Em Areia de Baraúnas, no coração do Sertão paraibano, o horizonte começa a ganhar novos contornos. Entre as ruas de chão batido e o vento seco que percorre as casas simples, um sonho está prestes a se materializar: o direito a uma moradia digna, sustentável e gratuita. São 30 famílias que, em breve, terão as chaves de suas próprias casas nas mãos. Mais que tijolos e cimento, receberão um lar pensado para acolher, proteger e oferecer um futuro melhor. Um espaço onde cada parede contará histórias de esperança e cada janela permitirá que a luz da dignidade entre sem pedir licença.
O Projeto Casas Sustentáveis, em fase final de construção, é a prova de que é possível unir tecnologia, inovação e responsabilidade social no mesmo endereço. Com investimento total de R$ 2,38 milhões — valor que representa R$ 79,3 mil por unidade habitacional —, as casas possuem 42,57 m2 de área construída e foram projetadas para dialogar com o meio ambiente. Cada uma delas terá sistemas de energia solar fotovoltaica, captação de águas cinzas (como as de chuveiros e pias) para uso em descargas sanitárias e cisternas para reaproveitar a água da chuva. Também foram pensadas soluções de isolamento térmico eficiente, iluminação natural e ventilação cruzada, garantindo conforto e economia às famílias.
“O diferencial é o reuso de águas cinzas, além da captação da água de chuvas, também com energia fotovoltaica, e a aplicação de técnicas para conforto térmico da unidade. A ideia é mostrar que é possível realizar essas técnicas em larga escala e em obras populares”, explica Emília Correia Lima, presidente da Companhia Estadual de Habitação Popular da Paraíba (Cehap).
Mais que um conjunto habitacional, o Casas Sustentáveis nasce como um modelo replicável de construção consciente. A ideia é que, no futuro, as soluções desenvolvidas em Areia de Baraúnas possam ser aplicadas em outros municípios, multiplicando os efeitos positivos. As famílias beneficiadas, todas em situação de vulnerabilidade social, receberão as casas por doação, sem nenhum custo, assegurando-lhes não apenas um teto, mas também uma nova perspectiva de vida.
Para Emília, o impacto da moradia vai além do abrigo. “Quando as pessoas têm uma moradia regularizada, elas se sentem mais seguras e com mais dignidade. Isso tem um impacto direto em sua qualidade de vida. Quando uma pessoa sabe que a casa é dela, ela investe, melhora a estrutura [do imóvel] e, consequentemente, sua vida. A moradia não é só um lugar para morar, mas um fator que traz autoestima e confiança”.
O olhar inovador por trás do projeto foi reconhecido nacionalmente, com a premiação do Selo de Mérito em Habitação de Interesse Social 2025, na categoria de uso e desenvolvimento de novas tecnologias. A conquista não se restringe a um troféu; simboliza o compromisso do Estado em oferecer habitação de qualidade, com respeito ambiental e inclusão social. Em uma cidade de pouco mais de dois mil habitantes, a obra já é vista como um marco de transformação. “Quando as crianças crescem em um ambiente seguro e estável, isso reflete diretamente no seu desenvolvimento e no seu futuro. Acredito que esses projetos têm um impacto fundamental no desenvolvimento da Paraíba”, destacou a presidente da Cehap.
Iniciativas premiadas são referência nacional
Se o Sertão celebra a chegada de lares sustentáveis, o resto do Brasil observa com respeito os avanços da Paraíba na área habitacional. O reconhecimento mais recente pelo Selo de Mérito em Habitação de Interesse Social integra uma sequência de quatro vitórias consecutivas do estado, nos últimos quatro anos de premiação.
- Em Santa Rita, o Residencial Rosa Luxemburgo sediou oficinas e cursos para os moradores | Foto: Alberi Pontes/Secom-PB
A Paraíba já havia sido premiada pelo Programa Parceiros da Habitação (PPH); pela regularização fundiária em Rio Tinto; pelo projeto social no Residencial Rosa Luxemburgo, em Santa Rita; e pelo Residencial Aura de Cruzeiro, em Campina Grande.
O PPH surgiu em 2020, quando os programas federais de moradia estavam suspensos. A iniciativa estadual estabeleceu parcerias com municípios e movimentos populares para viabilizar lares para famílias de baixa renda, especialmente em áreas de risco ou insalubres. Com casas de cerca de 44 m2, o PPH já beneficiou centenas de famílias em 31 cidades. “Criamos o Parceiros da Habitação, justamente, para responder à necessidade real da população. Hoje, o programa se consolidou como uma ferramenta ágil, eficaz e inclusiva”, ressalta Emília.
Outro destaque foi a desprivatização e a regularização fundiária em Rio Tinto, que devolveu dignidade a famílias que viviam em imóveis da antiga fábrica de tecidos local. Na primeira etapa, foram 700 escrituras entregues gratuitamente, encerrando décadas de insegurança habitacional. “Foi um ato de justiça. Muitas famílias viveram anos pagando aluguel por imóveis que, agora, são oficialmente delas”, relembra a presidente da Cehap.
Já em 2023, o Residencial Rosa Luxemburgo, no bairro Várzea Nova, em Santa Rita, tornou-se símbolo de cidadania. Com 576 apartamentos erguidos em uma área de alta vulnerabilidade, o projeto trouxe não apenas moradias, mas também saneamento, abastecimento de água e infraestrutura. A inovação esteve na ação social: oficinas, feiras, cursos profissionalizantes e rodas de conversa foram promovidos, fortalecendo a participação comunitária. “Nosso objetivo é sempre inovar. O Rosa Luxemburgo mostrou que iniciativas de habitação vão além da entrega das chaves. São transformação social”, completa Emília.
Essas experiências comprovam que o estado tem conseguido transformar políticas habitacionais em modelos de inclusão e sustentabilidade. Para Emília, esse é o papel central da companhia. “A Cehap tem um papel crucial porque, mais do que construir casas, ela cria políticas de habitação que respondem às necessidades reais das pessoas. Não se trata apenas de um trabalho técnico, mas de entender o contexto social e criar soluções que façam diferença na vida das pessoas”, destaca.
Parceria amplia o alcance das políticas habitacionais
O Residencial Aura de Cruzeiro, em Campina Grande, é outro exemplo de inovação e parceria bem-sucedida. Construído dentro do Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), com recursos do FGTS, o empreendimento combina sustentabilidade e lazer. As áreas comuns foram equipadas com painéis solares fotovoltaicos, que reduzem os custos do condomínio, além de dispositivos para economia de água. Para os moradores, as novidades somam-se a um conjunto de mais de 20 itens de lazer e bem-estar, incluindo piscinas, quadras, salão de festas e espaço pet.
O projeto ainda recebeu o Selo Casa Azul de Habitação Sustentável, da Caixa Econômica Federal, reforçando seu caráter inovador. “O Minha Casa, Minha Vida é um guarda-chuva que contempla diferentes perfis de famílias, desde as mais vulneráveis até entidades organizadas por movimentos sociais. Nosso compromisso é garantir moradia digna a quem não tem acesso ao mercado formal”, afirma Emília.
A parceria entre o Governo Estadual e o Federal tem multiplicado o alcance das políticas habitacionais. Somente de 2019 a 2024, foram 7.127 unidades entregues na Paraíba, com investimentos superiores a R$ 600 milhões. Outras quatro mil moradias estão em construção e mais de 5.400 unidades devem ser iniciadas até 2026. Além disso, a retomada do programa federal garantiu novo fôlego: em 2023 e 2024, a Paraíba alcançou 39 mil contratações de unidades habitacionais, distribuídas em 151 municípios. João Pessoa já é a terceira cidade do país com mais contratações do programa, atrás apenas de São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Campina Grande, Patos, Santa Rita e Cabedelo também despontam entre os municípios com os maiores números de contratos.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 19 de Outubro de 2025.