Familiares e amigos das crianças que denunciaram o médico Fernando Cunha Lima se reuniram, ontem, em frente ao Fórum Criminal, em João Pessoa, para pedir a prisão do pediatra, investigado por abuso sexual infantil. A manifestação ocorre depois de a Justiça negar o pedido de prisão preventiva do acusado.
No dia 26 do mês passado, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público e tornou o pediatra réu no processo. Entretanto, o juiz José Guedes Cavalcanti Neto negou a prisão preventiva do médico, por entender que as denúncias se caracterizam como indício de autoria, mas não como provas concretas.
"A diferença entre o primeiro caso, há mais de 30 anos, e o último, há um mês, mostra que ele é um predador sexual "
- Gabriella Cunha Lima
Para os manifestantes, a liberdade de Fernando Cunha Lima coloca todas as crianças em risco. “Esse caso não pode ser esquecido. Ele precisa ser preso o mais rápido possível, pois os abusos são cometidos dentro e fora do consultório. Uma criança que o encontra no elevador de um prédio, por exemplo, corre o risco de ser abusada. A diferença entre o primeiro caso, há mais de 30 anos, e o último, há menos de um mês, mostra que ele é um predador sexual e vai atacar sempre que houver chance”, alertou Gabriella Cunha Lima, sobrinha do pediatra e abusada por ele em 1991, quando tinha nove anos.
Já Conceição Pontes, familiar de uma das vítimas denunciantes, criticou a lentidão da Justiça, dificultando o trabalho da Polícia Civil. “A Polícia pediu busca e apreensão de equipamentos do médico e a Justiça negou. Por quê? A polícia poderia fazer um trabalho investigativo muito minucioso, mas foi impedida! Isso é revoltante! O consultório dele era cheio de fotos de crianças. Será que eram só pacientes ou eram vítimas desse pedófilo?”, questionou.
O advogado das vítimas, Bruno Girão, também participou da mobilização e reforçou a importância das denúncias para fortalecer o caso e tornar os crimes ainda mais evidentes. “Na semana passada, outras duas vítimas foram ouvidas. Nesta semana, são esperados os depoimentos de mais três. Quanto mais pessoas denunciarem, mais fácil será de provar a conduta criminosa do médico”, disse. Segundo ele, essas denúncias serão primordiais para compor o novo inquérito aberto pela Polícia Civil, que está em fase final.
Para o advogado de defesa do médico pediatra, Aécio Farias, a decisão da Justiça é baseada na lei e está juridicamente correta. “Eu defendo a decisão do magistrado, que viu na lei os motivos para não prendê-lo preventivamente. O Ministério Público recorreu da decisão, e nós vamos aguardar os desdobramentos, defendendo a lei, acima de tudo”, argumentou.
Entenda o caso
A primeira denúncia formal de estupro de vulnerável contra o pediatra Fernando Cunha Lima aconteceu no dia 25 de julho e foi tornada pública no dia 7 de agosto. A mãe da criança de nove anos, que estava no consultório, disse em depoimento que viu o momento em que ele teria tocado as partes íntimas da menor. Na ocasião, ela saiu do local com os dois filhos e, imediatamente, foi prestar queixa na Delegacia de Polícia Civil.
"Na semana passada, outras duas vítimas foram ouvidas. Nesta semana, são esperados os depoimentos de mais três"
- Bruno Girão
Com a repercussão do caso, novas vítimas se apresentaram espontaneamente à Delegacia de Repressão a Crimes contra a Infância e a Juventude para darem seus depoimentos. Até ontem, oito famílias haviam formalizado denúncias de abusos contra Fernando Cunha Lima — incluindo a primeira denunciante e a sobrinha dele, Gabriella.
De acordo com depoimentos prestados à Polícia Civil, diversas mães relataram que os abusos ocorriam dentro do consultório, com as crianças sobre a maca, enquanto o médico obstruía a visão delas ou realizava a ausculta pulmonar.
Suspensão
No último dia 16, o Conselho Regional de Medicina decidiu, por unanimidade, pela interdição cautelar de Fernando Cunha Lima. A interdição é, inicialmente, por 180 dias, podendo ser prorrogável por igual período. Durante esse período (de 180 ou de 360 dias), o CRM ouvirá as vítimas e o médico pediatra, para decidir pela punição definitiva ou pela absolvição do médico, no processo ético-profissional.
O médico já foi suspenso das suas atividades na Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), onde atuava como diretor.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 03 de setembro de 2024.