Nicolas Ravi nasceu de parto normal no dia 9 de outubro, no Hospital da Mulher Dona Creuza Pires, em João Pessoa. Era madrugada, por volta das três horas da manhã, quando veio ao mundo.
Pesando apenas 1,7 kg, Nicolas nasceu prematuro, com 33 semanas de gestação — antes das 37 semanas consideradas ideais. Desde o nascimento, recebeu cuidados médicos especializados em unidades voltadas para bebês prematuros. Após 12 dias sob acompanhamento, ele e a mãe, Flávia Roberta, de 28 anos e mãe de primeira viagem, já se preparavam para, enfim, voltar para casa.
“Meu maior medo era acontecer alguma coisa, porque via muitos casos, muita gente falava, e acabamos nos assustando. Cada bebê tem uma forma de reagir. Foi difícil, principalmente por ser o meu primeiro filho”, conta, com os olhos marejados, Flávia, ao lembrar o desafio de ter um bebê prematuro. “Graças a Deus, agora estou levando meu filho para casa. A sensação é de alívio, porque ele está saindo bem. Mas o processo continua em casa”, completa.

- Um desses casos foi o de Flávia Roberta e seu pequeno Nicolas Ravi, nascido no Hospital da Mulher de João Pessoa, em 9 de outubro | Foto: Leonardo Ariel
A experiência de Flávia Roberta é compartilhada por mais de cinco mil famílias que tiveram bebês prematuros na Paraíba apenas neste ano. No Brasil, em 2023, cerca de 12% de todos os nascimentos foram antes das 37 semanas previstas — aproximadamente 300 mil casos, segundo dados do DataSUS. O índice nacional está acima da média global, de cerca de 10%, o que coloca o país entre os 10 com maior número de nascimentos prematuros no mundo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a prematuridade é classificada em três níveis: prematuro extremo, quando o bebê nasce antes das 28 semanas de gestação; prematuro moderado, de 28 a 33 semanas; e prematuro tardio, de 34 a 37 semanas. A classificação também considera o peso ao nascer: baixo peso (menos de 2,5 kg); muito baixo peso (menos de 1,5 kg); e extremo baixo peso (menos de 1 kg).
Sinais
Durante a maioria do pré-natal, a gestação de Flávia transcorreu de forma tranquila. No entanto, por volta dos oito meses, um exame identificou uma infecção urinária silenciosa, que acabou provocando o rompimento da bolsa no dia 30 de setembro. Mesmo assim, ela permaneceu com o bebê no ventre por mais alguns dias — de 7 a 9 de outubro —, período em que enfrentou dores e contrações até o nascimento de Nicolas Ravi.
Ao nascer, o bebê apresentava a mesma infecção da mãe e precisou permanecer em observação na Unidade de Cuidados Intensivos Convencional (Ucinco). Durante esse período, foi alimentado por sonda e recebeu medicamentos intravenosos enquanto permanecia na incubadora.
Flávia recebeu alta médica antes do filho, que ainda permanecia na incubadora. No sábado, ao deixar o hospital, ela foi vê-lo antes de retornar para casa. No dia seguinte, voltou logo pela manhã e permaneceu ao lado do bebê durante todo o dia. Segundo ela, os profissionais de saúde costumam retirar o recém-nascido da incubadora por alguns instantes para que os pais possam segurá-lo, sentir seu cheiro e iniciar o processo de adaptação.
Seis dias depois, Flávia recebeu a notícia de que Nicolas teria alta da Ucinco e seria transferido para a Unidade de Cuidados Intermediários, mediante a aplicação do Método Canguru. “Foi numa quinta-feira. Tinham mais três meninas aqui comigo e Ravi saiu por último. Ele é muito espertinho, acho até bem avançadinho para o tamanho. O reflexo é ótimo, a adaptação está sendo boa, até a amamentação”, relatou, emocionada, nos momentos finais da internação.
Nas próximas semanas, Nicolas deve retornar ao hospital para exames e acompanhamento médico regular.
Momentos de tensão
Foi ainda durante o pré-natal que Vanessa Paiva percebeu as complicações que levariam ao nascimento prematuro de Arthur, hoje com nove anos de idade, mas que veio ao mundo com apenas 31 semanas de gestação. Vanessa enfrentou um quadro de pré-eclâmpsia, caracterizado por pressão arterial elevada e excesso de proteína na urina — condição que se agravou devido à negligência médica.
O diagnóstico correto e o tratamento adequado só foram obtidos após Vanessa consultar a terceira obstetra do seu pré-natal, curiosamente a mesma médica que havia feito o seu parto.
Algumas semanas antes do nascimento, a gestante começou a sentir cólicas e dores abdominais, além de inchaço persistente, mas sem febre. Após um atendimento de urgência, foi constatada a pressão alta, e sua obstetra, à época, prescreveu um medicamento por apenas cinco dias. Na semana do parto, os sintomas retornaram com força, e Vanessa buscou uma nova profissional — a terceira —, que passou a acompanhá-la de forma mais rigorosa.
A médica prescreveu doses máximas de medicação, além de corticoide para fortalecer os pulmões do bebê, e determinou repouso absoluto e exames quase diários. No fim daquela semana, um novo pico de pressão, associado a descolamento de placenta e risco para mãe e filho, levou à necessidade de uma cesariana de emergência.
“Depois do parto, fiquei dois dias na UTI, porque era preciso estabilizar a pressão antes de ir para o quarto. O risco da pré-eclâmpsia existe antes, durante e depois”, relembra Vanessa. “Arthur ficou 33 dias internado — cerca de sete dias na UTI e o restante na Ucinco. Quando ele nasceu, ainda consegui pegá-lo um pouco, tivemos o contato pele a pele, mas foi muito rápido, porque ele nasceu com desconforto respiratório”.
A mãe também recorda um dos momentos mais difíceis da internação. “Ele tinha uns 20 dias de vida e havia passado o dia todo no Método Canguru comigo. Quando pedi para colocá-lo na incubadora, ele teve uma apneia. Foi desesperador, porque nunca tinha visto aquilo. A saturação caiu, e as enfermeiras começaram: ‘Arthur, vamos voltar a respirar’. Aquela cena me marcou muito, porque parecia que ele estava tendo uma parada. Quando ele voltou, saí da sala chorando, com a sensação de que quase perdi meu filho”.
Estado oferece estrutura para cuidados
A neonatologista e coordenadora médica de Neonatologia do Hospital da Mulher, Patrícia Guimarães, explica que, quanto mais prematuro é o bebê, maiores são os riscos de ele desenvolver comorbidades ou até de não sobreviver. Um dos principais desafios está na maturação pulmonar.
“O pulmão se desenvolve do meio para o fim da gestação. Quando o bebê não nasce a termo — expressão usada para os nascimentos a partir das 37 semanas —, ele ainda está em formação”, detalha. Segundo a especialista, o uso prolongado de oxigênio pode expor o bebê à retinopatia da prematuridade, condição que pode causar perda visual.
“Os antibióticos que precisamos utilizar, por serem bebês mais suscetíveis a infecções, também podem causar efeitos deletérios à audição e aos rins. Esses recém-nascidos têm risco aumentado de sangramentos, porque o cérebro é muito frágil nessa fase, o que eleva as chances de hemorragias intracranianas. Dependendo do grau, essas lesões podem deixar sequelas no desenvolvimento”, explica Patrícia.
A enfermeira intensivista neonatal e pediátrica e coordenadora de enfermagem da UTI Neonatal do Hospital do Servidor General Edson Ramalho, Nathalia Duarte, reforça que as complicações respiratórias estão entre as mais comuns. “Os bebês podem nascer com Síndrome do Desconforto Respiratório ou displasia broncopulmonar, precisando de suporte de respiração mecânica”, afirma.
Segundo ela, os riscos também envolvem o sistema neurológico, com possibilidade de hemorragias intraventriculares, devido ao cérebro ainda imaturo, e de atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor. Além disso, podem ocorrer intolerância alimentar, hipoglicemia, hipotermia — motivo pelo qual permanecem em incubadoras —, além de alterações auditivas. “Cada criança, cada recém-nascido, é um caso. As necessidades variam muito, por isso o acompanhamento especializado é essencial”, conclui Duarte.
Unidades especializadas
Em João Pessoa, dois hospitais públicos estaduais oferecem estrutura especializada para o cuidado de mulheres e bebês que passam por partos prematuros.
O Hospital da Mulher, inaugurado em agosto, dispõe de 52 leitos neonatais, distribuídos entre 20 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal, 20 leitos na Unidade de Cuidados Intermediários Convencional (Ucinco) e 12 leitos na Unidade de Cuidados Intermediários Canguru (Ucinca). Desde a abertura, o hospital já registrou 175 admissões nas unidades neonatais — sendo 57 na UTI, 88 na Ucinco e 30 na Ucinca.
O Hospital do Servidor General Edson Ramalho conta com 16 leitos neonatais, divididos em 10 na UTI, quatro na Ucinco e dois na Ucinca. Somente neste ano, o hospital acolheu 406 bebês prematuros, dos quais 227 foram internados na UTI Neonatal, 128 na Ucinco e 51 na Ucinca.
Quando a mãe recebe alta antes do bebê, ambos os hospitais oferecem casas de apoio para garantir a proximidade e o acompanhamento contínuo. No Hospital da Mulher, o serviço é prestado pela Casa da Gestante, que possui 18 leitos. Já no Edson Ramalho, o suporte é oferecido pela Casa das Mães Amor e Vida, com capacidade para oito mulheres.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 2 de novembro de 2025.