Nas últimas duas décadas, a frota total de veículos na Paraíba cresceu 355%, saltando de 336.333, em 2003, para 1.533.806, até janeiro de 2023, segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito da Paraíba (Detran-PB).
No mesmo período, em João Pessoa, o incremento foi de 254%. Segundo a estimativa, 325.678 veículos a mais passaram a circular na cidade em 20 anos. Já Campina Grande saiu de 61.509 para 210.595, um acréscimo de 149.086 unidades e uma expansão de 242%.
A evolução da frota pode ter um significado positivo do ponto de vista do conforto da população em ter um transporte. Por outro lado, no que se refere ao tráfego, traz impactos negativos como engarrafamentos e falta de locais para estacionar.
Ao longo dos 20 anos do levantamento, 2011 foi o ano que registrou o maior aumento percentual em relação ao ano anterior, sendo 13,77% na Paraíba, saindo de 709.628 para 805.055 veículos; 12,58% em João Pessoa, passando de 234.014 para 259.797; e 10,30% em Campina Grande, ampliando a frota de 115.014 para 125.834.
O especialista em trânsito, Nilton Pereira, observa que atualmente a maioria da população brasileira – cerca de 85% - vive nas cidades e o maior reflexo do crescimento da frota de veículos é exatamente nos espaços urbanos, na qualidade de vida das pessoas que nelas moram e na economia.
Em 10 anos, segundo ele, a população do Brasil cresceu 7,9% e o número de carros aumentou 33,2%. “Isso com uma pandemia pelo meio, quando a produção ficou parada por um bom tempo. Ou seja, a taxa de crescimento do número de carros cresceu 4,2 vezes mais do que a população. Não tem como pensar em atender a demanda dos carros”, pondera.
O número total de veículos na Paraíba equivale a 37,78% da população paraibana, estimada pelo IBGE em 2021
Com essa evolução, há reflexos nos municípios. Nilton afirma que a estrutura que as cidades dispõem para a circulação de veículos são as ruas, que possuem uma capacidade limitada, ou seja, têm uma quantidade máxima de veículos que nelas podem circular. “Quando o número de veículos aumenta, as ruas não podem ser alargadas na mesma proporção e, consequentemente, os veículos começam a andar espremidos, pois não há espaço para todos eles. Nos cruzamentos a situação se complica ainda mais”, constata.
A consequência é, de fato, aumento dos engarrafamentos, pois, de acordo com o especialista, não se pode oferecer mais espaços ou vias para atender ao crescimento da frota, e não há como mudar a estrutura física da cidade para isso. Outro impacto é a falta de locais para estacionar. “Se você estimula a circulação de veículos, em algum momento eles vão precisar parar e se a via não tem espaço para os veículos circularem, também não vão ter para eles ficarem parados. Teria que partir para estacionamentos privados”, pontua.
Além desses problemas, o aumento da frota pode ocasionar outros desdobramentos. Há alguns anos, conforme declara o especialista em trânsito, o Governo Federal interrompeu uma política exitosa no transporte público e passou a incentivar de diversas maneiras o transporte individual como carros e motos. Ele analisa que o transporte público coletivo, que é a base da mobilidade urbana sustentável, foi deixado de lado e toda a atenção foi para o transporte motorizado individual. Na avaliação de Nilton Pereira, isso levou à situação atual, com o elevado crescimento do número de motos e carros, enquanto o número de passageiros nos transportes públicos cai cada vez mais.
Outro ponto negativo da evolução da frota é o consequente aumento da poluição. “Carros ocupam 88% das vias, transportam menos de 25% da população e respondem por 67% gases do efeito estufa. Portanto, quanto mais carros, mais congestionamentos, mais poluição e isso não se converte em maior mobilidade da população. É exatamente o contrário”, avisa.
Vias de João Pessoa não comportam frota e especialista aponta soluções
Com o aumento, as vias de João Pessoa não comportam mais o número de veículos em circulação. Nilton Pereira afirma que a cidade é antiga e tem uma história anterior à existência do carro. “Infelizmente nossos gestores insistem em continuar uma política ultrapassada e que não deu certo em canto nenhum do mundo que é de tentar diminuir congestionamentos aumentando espaço nas vias. Isso é impossível”, alerta.
Assim, ele explica que quanto mais carros circulando menor a velocidade nas vias, maiores serão os congestionamentos, a poluição, os acidentes, entre outros desdobramentos. Além disso, quando se investe menos no transporte público, sua qualidade piora e as pessoas passam a procurar outras formas de deslocamentos como a moto, que é responsável por milhares de mortes anualmente.
A solução para os problemas do trânsito, de acordo com Nilton Pereira, é parar de pensar em congestionamentos e passar a focar em mobilidade. Deixar de pensar em circulação de veículos e começar a pensar em descolamento de pessoas.
“Isso parece meio filosófico, mas faz toda a diferença na hora de decidir o que fazer. Se o foco é a pessoa e não o veículo, eu vou tentar atender as necessidades de deslocamentos dessas pessoas e não precisa ser necessariamente o carro ou moto”, diz.
O especialista calcula que um carro leva em média 1,5 pessoas. Um ônibus transporta cerca de 70 pessoas, e pergunta: Quem deve ter prioridade na ocupação da via? Ele afirma que a bicicleta tem um papel enorme na mobilidade urbana por ser de baixo custo, de acesso fácil, boa para a saúde, não contribui com a poluição, ocupa pouco espaço, entre outros benefícios, e é muito utilizada pela população de baixa renda.
“A maioria dos deslocamentos na área urbana, ao contrário do que se possa imaginar, não é de carro, moto ou ônibus. É a pé. Mas, a gente vê muitos investimentos em calçamento ou pavimentação asfáltica. Calçada a gente quase não ouve falar”, finaliza.
Saiba mais
Dados atualizados sobre veículos na Paraíba em 2023*
• Veículos 835.886
• Motos 697.920
• Frota total 1.533,806
Fonte: Detran-PB (*dados de janeiro/2023).
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 8 de março de 2023.