O Museu da Diáspora Negra, dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais da Paraíba vai ganhar um novo endereço no Centro Histórico de João Pessoa. O espaço passará a ocupar o prédio que, no período colonial, foi residência do capitão-mor da província da Paraíba, localizado na Praça Rio Branco. A área, que também já abrigou um pelourinho e está situada no entorno do Largo da antiga Cadeia Pública, ganha agora uma função cultural e política, transformando um local marcado pela repressão em território de memória e resistência.
Para a secretária de Estado das Mulheres e da Diversidade Humana, Lídia Moura, a mudança representa mais do que uma nova ocupação física: simboliza o reposicionamento da história e a reparação de memórias apagadas. Ela destacou a trajetória de Gertrude Maria, mulher escravizada que provavelmente utilizava as imediações do local para exercer atividades de ganho e, com isso, juntar recursos para comprar sua alforria. Segundo Lídia, a instalação do museu no Centro Histórico fortalece novas formas de ocupação cultural da comunidade negra paraibana e se conecta ao Sabadinho Bom, que passa a ganhar uma extensão de resistência e afirmação cultural.
A iniciativa está alinhada às recomendações da 3a Conferência Mundial contra o Racismo, realizada em Durban (África do Sul), em 2001, que completou 24 anos. O encontro foi um marco internacional ao reconhecer indígenas e ciganos como vítimas históricas de racismo, além de recomendar a criação de políticas públicas para valorizar a cultura e a herança africana e afrodescendente.
Nesse contexto, o Governo da Paraíba, por meio da Secretaria de Estado da Mulher e Diversidade Humana (Semdh), vem desenvolvendo ações estratégicas, como a formação de gestores públicos no enfrentamento do racismo, intolerância religiosa e xenofobia; a criação do Fórum Estadual de Gestores de Igualdade Racial; e o lançamento de editais de incentivo voltados à valorização cultural e à sustentabilidade econômica de comunidades quilombolas, povos originários e tradicionais. “O Governo da Paraíba está trabalhando na valorização da memória e história de nossa gente e se alinhando aos esforços nacionais e internacionais de reparação frente ao flagelo da escravidão e da colonização. A criação do museu é uma resposta objetiva a esse compromisso”, reforçou Lídia Moura.
A nova etapa do museu é fruto da articulação entre secretarias estaduais e pesquisadores. A Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior apoia a formação da equipe técnica, enquanto o antropólogo e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Estêvão Palitot, e o historiador da Arte da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Stênio Soares, coordenam pesquisas que buscam ampliar as vozes e experiências das comunidades indígenas e afrodescendentes da Paraíba. Para Palitot, o museu fortalece iniciativas culturais já existentes e amplia o diálogo sobre diversidade. Já Soares ressalta que espaços como esse são instrumentos políticos de reparação histórica e afirmação identitária, capazes de inspirar novas gerações e legitimar as histórias das comunidades afrodescendentes.
Ao se instalar em um prédio que já simbolizou poder colonial e repressão, o Museu da Diáspora Negra consolida-se como um marco de ressignificação histórica e cultural, reafirmando o compromisso da Paraíba com a diversidade de seus povos. Em sintonia com perspectivas críticas como as da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, o novo espaço desafia a ideia de uma história única e promove a construção de narrativas plurais, inclusivas e afirmativas, que fortalecem a centralidade da cultura afro-diaspórica e indígena na formação do Brasil.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 5 de setembro de 2025.