A população do Loteamento Jardins, localizado no Bairro das Indústrias, em João Pessoa, vive um clima de medo, desde a noite do último sábado (13), quando um terreiro de candomblé da região foi invadido. O terreiro promovia uma festa religiosa quando foi invadido e teve seu interior destruído. Imagens veiculadas por noticiários locais mostram vasos e móveis quebrados, mesas viradas e flores jogadas ao chão. O caso é investigado pela Polícia Civil da Paraíba (PCPB), além de ser acompanhado pelo Ministério Público do estado (MPPB).
No bairro, impera a lei do silêncio; ninguém sabe ou viu o que aconteceu. Uma pessoa que mora na localidade, porém, aceitou conversar com a reportagem do jornal A União, sob anonimato. Segundo ela, o crime foi praticado por uma facção criminosa que atua na área, por isso todos têm medo de comentar o assunto. Essa mesma pessoa relatou que o terreiro funciona no local há, pelo menos, cinco anos e nunca causou nenhum incômodo à vizinhança. “Eu acho que cada um tem o direito de ter sua religião, e nunca soube de eles terem incomodado ninguém”, disse.
O responsável pelo terreiro, o babalorixá Pai Ledir de Azuani, foi procurado pela reportagem, tanto pessoalmente quanto pelo telefone, mas não foi encontrado e não atendeu às ligações. Os relatos são de que ele ainda está assustado com o ocorrido.
Após a confusão no fim de semana, a polícia foi acionada, mas, ao chegar ao local, os autores do ataque já tinham ido embora. A ocorrência segue sendo apurada pelo delegado Marcelo Falcone, da PCPB.
Já no MPPB, o episódio motivou a instauração de um procedimento de ofício, por parte da Promotoria de Justiça da Cidadania de João Pessoa, para acompanhar as investigações. “Isso demonstra como o racismo religioso e a intolerância religiosa ainda são tão presentes em nossa sociedade, embora estejamos no século 21. Isso demanda um olhar diferenciado do Estado como um todo, por meio de ações enérgicas da autoridade policial, das Forças de Segurança e também de ações educativas voltadas para a população”, afirmou a promotora Fabiana Lobo.
“As investigações são feitas pela Polícia Civil e, com a identificação da autoria, os responsáveis serão penalizados por crimes diversos, inclusive o de racismo religioso”, complementou a representante do MPPB, ressaltando que, além desse caso, a promotoria vem recebendo denúncias relacionadas a outras situações de ameaças e de violência cometidas contra pessoas que professam religiões de matriz africana.
O problema será discutido em uma audiência, prevista para o dia 6 de outubro, no auditório da Promotoria de Justiça da capital, com a presença da procuradora dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF), Janaína Andrade. Entre os órgãos e entidades convocados para participar do encontro, estão a Secretaria de Estado das Mulheres e da Diversidade Humana (Semdh) e o Fórum da Diversidade Religiosa da Paraíba.
A Federação Paraibana de Tradições Afro Descendentes (FPTAD) enviou uma nota de solidariedade ao Pai Ledir de Azuani e a todos da família de seu axé, pelo ocorrido do último sábado. “Nós, da FPTAD, jamais nos calaremos diante de crimes dessa natureza contra as religiões de matrizes africanas, acionaremos todos os órgãos competentes. Nós vamos lutar ainda mais para que nossos direitos ao culto sejam garantidos. É de suma importância que os povos de matrizes africanas continuem se unindo contra todos os atos que ferem nossa religião”, diz a nota da federação.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 16 de setembro de 2025.