanto adquirida, quanto as congênitas. O primeiro passo ao suspeitar de perda auditiva é consultar o médico otorrinolaringologista, onde serão solicitados os testes necessários para a avaliação da audição. “O resultado dos testes determinará o tipo de perda e a sua severidade, além de determinar a conduta do médico para a indicação ou não da prótese auditiva”, afirma.

Funad disponibiliza próteses auditivas

A prótese auditiva é um amplificador que tem a função de possibilitar a maior compreensão possível da fala, bem como tornar audível sons ambientais, sinais de perigo, sinais de alerta, sons lúdicos, tornando-se facilitador para o desenvolvimento global do deficiente auditivo.

A fonoaudióloga esclarece que o uso do aparelho não é apenas para quem tem perda total da audição, e cada caso é avaliado individualmente. “Se tiver resíduo auditivo, a prótese não vai resolver, mas vai ajudar muito na qualidade de vida. Se não tiver resíduo, existem outros recursos que podem ser procurados, dependendo da idade pode indicar um implante coclear, por isso o diagnóstico precoce é tão importante, pois há uma variedade de serviços para oferecer ao paciente”.

A indicação do implante coclear, ainda de acordo com a especialista, é quando ocorre perda profunda da audição, geralmente em crianças de até seis anos de idade e adultos que não nasceram surdos, mas que adquiriram a perda, por ele ainda possuir uma memória auditiva e uma linguagem. Mas cada caso ainda é analisado individualmente.

Atualmente a Funad atende cerca de 200 usuários por mês e entrega em média 100 próteses auditivas. E caso a triagem não tenha sido realizada na Funad, a pessoa deve procurar o médico otorrino da Fundação e solicitar os exames específicos, ou, no caso de quem já realizou o exame em outro local, apresentar ao médico, para a partir daí, constatar ou não a necessidade do aparelho e o solicitar.

Os aparelhos disponibilizados pela Funad são o microcanal (indicação leve), intracanal (leve e moderado) e intra-auricular (moderado e severo), que ficam dentro do conduto auditivo; e o minirretroauricular (leve e moderado) e retroauricular (severo e profundo) que ficam atrás da orelha. “A boa adaptação ao uso depende de uma série de fatores que começa no diagnóstico e indicação do aparelho adequado, adaptação após a protetização, manutenção e troca de baterias quando necessários e visita regular ao otorrinolaringologista”, disse a fonoaudióloga.

Os órgãos que também trabalham com pessoas com deficiência auditiva, em João Pessoa, são Associações de Surdos e Hospital Edson Ramalho (setor de otorrinolaringologia), unidade em que são realizadas as cirurgias para implantes auditivos e o sistema FM que, adaptado ao aparelho auditivo convencional, permite ao professor falar diretamente ao aluno com problemas auditivos. O primeiro atendimento pode ser feito por meio de encaminhamento das unidades de saúde ou de forma espontânea, indo direto no serviço.

No que concerne a Funad, é uma Fundação de referência no Estado da Paraíba, que realiza o diagnóstico da deficiência auditiva, serviços de habilitação e reabilitação, entrega de próteses, além dos diferentes serviços realizados pela Codapa, o Centro de Capacitação de Profissionais da Educação, CAS e pela Central de Interpretação de Libras.

Poluição sonora

A estudante Gleisiane Félix afirma ter dores de cabeça causadas pelos carrinhos de som em alto volume nas ruas Na capital, em pontos como o Centro, próximo à Lagoa e à Integração, a poluição sonora atinge índices elevados que podem causar danos à audição. O excesso de veículos nas ruas, sirenes de ambulâncias, o uso de buzina constante, ruídos comuns de ônibus e muitas pessoas falando ao mesmo tempo, agravam o barulho. Sem falar nos carros com alto-falante que vendem de tudo pelas ruas da cidade, inclusive os carrinhos de CDs e DVDs.

Dentre esses problemas o último foi o mais citado, por pessoas entrevistadas pelo jornal A União, que foi a esses pontos verificar o que mais incomoda a população, em questão de barulho. Apesar do uso de fones de ouvido ser um grande vilão para a audição, ele foi o menos apontado como problema. Uma das pessoas disse que trabalhar em fábrica prejudica mais a audição, outra afirmou que já apresenta alteração por ouvir música em volume alto.

Para os entrevistados, a falta de fiscalização dos órgãos responsáveis, próximo à integração, é o que mais prejudica, pois produz alvoroço e tumulto no local, principalmente por vendedores ambulantes e pessoas que oferecem o serviço de transporte alternativo para outros municípios. Segundo os relatos, esse excesso de barulho afeta a saúde física e psicológica, gerando estresse, irritabilidade e dores de cabeça.

"Precisar de ônibus todos os dias já é estressante, com todo o barulho. Mas esses carrinhos de som e essas pessoas gritando o tempo todo é muito mais chato. Vivo chegando em casa com dor de cabeça, por isso evito até outros sons. Eu ainda não tenho nenhum problema aparente de audição, mas conheço pessoas que têm justamente por causa desse tipo de barulho. Outros pelo uso excessivo de fones de ouvido. No meu caso, só uso de vez em quando", disse a estudante Gleisiane Felix (ao lado).

O atendente de farmácia Yvson Fernandes afirmou que a "pior poluição sonora" na localidade da Integração são os carrinhos de som. De acordo com ele, o barulho dos ônibus, somado ao dos carrinhos, faz com que o ambiente se torne uma completa "desorganização". "Essas pessoas gritando, oferecendo alternativos para os passageiros, os vendedores ambulantes, tudo isso ao mesmo tempo, é extremamente prejudicial e aborrece muito", lamentou.

A lojista Isabel Gomes, que trabalha próximo ao local, afirmou que conviver com o barulho dos carrinhos de som já se tornou rotina. Segundo ela, os vendedores de CDs e DVDs não respeitam o limite máximo de volume e prejudicam a audição de todos que passam pelo local. "É sempre assim, muito alto, sabe? E isso atrapalha em tudo, tanto no trabalho, atendendo às pessoas, como na qualidade de vida, porque chego em casa estressada, com dor de cabeça, e não suporto ouvir mais nenhum barulho".