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Dia da consciência negra

Data exalta a força do povo negro

publicado: 20/11/2023 10h44, última modificação: 20/11/2023 10h44
Momento serve para pensar a trajetória, cultura, resgate e resiliência de toda comunidade africana

por Iluska Cavalcante*

O dia 20 de novembro, data que marca a morte de Zumbi dos Palmares, é comemorada no Brasil como um lembrete não apenas do regime de escravidão sofrido pelas pessoas negras no país, mas principalmente o resgate da cultura, da história e da resistência dos povos africanos.

A data traz à memória “um povo lutador que não se conformou em ser tratado de forma subalterna, que traz na pele a marca da resistência, da beleza, da ancestralidade e da riqueza dos povos originários africanos”, como definiu Leonardo Silva, da Marcha da Negritude Unificada da Paraíba.

Por outro lado, o dia 20 de novembro também lembra o que hoje é considerado crime inafiançável e imprescritível, mas que por muito tempo já foi ignorado e até mesmo tolerado no Brasil: o racismo. Segundo Leonardo Silva, o Brasil segue com um regime social racial.

O dia 20 de novembro traz à memória a trajetória e luta de uma gente que não se conformou em ser tratada de forma subalterna, que traz na pele a marca da ancestralidade de seus antepassados africanos

“A diferença é que hoje as práticas de racismo não são apoiadas pela ciência nem pelas leis vigentes.[...] Mas se formos procurar pessoas que estão em empregos precarizados, nos guetos, nas periferias, em situação de risco e vulnerabilidade social, nas prisões, sofrendo perseguição pelas forças policiais e vítimas de violência estatal, a maioria são pessoas negras pobres e subalternizadas pelo regime de classes em que vivemos”.

Mais da metade dos brasileiros reconhece que o país é racista, segundo o resultado da pesquisa Percepções sobre o racismo no Brasil, realizada pelo Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), sob encomenda do Instituto de Referência Negra Peregum e do Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista) e divulgado em julho deste ano.

Porém, no mesmo estudo, é constatado que 89% dos brasileiros não reconhecem ter atitudes racistas e apenas 10% afirmaram trabalhar em instituições racistas. “Dessa forma não é possível dizer que o brasileiro tem mais consciência, levando em consideração que tem muita gente que nem sabe que suas atitudes podem ser racistas por falta de letramento racial suficiente”, afirmou o ativista.

De acordo com a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Afrobrasileiros e Indígenas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Mojana Vargas, apesar das políticas públicas de promoção da igualdade serem adotadas desde 2003, a persistência do racismo no Brasil é evidente. “Isso fica bastante visível quando vemos as estatísticas que mostram a desigualdade entre negros e brancos no mercado de trabalho, nas condições de moradia, mas, sobretudo, nas estatísticas sobre violência, que demonstram que pretos e pardos são vitimizados em níveis muito superiores tanto pela violência policial quanto pela criminalidade, do que brancos”.

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A noção de igualdade deve tocar a todos. E todos têm a tarefa de promovê-la a partir de sua posição no contexto social - Mojana Vargas

Significado da data

Segundo a professora Mojana Vargas, o Dia da Consciência Negra é parte importante da preservação da memória da luta e da resistência negra à escravidão – simbolizada na figura de Zumbi dos Palmares – e à violência contínua do racismo e das desigualdades produzidas por ele ao longo do tempo.

Ela ressaltou, ainda, que a data foi escolhida pelas organizações do movimento negro para demarcar que o fim da escravidão no Brasil foi resultado da “luta dos negros e negras ao longo dos 380 anos de escravismo no Brasil e não da benevolência de uma princesa”.

A comemoração foi iniciada com a Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e pela Vida, ocorrida em Brasília no dia 20 de novembro de 1995. No entanto, a data só foi reconhecida oficialmente pelo estado brasileiro como memória da luta antirracista no Brasil com a Lei 12,519/2011, que instituiu o 20 de novembro como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

Preto e pardo são principais alvos da polícia

Um estudo recente sobre a população negra mostra que em mais de 4,2 mil casos de pessoas mortas pela polícia em 2022, mais de 2,7 mil eram negras (pretos ou pardos), ou seja, 65,7% do total. Se considerados apenas aqueles com cor/raça informada (3.171), a proporção de negros chega a 87,4%.

Os dados são do estudo Pele Alvo: a Bala não Erra o Negro, realizado pela Rede de Observatórios da Segurança, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), e divulgado na última quinta-feira (16), com base em estatísticas fornecidas pelas polícias do Rio de Janeiro, de São Paulo, da Bahia, de Pernambuco e do Ceará, Piauí, Maranhão e Pará, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI).

Outro indicativo apontado pela professora da UFPB diz respeito aos dados de mortos na pandemia de Covid, em que a mortalidade por Covid entre brancos ficou em torno de 38%, enquanto que entre pessoas negras ela chegava a 55%. As informações foram verificadas a partir de dois estudos realizados no primeiro ano de pandemia, através do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde, grupo da PUC-Rio e do Instituto Pólis.

Educação: uma arma contra o racismo

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É inadmissível que em um país com maioria numérica de pretos e pardos as pessoas que cometem prática de racismo ainda sigam impunes - Leonardo Silva

Uma das principais formas de combater o racismo é por meio da educação, na opinião de Marli Soares, coordenadora executiva da Marcha da Negritude. “Sabemos que tem muita coisa a fazer, principalmente as políticas públicas. Essa tem sido uma das nossas lutas. No dia a dia, estamos junto dos órgãos públicos, cobrando”.

A Lei 10.639/2003 coloca como obrigatório o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira na educação básica em todo território nacional. Este ano a lei completou 20 anos. No entanto, em um levantamento feito com mais de mil secretarias de educação de municípios brasileiros, 71% ainda não tem estruturado no ensino fundamental esse conteúdo.

Além disso, outra forma de combate é a consciência de que o racismo é crime e deve ser denunciado. “É inadmissível que em um país com maioria numérica de pessoas pretas e pardas as pessoas que cometem racismo sigam impunes”, enfatizou o ativista Leonardo Silva.

Já a professora Mojana Vargas ressaltou que essa deve ser uma luta de todos, assim como o machismo, a LGBTFobia, a intolerância religiosa e outras discriminações. A melhor forma de fazer isso, mesmo não fazendo parte do grupo oprimido, é ouvindo as suas pautas. “A noção de igualdade é algo que deve tocar a todos. E todos têm a tarefa de promovê-la a partir da sua posição no contexto social. A primeira coisa é posicionar-se frontalmente contra as discriminações e, em segundo lugar, é importante ouvir as pessoas que pertencem a cada grupo oprimido, entender suas pautas e estar aberto à construção da luta antirracista.”

Programação estadual será realizada amanhã

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O Novembro Negro traz como pauta a conscientização das consequências da escravização para a população negra. Além de conscientizar para o enfrentamento do racismo como um problema social e que deve ser combatido na coletividade - Jadiele Berto

O Governo do Estado da Paraíba, por meio da Secretaria de Estado da Mulher e Diversidade Humana (Semdh), vai lançar uma série de ações de promoção de Igualdade Racial em comemoração ao Dia da Consciência Negra. O evento, que faz parte da programação do Novembro Negro no Estado, ocorrerá amanhã (20), às 9h, no Auditório do IFPB, localizado na Av. João da Mata, 256, no bairro de Jaguaribe, em João Pessoa.

“O novembro negro traz como pauta a conscientização das consequências da escravização para a população negra. Além de conscientizar para o enfrentamento do racismo como um problema social e que deve ser combatido na coletividade”, disse a gerente de equidade racial da secretaria, Jadiele Berto.

Programação
A programação inclui o Festival de Cultura Quilombola, em parceria entre a Secult e a Semdh, que acontece no próximo sábado (25), em Catolé do Rocha, dando sequência aos Festivais Cigano e Indígena realizados neste ano; o Programa de Inclusão Através da Música e das Artes (Prima), em fase de implantação nas comunidades quilombolas do Sertão e nas aldeias da etnia indígena Potiguara da Paraíba; e a 37ª edição do Salão do Artesanato Paraibano, intitulada “Arte à Flor da Pele”, homenageará o “Artesanato dos Quilombos da Paraíba”. O evento está marcado para acontecer de 12 de janeiro a 4 de fevereiro de 2024, em João Pessoa.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 19 de novembro de 2023.