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Redação do Enem

Técnica e repertório são essenciais

publicado: 03/11/2025 08h51, última modificação: 03/11/2025 08h51
Clubes de leitura e programas educacionais fortalecem a escrita e a argumentação de quem sonha com a nota máxima
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Iniciativa coletiva reforça importância de ler na construção do conhecimento necessário para o desenvolvimento argumentativo | Foto: Maria Luiza Albuquerque/Arquivo pessoal

por Carolina Oliveira*

Quando tratamos de redação, estamos falando sempre de técnica e de repertório. “Sendo assim, cabe ao aluno, primeiramente, compreender a técnica voltada ao texto dissertativo-argumentativo, com foco basilar na estrutura, sempre orientado por professores e especialistas”, recomenda o coordenador do programa Desafio Nota 1000, José Carlos Ribeiro. “Em segundo plano, é preciso ampliar o repertório, a partir de leituras e consumo de produtos culturais, como filmes, séries, músicas, obras de arte”, complementa.

José Carlos diz que o tema da redação sempre é uma “surpresa guardada a sete chaves”, por isso, faz-se necessário saber acumular, organizar e relacionar essa bagagem de conhecimentos. “Um leitor assíduo, sobretudo de obras literárias, sempre terá maior facilidade com a escrita, porque tenderá ao domínio da técnica e do repertório. Por isso, ler, sempre, e o quanto mais for possível, amplia o vocabulário e proporciona outras leituras de mundo, que podem ser claramente úteis à escrita”, afirma.

Se a leitura é uma ferramenta, dividir essa experiência na coletividade amplia as potencialidades do hábito e o alcance dos seus benefícios. Com o incentivo do pai, Maria Luiza Albuquerque, concluinte do Ensino Médio Técnico em Teatro, resolveu organizar um grupo voltado para o compartilhamento do conteúdo literário. “O nosso clube do livro foi uma ideia que surgiu a partir de uma conversa sobre a riqueza dos livros para os repertórios de redação. Chamei meus amigos para participar e o projeto começou no início do ano. Temos o compromisso de ler, a cada mês, o livro de nossa preferência e nos reunirmos para debater e compartilhar as impressões de leitura”, conta a estudante.

Os livros, no início, eram escolhidos com base em uma lista pronta. “Seguimos nos primeiros meses. Porém, da metade do ano pra cá, adotamos o método de cada um escolher sua própria leitura e compartilhar as percepções com o grupo, o que foi muito interessante, pois trabalhávamos com diferentes repertórios em apenas um mês”, conta a jovem de 17 anos.

Uma das prioridades do grupo é a literatura nacional. “Capitães de Areia”, de Jorge Amado, e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis, foram algumas das escolhas.

Maria Luiza, que planeja ingressar na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) para cursar Direito ou Artes Cênicas, tem uma rotina corrida. “Nas manhãs, estou em aulas, e, à tarde, vou direto pro estágio de conclusão de curso da escola técnica. Quando chego em casa, tenho pouco tempo para estudar, porém tento ser o mais produtiva possível. O tempo que reservo para ler meu livro é antes de dormir. Nos sábados, reviso bastante as matérias da área de exatas, que tem um peso maior no Enem, principalmente Matemática”.

A estudante conta que a redação recebe atenção especial na sua estratégia de preparação para a prova. “Foco bastante neste ponto da produção textual, e busco fazer pelo menos duas redações por semana. Minha professora passa possíveis temas para que possamos treinar a elaboração do texto no menor tempo possível. As demais matérias eu aproveito para revisar e intensificar na escola e durante meus estudos semanais”, conta Maria Luiza.

Elementos que o exame espera do candidato

A redação do Enem explora a tipologia dissertativa-argumentativa: é um texto em que o candidato defende, de forma clara e objetiva, um ponto de vista, a fim de persuadir o leitor. Para isso, a professora Érika Leal explica que devem ser utilizadas estratégias de convencimento, como os chamados repertórios, e linhas ou relações de causa e consequência, por exemplo. “Eles querem um escrito autoral, sem modelos prontos. Esse é o grande segredo da prova deste ano. O concorrente deve fugir das mesmices e procurar um caminho genuíno”, orienta.

As propostas têm aparecido, nos últimos anos, conforme sinaliza a professora, com enquadramentos de temas que buscam abordar desafios, invisibilidades ou caminhos para o combate ou resolução de problemáticas sociais. “Tem-se um recorte de direcionamento do tema, que vem acompanhado geralmente, de quatro ou cinco textos motivadores, que servem para nortear o candidato e devem ser lidos com atenção”, conta.

É importante que o participante pense no projeto de texto, o planejamento antes da escrita. A estrutura textual é dividida em três partes, que devem estar dispostas em quatro parágrafos, e manter conexões entre si. São elas: introdução, com uma média de cinco a sete linhas; desenvolvimento, em dois parágrafos, com média de sete a nove linhas; e a conclusão, com seis a oito linhas.

A introdução deve conter uma apresentação do tema em seu recorte completo. “Isso evita grandes erros no Enem: o tangenciamento, que é trabalhar o tema de maneira superficial, ou ainda, a fuga, que é não trabalhar o tema solicitado, e que pode inclusive zerar a redação. Para a introdução, são essenciais o tema e a tese. O assunto que vai ser discutido é descrito de forma clara, enquanto, na tese, se elabora qual é a problemática em questão; nela, o aluno apresenta os direcionamentos que vão nortear o texto”, descreve Érika.

O desenvolvimento, vai trazer o porquê do problema. “Estruturalmente, é iniciado com um conectivo; tem-se um tópico frasal, que é a parte que resume a ideia a ser argumentada; e o repertório”. Erika ressalta que, neste ano, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), na cartilha do participante, direcionou um quesito qualitativo específico sobre o repertório da redação.

A professora orienta que o aluno não deve utilizar repertórios “de bolso”, ou seja, aqueles decorativos, que não têm relação direta com o tema, previsíveis e pouco aprofundados, ou será descontada pontuação na competência 2. Por outro lado, definições, dados, exemplos de domínio público, citações e referências de filmes, séries e músicas podem ser mencionados para enriquecer e fundamentar o texto. “A preocupação não é o que será utilizado, mas como isso será feito, e a relação que se tem com o tema. Esse cuidado é uma outra aposta para que se mantenha a possibilidade de uma nota elevada”, pontua Erika.

A conclusão deve apresentar medidas que atenuem ou solucionem o problema discutido, de forma viável e respeitosa aos direitos humanos. “A intervenção deve considerar o agente (quem executa), a ação (o que será feito), o meio (como será feito), o efeito (objetivo da ação) e o detalhamento (informações complementares). É importante conectar a conclusão à introdução para garantir coesão”, orienta a professora.

A redação do Enem é avaliada em cinco competências, cada uma valendo 200 pontos. “A primeira avalia o domínio da norma culta e o uso adequado da gramática. A segunda analisa a compreensão do tema, o repertório e a estrutura argumentativa. A terceira observa a coerência e a organização das ideias. A quarta verifica a coesão textual, e a quinta, a proposta de intervenção, que deve respeitar os direitos humanos”, explica Érika Leal.

Nos últimos três anos, o Enem tem abordado temas ligados a grupos minorizados, como povos originários, população afro-brasileira e o papel da mulher no cuidado. “A escolha do tema não segue um padrão previsível, mas reflete discussões relevantes para a formação cidadã dos estudantes”, explica Érika Leal.

De acordo com a professora, é essencial que os candidatos acompanhem projetos e debates de destaque nacional. “Com a COP30, questões ambientais ganham visibilidade e podem inspirar temas sobre sustentabilidade ou responsabilidade social. Também destaco assuntos como tecnologia, inteligência artificial e mercado de trabalho”, aponta.

Ela ressalta ainda a importância de temas sobre capacitismo, inclusão de pessoas com deficiência, valorização dos professores, inclusão educacional e refugiados climáticos, além de discussões éticas sobre empatia, arte e saber popular.

A preparação, segundo Érika, deve ser constante. “É importante manter-se informado por meio de jornais, revistas, podcasts, documentários e leituras — especialmente dos clássicos. Essa base amplia o repertório e ajuda o candidato a construir argumentos mais sólidos e articulados, o que pode garantir notas mais altas”, conclui.

Ação que transforma o aprendizado em êxito

Iniciativa de ensino, produção e correção de redações para o Enem, executada mediante a Secretaria de Estado da Educação da Paraíba (SEE-PB), o Desafio Nota 1000 divulga, semanalmente, um tema de redação articulado ao Enem, com base em eixos como Saúde, Tecnologia, Meio Ambiente, Sociedade, Economia, entre outros. “Orientados por seus professores, os estudantes produzem as redações e realizam o envio dos textos para a SEE-PB, por meio de formulário on-line, para a avaliação de uma equipe de corretores especializados em redação para o Enem”, explica o coordenador José Carlos Ribeiro.

As ações do programa foram iniciadas em abril de 2020. A regulamentação ocorreu em 31 de maio de 2021. O programa contempla estudantes do 9o ano do Ensino Fundamental e todo o Ensino Médio, independentemente de modalidade. Após a correção pelo Desafio Nota 1000, os estudantes recebem um feedback de seu desempenho, com notas e comentários, segmentados em cinco competências cobradas no Enem: domínio da modalidade formal escrita da língua portuguesa; atendimento ao tema e à estrutura do texto; argumentação e projeto de texto; coesão, coerência;  e elaboração de uma proposta de intervenção respeitando os Direitos Humanos.

Os professores fazem uso das informações geradas nas correções como subsídio para as aulas de redação, para apoiar os alunos nos pontos de melhoria identificados. Semanalmente, o programa oferece formação continuada, de forma síncrona, para os professores de Redação e de Língua Portuguesa da rede estadual. “É uma experiência única no Brasil em redes públicas, considerando se tratar de um percurso formativo continuado, em perspectiva contínua, que ocorre todos os anos, desde 2021, apontando as novidades que são lançadas pelo MEC-Inep para a correção do Enem”, conta o coordenadora.

As ações do Desafio Nota 1000 já beneficiaram 132.555 estudantes. “Apenas neste ano, 70.535 estudantes estão sendo impactados, seja pela produção e correção de textos, seja pelas aulas estruturadas de Redação, sob elaboração e monitoramento do programa”, conta. De 2020 a 2025, já foram recepcionadas e corrigidas 938.517 redações.

Já participaram dos percursos formativos oferecidos pelo Desafio Nota 1000, 1.187 professores de Língua Portuguesa e de Produção de Texto, no período de 2021 a 2025. “Ademais, 100% dos professores de Produção de Texto são beneficiados, notadamente no que se refere ao material pedagógico, de caráter autoral, produzido no âmbito do programa, e que inclui cadernos com atividades direcionadas”, ressalta José Carlos.

Através deste link, acesse a página onde está localizada a cartilha do participante

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 2 de novembro de 2025.