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Trabalho infantil

Para erradicar, é preciso conscientizar

publicado: 12/06/2024 09h04, última modificação: 12/06/2024 09h04
Campanhas focarão nas “infâncias invisíveis”, como aquelas perdidas para a mendicância e o trabalho doméstico
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A juíza Poliana Sá cita a subnotificação como desafio | Foto: Evandro Pereira - Foto:

por Emerson da Cunha*

Nas cidades, a mendicância e o trabalho doméstico. No ambiente rural, a carvoaria ou o cultivo de lavouras. São diversas as formas de trabalho a que crianças e adolescentes ainda são submetidos no Brasil. Hoje, 12 de junho, é o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil. Para marcar a data, o Governo da Paraíba, por meio da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Sedh), lança a Campanha Estadual de Enfrentamento ao Trabalho Infantil, a partir das 13h30, no auditório do Shopping Sebrae, em João Pessoa.

A campanha tem como objetivo promover o enfrentamento das mais diversas formas de trabalho infantil e de violações de direitos, bem como divulgar os serviços executados pela Sedh - especialmente o Disque 155, que é o canal de denúncia próprio do Governo do Estado. Na ocasião, haverá um painel sobre o Panorama do Trabalho Infantil no Brasil e na Paraíba, com o palestrante Eurico Barreto Sprakel, analista do IBGE na Paraíba.

Instituído pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2002, com o objetivo de promover reflexões sobre o direito de todas as crianças à infância segura, à educação e à saúde, livres da exploração infantil e de outras violações, o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil também contará com atividades de vários outros órgãos e entidades ligados aos direitos das crianças.

Infância roubada

De acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), de 2022, a Paraíba possuía cerca de 40 mil crianças em situação de trabalho infantil, sendo 74% delas negras e 29% sobrevivendo das piores formas de trabalho. O Brasil, por sua vez, tinha cerca de dois milhões de crianças e adolescentes com cinco a 17 anos de idade (ou 5% desse grupo etário) em situação de trabalho infantil. O número havia tido queda entre 2016 (2,1 milhões, ou 5,2% do grupo etário) e 2019 (1,8 milhão, ou 4,5% do grupo etário), mas voltou a crescer em 2022.

Além disso, embora a população total do país com cinco a 17 anos tenha diminuído 1,4%, o contingente desse grupo etário em situação de trabalho infantil aumentou 7%. Ainda conforme a pesquisa, a maior parte das crianças atingidas é do gênero masculino e de cor negra.

Mas o que é o trabalho infantil? A juíza e cogestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem (PCTI) do Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba da 13a região (TRT-13), Poliana Sá, explica que o trabalho infantil é aquele realizado por menores de 18 anos de idade — salvo na condição de aprendiz, uma vez que a aprendizagem é legalmente prevista a partir dos 14 anos e é um direito constitucional.

Neste ano, segundo a juíza, o tema da campanha contra o trabalho infantil são as invisibilidades da infância. “Há muitas infâncias que não estão sendo nem vividas nem vistas. Como, por exemplo, aquela perdida para a mendicância, hoje considerada uma forma de trabalho infantil. Muitas crianças são usadas como pedintes, para comover. Tal como o tráfico de drogas e a exploração sexual infantil, a mendicância está entre as piores formas concebidas de exploração da criança e do adolescente no âmbito do trabalho”, explica.

Ela diz ainda que, apesar de os números trazidos pela Pnad Contínua serem muito graves, eles ainda não refletem a realidade, uma vez que há muito trabalho infantil subnotificado. “A pandemia causou muito desemprego e desestabilizou mais ainda a economia, o que fomentou o trabalho infantil. Há muitas crianças e adolescentes trabalhando no âmbito doméstico e no rural que não são computadas nas pesquisas. Na Paraíba, sabemos que há subnotificação. É até por uma questão cultural. Poucos têm a consciência de que é preciso denunciar o trabalho infantil”, analisa a juíza.

A denúncia pode ser feita ao Ministério Público do Trabalho (MPT-PB), à ouvidoria do Tribunal da Justiça do Trabalho, ao Conselho Tutelar de cada cidade, à Delegacia Regional do Trabalho mais próxima e às secretarias de Assistência Social. Outra forma rápida e simples é pelo Disque 100, em âmbito nacional, ou pelo Disque 155, criado e executado pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Sedh).

Ações do Poder Público

De acordo com a juíza, o Brasil possui uma importante rede de proteção contra o trabalho infantil, composto pelo MPT, o Poder Judiciário, o Fórum Nacional de Erradicação e Prevenção do Trabalho Infantil, os fóruns estaduais e muitos órgãos municipais e estaduais. “Todos vão trabalhar em conjunto com as famílias, a partir de benefícios sociais, para que elas não enviem suas crianças às ruas, onde elas ficam expostas a todo tipo de violência, com prejuízo direto para a sua formação moral, física e intelectual”, salienta.

Literatura de cordel contra a exploração

O Ministério Público do Trabalho na Paraíba (MPT-PB) lança hoje, às 16h, em Patos, a Campanha de Combate à Exploração do Trabalho Infantil no São João. O lançamento acontece na Praça Edvaldo Mota (Centro), em parceria com a Prefeitura Municipal e o Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Fepeti-PB).

A Campanha 2024 traz um cordel inédito, de autoria da paraibana Anne Karolynne, em vídeo já disponível nas redes sociais do MPT-PB e também veiculado em canais de TVs do estado. A invisibilidade do trabalho infantil é o tema abordado, bem como o compromisso de erradicá-lo. De acordo com o órgão, a dificuldade de erradicar o trabalho infantil em atividades urbanas informais, no setor agropecuário, na agricultura familiar e no ambiente doméstico acontece porque a população não o compreende como um grave problema social.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 12 de junho de 2024.