Notícias

casos suspeitos

Detecção precoce ajuda no combate à esporotricose humana na Paraíba

publicado: 20/10/2023 09h14, última modificação: 24/10/2023 08h16

por Sara Gomes*

O aumento de casos de esporotricose em humanos tem preocupado a população. É que a Secretaria de Saúde do Estado (SES-PB) contabilizou 431 casos suspeitos da doença, com uma morte. Trata-se de 81% de casos a mais que em 2022, quando houve 237 notificações, sendo uma morte. Os dados comparam o mesmo período, de janeiro até 20 de setembro.

Como ação de controle da doença, a SES-PB tem realizado, durante todo o ano, capacitação junto aos municípios para detecção precoce e tratamento oportuno da esporotricose humana. O Laboratório de Saúde Pública (Lacen- PB) disponibiliza o diagnóstico através de cultura para fungo.

A responsável técnica de Esporotricose Humana, Allana Oliveira, destacou que os números divulgados são casos suspeitos de esporotricose humana. “Qualquer paciente suspeito pode procurar a unidade de saúde mais próxima de sua casa para condução adequada do caso. Também foi estruturada a rede de diagnóstico para os casos humanos e animais em parceria com o Lacen. Campanhas de conscientização da doença nos animais estão sendo veiculados atualmente nos meios eletrônicos disponíveis à população”, contou.

A estudante de Medicina Veterinária Raissa Rezende, 22 anos, contraiu esporotricose há sete anos. Foi difícil fechar seu diagnóstico, pois na época não era comum essa doença zoonótica no estado. Ela pensava que tinha adquirido a doença através da perfuração de um lápis de madeira no seu braço em uma brincadeira, pois a lesão de esporo foi exatamente no local da perfuração. “Hoje, acredito que tenha me contaminado na época em que eu jogava vôlei. O local onde eu treinava tinha bastante areia, mato e madeira. O contato da bola com o local contaminado e também com a perfuração que tinha ocorrido no meu braço acabou se tornando uma porta de entrada para o fungo”, relembrou.

Como na época quase ninguém sabia o que era esporotricose, seus pais a levaram a médicos dermatologistas e infectologistas possíveis, mas nenhum descobriu o que realmente ela tinha. A lesão da esporotricose humana parece com a da leishmaniose humana, por isso os médicos insistiram que Raissa tomasse as injeções. Seus sintomas foram febre alta, dor nas articulações, lesões aprofundadas e alastradas em fileira como um ‘rosário’ pelo braço direito, apatia e perda de apetite. “Quem descobriu que eu estava com esporotricose foi um veterinário Dr. Édson Mauro“, disse. Todos seus gatos fizeram o exame, mas o resultado deu negativo.

Felinos também são vítimas da doença

A esporotricose, conhecida como a doença do jardineiro, é causada por um fungo e não pelo gato. O animal é tão vítima da doença quanto os seres humanos. Preocupados com a disseminação de informações equivocadas a respeito da doença, o Conselho Regional de Medicina Veterinária da Paraíba (CRMV-PB), o Centro de Controle de Zoonoses de João Pessoa, veterinários e protetores de animais, saem em defesa dos felinos pois a divulgação de notícias inverídicas podem ocasionar o aumento de abandonos e maus-tratos contra estes animais.

Do gênero Sporothrix, o fungo pode ser encontrado no solo, troncos de árvores, espinhos vegetais, palha, madeira e materiais em decomposição. Como os gatos têm o hábito de enterrar as fezes e arranhar árvores, a veterinária especializada em felinos, Jessica Prado, explica que os fungos ficam alojados nas suas unhas. A transmissão entre os felinos se dá por contato direto, mas apenas se o animal estiver infectado.

O tratamento em humanos e em animais é feito com ministração de antifúngicos em um período de três a seis meses, podendo chegar a um ano, de acordo com a prescrição

A veterinária explica ainda que o ser humano pode adquirir esporotricose através do contato com o solo e plantas contaminadas por meio de lesões da pele. “Por isso é conhecida no ser humano como a doença do jardineiro, onde os primeiros casos foram diagnosticados em jardineiros que tinham contato com rosas e se lesionaram abrindo porta para esses fungos”, contextualizou. Em relação a transmissão zoonótica do gato para o ser humano, é através da arranhadura dos gatos que têm diagnóstico de esporotricose.

Os sintomas nos felinos são lesões ulcerativas sem cicatrização, em casos mais graves podem ocorrer pneumonia fúngica . A veterinária Jessica Prado alerta que nem toda lesão ulcerativa é considerada esporotricose.

A especialista em felinos, Jessica Prado, destaca a importância de informações corretas para evitar o alarde da população em relação à esporotricose. “Quanto mais informação e orientação, mais teremos tutores conscientes. É imprescindível que os tutores ao observarem os sintomas, levem os animais para atendimento veterinário, realizem os exames solicitados para conclusão diagnóstica”,frisou.

Um obstáculo no tratamento da esporotricose, segundo a veterinária, é que muitos protetores independentes iniciam a medicação para tratamento de esporotricose sem levar o felino para uma avaliação ao veterinário. "Mesmo entendendo a ‘experiência’ em muitos casos e que fazem o máximo com o mínimo que podem, reforço que consultar, diagnosticar e medicar um animal de forma correta é competência única e exclusiva do médico veterinário. Prescrever medicações para todos os animais suspeitos de esporotricose, sem levar em consideração a individualidade de cada gato, além de um crime, pode levar a resistências medicamentosas graves, como já observamos no uso indiscriminado de antibióticos, estamos causando resistências aos fungicidas".

O CRMV-PB tem buscado junto aos órgãos governamentais a promoção de programas sérios e eficientes de controle populacional para diminuir o número de animais nas ruas, alinhado a isso, um forte programa de educação e conscientização, bem como punição mais severa para quem comete maus-tratos e abandono de animais.

Prefeitura de João Pessoa

Em 2022, 464 felinos tiveram o resultado positivo para a esporotricose, em 2021 foram 442 felinos que contraíram a doença. Os dados são da Gerência de Vigilância Ambiental e Zoonoses da Secretaria de Saúde de João Pessoa. Em relação a 2023, o levantamento ainda não foi contabilizado.

Segundo a Gerência de Vigilância Ambiental e Zoonoses da SMS-JP, Pollyana Dantas, a Prefeitura de João Pessoa vem desenvolvendo um trabalho permanente de campanhas educativas acerca da prevenção à esporotricose através do Centro de Controle de Zoonoses. O órgão disponibiliza de forma gratuita o exame para identificação da esporotricose, o resultado sai no máximo em até três dias. O CCZ funciona diariamente de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h no turno da manhã e das 13h às 17h no turno da tarde.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 20 de outubro de 2023.