A primeira instituição escolar do Brasil a ter uma sala de autorregulação destinada ao público neurodivergente está na Paraíba: o Instituto Federal da Paraíba (IFPB), campus Campina Grande. Nessa unidade escolar, foi inaugurado, ontem, um espaço exclusivo para estudantes autistas, disléxicos e com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), entre outras variações neurológicas.
O ambiente foi pensado para ser um local de privacidade para o aluno neurodivergente que esteja em momentos de crise ou de desregulação emocional. Para o professor Eduardo Teixeira, idealizador do projeto, a sala ajudará a manter os alunos na escola. “Aquele estudante que, quando em crise, saía da aula ou nem mesmo vinha para a escola, agora pode ter um local de livre acesso, todo pensado para lhe propiciar acolhimento, tempo e espaço para se autorregular”, disse.
O projeto, intitulado “Concepção e execução da Sala de Autorregulação para discentes neurodivergentes do campus de Campina Grande com o uso de materiais recicláveis”, foi apelidado de “Eu só queria ser entendido” pelos dois alunos bolsistas que participaram da concepção do espaço. A cerimônia de abertura da Sala de Autorregulação foi realizada no auditório do IFPB.
Demanda
Segundo o professor Eduardo, esse desejo era algo relatado com frequência pelos dois bolsistas, ambos autistas. “A partir disso, começamos a pesquisar e pensar na criação da sala. É um ambiente sensorialmente apropriado, com iluminação branda, cores neutras e ferramentas em um painel, com diferentes texturas e objetos, porque cada um consegue regular as suas emoções de forma diferente”, destacou.
Mateus Marques, aluno do 3o ano do curso técnico de Química, foi um dos bolsistas envolvidos no desenvolvimento da sala. Conforme explicou, pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) possuem uma sensibilidade sensorial maior e, por isso, a escola pode acabar se tornando, algumas vezes, um ambiente hostil. “Eu passo a tarde inteira no laboratório. Por ser um espaço pequeno, acabo ouvindo muito barulho: pessoas conversando, movimento nos corredores, som dos instrumentos que usamos nas aulas, enfim. Tudo isso se torna muito cansativo. Então, ter um ambiente como a Sala de Autorregulação, que é bem silenciosa e privada, vai ser essencial para conseguir ‘respirar’ entre as aulas ou para quando as emoções ficarem sobrecarregadas”, observou Mateus.
Além das ferramentas que auxiliam na regulação emocional, o lugar também dispõe de um botão do pânico, caso o aluno sinta que precisa de um amparo maior. “Se o botão for acionado, um alarme vai soar na sala de Assistência ao Aluno e, imediatamente, um profissional irá até o local, para ajudá-lo”, garantiu Eduardo.
Lei estadual
O projeto criado no IFPB completará um ano em outubro e, coincidentemente, no momento da sua criação, o Projeto de Lei (PL) no 663/2023, de autoria do deputado Adriano Galdino, presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB), propunha a instalação e a manutenção de Salas de Estabilização Sensorial em estabelecimentos do estado. Aprovado, o PL determina que espaços fechados, públicos e privados, com área igual ou superior a 10 mil m², deverão instalar um ambiente equipado e propício para pessoas neurodivergentes em momento de crise.
Segundo Albano Borba, secretário-adjunto da ALPB, a ideia do projeto surgiu a partir de pedidos dos pais e educadores da Paraíba. “Muitos vieram com essa demanda. Então, locais como estádios de futebol, teatros e aeroportos deverão ter, agora, Salas de Estabilização Sensorial com profissionais capacitados, disponíveis para atendimento”, detalhou.
Para o secretário-adjunto, a Sala de Autorregulação do IFPB servirá como exemplo para a implantação da lei. “É um modelo a ser seguido, nos próximos anos, tanto nas escolas como em outros espaços, que também devem se tornar mais inclusivos”, enfatizou.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 27 de setembro.