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Irreverência

Cafuçus vão esbanjar charme em João Pessoa

publicado: 09/02/2024 08h40, última modificação: 09/02/2024 08h40
Foliões que desafiam qualquer moda começarão a brincar a partir das 18h no Centro Histórico da capital
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Últimos detalhes da ornamentação foram colocados ontem à tarde no Ponto de Cem Réis, um dos três locais por onde o bloco passará - Foto: Roberto Guedes

por Joel Cavalcanti*

Alguns vão dizer que eles têm um estilo meio duvidoso, mas o verdadeiro folião do Bloco Cafuçu não tem dúvidas que misturando todas as suas melhores roupas e acessórios do fundo do guarda-roupa eles são os mais chiques do Carnaval de João Pessoa. E a ocasião merece. Hoje é dia de uma multidão se reunir para comemorar 35 anos de exagero e galhofa com o bloco que desafia a moda e as regras do bom gosto. A concentração para a festa está marcada para acontecer a partir das 18h, em três pontos do Centro Histórico da cidade.

Serão 15 orquestras de frevo para fazer o desfile que traz ainda uma programação musical voltada para homenagear o cancioneiro da cangaia brasileira. É como dizem: da pessoa traída que sintoniza a música pela ponta dos chifres. Para brincar o Carnaval rindo de todo mundo e de si mesmos, a programação conta ainda com três DJs que começam a tocar às 19h30. Em seguida, às 21h30, tem início as atrações nos três palcos do evento: Tracundum, com participação de Lukete, no Ponto de Cem Réis; Brega é Você, na Praça Rio Branco; e Ronaldo Rossi, na Praça do Bispo.

Ao atingir 35 anos de fundação, os cafuçus estão com muitas questões na cabeça que vão muito além da brilhantina no cabelo. Acostumados a fazerem paródias com os estilos das pessoas que eram populares nos programas de rádio e da TV no passado, ser brega está novamente na moda. “Mas, para mim, isso não traz nenhum dilema”, afirma um dos fundadores do bloco, o ator Buda Lira. “A gente tenta até acompanhar algumas coisas que já estão fazendo sucesso, mas isso também não nos guia totalmente. Porque o que a gente procura respeitar é o seguinte: fazer essa composição da tradição das músicas carnavalescas com essa introdução com músicas chamadas bregas”.

Início

Desde o seu início, o bloco assumiu essa característica destacada por Buda Lira, desfilando inicialmente com estandarte próprio nas Muriçocas do Miramar, em 1989. Mas foi quando se mudou para o Centro Histórico que o Cafuçu acentuou sua identidade própria. Na época, o desfile ia na contramão de muitas agremiações que criaram o Carnaval do Folia de Rua que se tem hoje na cidade, trocando a orla marítima pelos umbrais dos decadentes cabarés. Foi levando o pessoense para ocupar as ladeiras e praças da cidade antiga que o bloco fez mais sentido.

“A gente criou o bloco de forma espontânea, porque já existia inclusive esse termo ‘cafuçu’ no grupo das pessoas que fundaram o bloco. Na época, nem se falava na música quando a gente criou. A música veio depois, a introdução das músicas de um passado recente, e que as pessoas atribuíam esse nome de ‘brega’”, acrescenta Lira. Se as referências antes eram personalidades como Elke Maravilha, Gretchen e Xuxa, ou Reginaldo Rossi, Sidney Magal e Bartô Galeno, hoje elas estão renovadas.

Brega sai das periferias do Norte e Nordeste e volta às paradas de sucesso

O brega saiu mais um vez das periferias do Norte e do Nordeste do Brasil para invadir outros ritmos e voltar ao topo das paradas de sucesso no país inteiro. Do sertanejo ao funk, do piseiro ao eletrônico, do arrocha ao pop, o brega é abraçado por uma nova geração e isso não tem nada de “cringe”. “Percebo que há, em Pernambuco, por exemplo, um movimento muito grande nessa direção, com mistura de ritmo e tudo. Claro que só aumenta o interesse da gente por essas novidades que surgem ao longo do tempo”, diz o fundador do bloco.

E para quem torce o nariz para esse novo brega de Priscila Senna, Marília Mendonça, e Pabllo Vittar, o Cafuçu lembra que o ritmo brega nunca se importou com o julgamento alheio. Porque é no Cafuçu que a etiqueta geral do comportamento do povo brasileiro é revisada. Das socialites das colunas sociais de antigamente aos influencers das redes sociais de agora, com suas vidas aparentemente glamourosas, tudo vira zoação dos foliões.

“Quem naturalmente brinca é o próprio público. O Carnaval é um momento de crítica social, não é só a contemplação, não é só uma relação passiva de ver um artista. O Carnaval deve ser esse espaço da crítica, da autocrítica, até porque o bloco é aberto. O fato de a gente ter tido a oportunidade de surgir com o mote, com o tema, que é exatamente o cafuçu, abriu muito espaço para esse tipo de brincadeira”, defende Buda Lira.

Todos estilos musicais e conceitos sociais do que é brega coexistem juntos. E enquanto ainda tiver alguém querendo ser uma abelha para pousar em uma flor ou se assumir orgulhoso que é um pistorleiro do amor, a festa vai continuar acontecendo do jeito que ela se consolidou. E juntando todos os estilos de encarar o que é ser brega, o bloco Cafuçu está cada vez mais com a cara da massa.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 09 de fevereiro de 2024.