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Uso indevido de imagem acende alerta sobre crime

publicado: 06/06/2024 09h03, última modificação: 06/06/2024 09h03
Caso de 14 jornalistas paraibanas expostas em site adulto chama atenção para práticas ilegais na internet
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Além do Boletim de Ocorrência, vítimas podem ingressar com ação judicial, segundo advogada | Foto: Carlos Rodrigo

por Priscila Perez*

Já imaginou ter sua imagem roubada das redes sociais e usada indevidamente em sites de conteúdo impróprio? A jornalista Letícia Silva passou por isso e só descobriu o crime por acaso, ao pesquisar seu nome na internet. Mas ela foi apenas uma das vítimas, entre tantas outras repórteres e apresentadoras paraibanas – 14, ao todo – que, a partir da repercussão do caso, identificaram que também tinham imagens pessoais expostas sem autorização na mesma plataforma. Diante dessa ilegalidade, fica a pergunta: além de registrar um Boletim de Ocorrência, conforme Letícia fez, como podemos agir para combater esse tipo de crime cibernético?

A equipe de reportagem do Jornal A União falou com a advogada Fernanda Carvalho para esclarecer a questão e entender o impacto dessa exposição na vida das mulheres atingidas. Para qualquer pessoa, ter imagens particulares usadas de forma indevida já é motivo de constrangimento, mas, como explica a especialista em Direito Digital, no caso das jornalistas, que precisam transmitir seriedade profissional perante a sociedade, o dano é mais grave, especialmente porque as fotos estavam em um site de conteúdo adulto. Fernanda lembra, porém, que a internet não é um território sem leis – muito pelo contrário: “Existem advogados e especialistas nessa área para reparar todos os danos e identificar o agressor que causou todo esse sofrimento à vítima. O direito à imagem é um direito inviolável, está na Constituição Federal”.

"Existem advogados e especialistas na área para reparar danos e identificar o agressor. O direito à imagem é inviolável"
- Fernanda Carvalho

Em situações como a de Letícia, o constrangimento vem acompanhado por medo, tendo em vista que o perfil falso poderia prejudicar sua carreira. Para evitar o dano, a vítima acaba ainda mais exposta, vendo-se obrigada a se justificar publicamente para provar que aquela atitude não tem nada a ver com ela.

Segundo a advogada, o site em questão publicou as fotos das jornalistas como se elas fossem garotas de programa, fazendo referência, inclusive, às empresas onde trabalham. “Vincular uma emissora de TV a um conteúdo como esse é muito atrevimento. Talvez, tenham feito isso para que as imagens tivessem mais acesso e pudessem monetizar sobre elas”, aponta Fernanda.

Ação judicial

A especialista frisa que, independentemente de onde esteja o conteúdo, ninguém pode colocar a foto de uma pessoa em um site sem sua devida autorização. Mas, caso isso ocorra, a vítima pode ingressar com uma ação individual na Justiça. Além do Boletim de Ocorrência, é importante identificar o usuário responsável, ou seja, quem produziu aquele anúncio indevido. De acordo com Fernanda Carvalho, o Marco Civil da Internet prevê que os provedores e sites forneçam os dados de seus usuários em situações desse tipo. “Então, a partir dessas informações, nós podemos ingressar com a ação de cunho moral e, também, criminal, para que o responsável possa responder por todos os danos que causou à imagem daquela pessoa”, conta.

O caminho para a exclusão de uma foto indesejada começa com a elaboração de um Boletim de Ocorrência, mas o andamento do processo judicial depende das provas apresentadas. “Se for um perfil falso, reportamos ao usuário e depois à plataforma, solicitando a remoção do conteúdo. Em seguida, iniciamos uma ação judicial para obter outras informações, como IP e e-mail da conta responsável pelo crime. Caso haja danos materiais, também podemos ingressar com uma ação correspondente”, destaca a advogada.

Criminosos contam com sensação de impunidade  

Se, na “superfície” da internet, persiste a sensação de que os usuários podem agir livremente, na chamada dark web, essa impressão de impunidade tende a ser ainda maior. Trata-se de uma camada da rede que permite às pessoas ocultarem sua identidade e localização das autoridades. “É onde, às vezes, ocorrem comercializações ilícitas, como a venda de imagens de pornografia infantil e entorpecentes”, relata Fernanda Carvalho. Não à toa, criminosos cada vez mais especializados em deep fakes, técnica que usa inteligência artificial para trocar os rostos de pessoas em vídeos e imagens, vêm cometendo esses crimes sem atrair suspeitas.

Mas, segundo a advogada, é possível descobrir o que eles estão fazendo, mesmo na dark web, quando se trata de imagens cuja adulteração pode ser comprovada. “Teve um caso recente de uma atriz que estava de biquíni, em uma foto do Instagram, e alteraram a imagem para deixá-la nua, o que lhe causou danos”, exemplifica. Quando algo assim acontece, é importante identificar que o conteúdo foi alterado: “Dessa forma, a vítima também pode pedir as devidas reparações, caso seja comprovado quem foi esse terceiro que alterou a imagem”. Fernanda salienta, entretanto, que a identificação do criminoso nem sempre é simples, já que muitos usuários adotam endereços e nomes falsos.

A especialista enfatiza que a melhor forma de prevenir o uso indevido de fotos pessoais é ter cautela ao publicá-las nas redes sociais. “É preciso ter cuidado com a forma como você está se expondo. Veja quem está te seguindo, seja perspicaz. E lembre-se de que você não será a primeira nem a última pessoa a ser alvo de um vazamento de dados”, conclui Fernanda.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 06 de junho de 2024.